Capítulo 33

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Ren pareceu não ter ouvido nada do que aconteceu a poucos minutos, antes de que eu resolvesse finalmente me sentar ao lado dele sem dizer uma só palavra, passei alguns segundos respirando e tentando controlar a minha vontade de correr para o lado contrário dos dois.

Daniel havia quebrado meu coração e eu já não sabia como me comportar perto dele mais, a dor de tê-lo visto com outra foi surreal. E meu peito não estava preparado para ter que suportar tanto assim.

Os olhos puxados do meu até então "noivo" estavam fixos na linha onde uma extensa cerca viva bloqueava toda e qualquer passagem para fora da propriedade, parecia calmo demais para quem tinha saído aos socos com Daniel e também pouco se importar com a movimentação ao redor.

Eu invejei essa calmaria que ele transmitia.

— Achei que não fosse aparecer. — Ele suspirou bebericando a xícara fumegante.

Eu dei de ombros, nada e agora ninguém me dava mais motivos para ser simpática ou sequer desejar ficar, mesmo que por pouco tempo nesse lugar.

— Talvez eu não devesse mesmo. — Conclui mais para mim mesma.

Ren sorriu e continuou olhando para longe.

— Eu não queria ofender seus sentimentos, Ella. Não sabia que era algo real, mas dada as circunstâncias... talvez tenha sido o melhor que poderia ter acontecido, Yakato o mataria se soubesse dos motivos dele te proteger tanto.

Não respondi, não havia nada a ser dito em relação ao que eu sentia por Daniel e Ren estava certo. Por causa da situação, esse tipo de relacionamento não era permitido em lugar algum e numa família como essa, não teríamos chance alguma.

— Não há nada nos meus sentimentos, esqueça isso. — Respondi olhando fixamente para a mesma cerca viva. — Por que me chamou aqui?

Ele finalmente moveu o corpo, fazendo a camisa branca mover delicadamente com o corpo esguio. Ren tinha o físico parecido com o de Daniel, alto e escondia sua força em um corpo quase magro, o que diferenciava os dois eram as tatuagens que Daniel tinha sobre toda a pele abaixo do pescoço.

Ren tirou uma caixa do bolso, grande demais para ser um anel e pequena demais para ser uma arma. Eu ri mentalmente com escárnio, a forma como minha mente trabalhava contra mim era deliciosamente irritante.

A caixa retangular de veludo azul foi colocada ao meu lado em cima da mesa chamando a minha atenção mais do que o café da manhã. Ignorei a minha curiosidade, mas Ren parecia ser tão esperto quanto Daniel quando se tratava de tentar chamar a atenção, mas ao contrário do meu tio, ele fazia com mais delicadeza.

Olhei de soslaio, ele sorriu de um jeito divertido e meus olhos reviraram nas orbitas. Ren tinha aparentemente a mesma idade que Daniel, mas nesse momento, parecia um maldito adolescente.

Nem mesmo eu me comportava dessa maneira.

— O que é isso?

— Seu primeiro presente como minha noiva.

Eu ri com escárnio dessa vez em alto e bom som, me virei para encontrar os olhos puxados fixos em mim e esperando que eu abrisse a caixinha ao meu lado.

— Não por escolha. — Debochei vendo os olhos dele brilharem para mim.

Peguei a caixinha e olhei ao redor, examinando como abri-la e pensando se era isso mesmo o que eu queria fazer com o objeto.

— Nunca quis que tivesse, só me arrependo de ter machucado seus sentimentos no meio do processo. Daniel não merece você.

— Você não sabe nada de mim. — Grunhi colocando a caixa novamente em cima da mesa, desistindo de abri-la. Não daria nada a ele, nada que ele pudesse usar.

Mas o sorriso dele aumentou ainda mais, fazendo com que os olhos puxados quase sumissem por causa das bochechas elevadas.

— Me permite?

Não. Pensei para mim mesma encarando a mão dele agora.

Mas ignorei a minha raiva, a minha vontade de desistir e fugir desse lugar. De socar esse homem que havia achado que tinha algum poder sobre uma mulher que ele sequer conhecia, que ele basicamente comprou de Yakato.

A porra de uma mercadoria.

— Eu deveria socar a sua cara, parece que Daniel não fez o trabalho direito.

Ouvi uma risada satisfeita e aceitei a mão estendida para mim. Ren pegou a caixinha colocando-a novamente dentro do bolso e me puxou pelo jardim dos fundos, caminhamos por alguns minutos até uma pequena casa se expor entre as arvores.

Me parecia mais um celeiro.

Puxei a minha mão da dele por causa da sensação estranha que isso me causava e ele pareceu aproveitar a situação para abrir as portas de madeira do celeiro escondido nos fundos da casa.

O ar quente correu para fora bagunçando ainda mais os fios dos meus cabelos que estavam soltos pela trança que Catrina tinha feito mais cedo, não havia nada além de feno no chão e alguns blocos posicionados ao redor do espaço, mas então, quando meus olhos se acostumaram com a pouca luz dentro do espaço consegui ver um saco de areia firmemente preso numa das colunas centrais.

— Acho que sei mais de você do que está imaginando, garota. Talvez até mais do que a sua paixonite recente. — Quase consegui ignorar o que ele estava tagarelando no meu ouvido enquanto minhas mãos formigavam com a maldita vontade de descontar a minha raiva.

— Como?

— Isso importa? Depois de tudo o que sei de você, um segredo ou outro não parece ser tão ruim assim, não é? Aliás, Daniel parece esconder mais de você do que imagina.

Eu sabia que Daniel não tinha me contado nada dele, havíamos nos conhecido a poucas semanas e nesse pouco tempo eu passei mais horas fugindo dele e ele me perseguindo do que nos conhecendo como família, talvez isso tenha deturpado nossa relação de família e nos levado ao que tínhamos até pouco tempo.

Sacudi a cabeça tentando espantar os pensamentos da minha mente.

— Importa, não quero me casar com quem tem segredos.

— Isso foi interessante... — Ren murmurou surpreso, sequer olhei para ele, o couro preto em volta de toda aquela areia parecia chamar meus punhos com sensualidade. — Mas já que está pronta para entrar de cabeça nessa... — Ele continuou murmurando e tirando a camisa aos poucos.

— Que merda pensa que está fazendo? — Gritei me afastando dele, entrando e me aproximando cada vez mais daquele saco pendurado na coluna que atravessava o teto.

— Vamos lutar, gatinha. — Ele respirou fundo jogando a camisa em cima dos blocos de feno me encurralando atrás do saco de boxe. — Quero ver o quanto de raiva você tem acumulado aí dentro desse vestido. 

ESTRANHOWhere stories live. Discover now