Caminhos Quebrados

Capítulo 35

Olívia Miller

Enrico ficou em silêncio, olhando diretamente para mim, tentando não demonstrar surpresa ao me ver — o que falhou completamente. Ele me conhecia, era tão óbvio, tão evidente. Estávamos certos! Há algo entre mim e a família Ferrari.

— Está blefando... - o homem finalmente falou.

Monique com um sorriso debochados nos lábios, riu em um tom tão alto que nos deixou em choque.

— Estou? Pai, vamos ser sinceros. Ninguém deixa uma herança de 25% de tudo o que tem para outro, sem ter nada envolvido. - cruzou os braços. — Somente, é claro, se o senhor estiver fazendo caridades, o que acho bem difícil.

— Está me jogando uma verde Maria Maddalena?

Aquela foi uma tremenda surpresa para todos nós, afinal, Monique havia mentido sobre seu nome?

— Uma verde que o senhor caiu. Pode nos contar a verdade? Ou pretende esconder isso até sua morte? Ela merece saber de tudo! É a vida dela que está em jogo, papà!

O homem respirou fundo, segurando firme no guia do carro. Parecia completamente bravo com a audácia da filha.

— Eu não pretendia esconder isso de você por muito tempo, Olivia. - me encarou, fazendo com que meu coração disparasse. — Estou muito doente, tenho pouco tempo de vida e... Eu pretendia contar! Mas não dessa forma, desse jeito escandaloso que Maria Maddalena nos colocou.

— Monique, pai. O meu nome é Monique!

— Enfim, Monique. - olhou para a filha com desdém. — Está certa sobre sermos parentes, mas não do jeito que você pensou. Na verdade, Vincent Miller é meu irmão caçula. - meu estômago embrulhou com a revelação, tudo parecia estar rodando, Henry segurou meu braço ao perceber que a qualquer momento eu desmaiaria ali.

Enrico aproximou-se com cuidado, encarando-me com um brilho nos olhos.

— Me perdoe pela a minha ausência em sua vida, bambina. Você é muito importante para mim, sempre foi e sempre será.

— Meu pai mentiu todo esse tempo para mim. Ele dizia não ter nenhuma família, que era sozinho no mundo. - a essa altura lágrimas descontroladas caíam sob minhas bochechas.

— Não! Não fale assim dele. Seu pai amava você, ele queria te proteger da nossa família e conseguiu. - o olhei com os olhos inundados, meu coração estava partido. — Nosso pai era um homem muito severo, querida. Ele não aceitaria a vida que Vincent queria levar ao lado de Jenna, muito menos que tivessem uma filha. Meu irmão lutou contra tudo e todos, renegou a herança deixada por nosso pai, começou do zero com a sua mãe e...

— E traiu ela. - completei magoada. — Ele fez todo esse esforço para nada.

— Sei que está magoada, não tiro a sua razão. Mas peço que não tenha raiva do seu pai, ele não merece isso. - Enrico se aproximou ainda mais, até ficarmos bem próximos. — É um prazer conhece-la pessoalmente.

Ele sorriu, porém continuou no mesmo lugar que estava. Observando-me com cuidado.

— Por que o senhor nunca apareceu? Eu precisei de você! E-eles dois morreram, me deixaram sozinha... E-eu não tinha ninguém ao meu lado! -  falei, limpando o rosto. Malditas lágrimas insistentes!

— Seu pai não aceitava a minha presença em sua vida, ele me proibiu de vê-la e de tentar qualquer contato. Sempre mandei um bom dinheiro para a sua criação através de Jenna, Vincent não sabia. Quando os dois morreram, acabei adoecendo e você já tinha ido embora da sua casa. - explicou, continuei firme na posição em que estava. — Errei em não ter a procurado, mas como você iria acreditar em mim? Um homem que nunca tinha visto em toda a sua vida? Acho que pela primeira vez em minha existência, senti vergonha por não ser bom o suficiente para a minha sobrinha.

Fiquei em silêncio, tentando assimilar toda aquela história, mas parecia tão complicada. Henry ainda estava ao meu lado e Enrico me encarava, esperando por uma resposta. Mas que resposta posso dar?

— Olívia, peço que você venha comigo para a minha casa. Como você sabe, não tenho muito tempo de vida, mas quero fazer tudo certo, inclusive colocá-la em boas condições. - novamente, meu coração deu um pulo.

— Você não é obrigada a fazer isso, Olívia. - Monique me olhou com empatia. Ela sabia que toda aquela história estava confundindo a minha cabeça.

— Você virá comigo também, Maria Maddalena... Monique ou sei lá o quê, mas já está na hora de voltar para casa.

— Se o senhor aprender que meu nome agora é Monique, talvez eu pense. Sou uma viúva, o nome combina comigo. - piscou debochada.

— E-eu quero ir para o hotel, por favor, me leve! - olhei para Henry.

— Mas...

— Estou confusa, preciso organizar a minha cabeça, Sr. Ferrari. Peço que me dê alguns dias. - falei educada.

Ele respirou fundo e assentiu.

— Como desejar. Ficarei em Vegas até domingo, espero sua resposta. Até breve! - despediu-se.

Observei o homem caminhar com o pastor alemão ao seu lado até um carro grande. Ele entrou no veículo e em segundos foi embora.

— Bem-vinda a família, priminha! - Monique abriu os braços, acolhendo-me em um abraço apertado.

— Essa conversa foi tensa. - Henry disse, respirando fundo. — Estou exausto, preciso de uma dose forte de álcool puro.

— Vou me juntar à você, querido. Preciso urgentemente me embebedar depois dessa revelação. - Monique riu.

Continuei em silêncio e permaneci assim até voltarmos para o hotel. As palavras daquele homem não saiam da minha cabeça, nada parecia fazer sentido em minha vida, principalmente agora.

— Que tal comermos uma torta de limão no restaurante? Sei que é sua preferida e...

— Quero ir para o meu quarto, Henry. Se não se incomodar, não pretendo descer tão cedo. - confessei nervosa.

— É claro, tenha o tempo que precisar. - aproximou-se, beijando minha testa carinhosamente.

Forcei um sorriso deixando-o para trás. Subi a escadaria nervosa, ansiosa por tudo que acabara de acontecer. Oh céus! Várias perguntas martelavam na minha cabeça e nenhuma delas tinha uma resposta coerente. Tenho três dias para decidir se acompanharei o meu "tio" para outra vida ou pegarei o primeiro vôo de volta para NY.

Acredito que qualquer que seja a minha decisão, essa fará minha vida mudar completamente. Afinal, não podia apagar os acontecimentos dessa viagem da minha memória.