A Ordem

1.5K 98 5
                                    


*

Marie acompanhava a aproximação do barco com olhar sereno, ao contrário do mar, que naquele dia estava agitado e sombrio. Nuvens escuras e espessas enfeitavam o horizonte, anunciando que uma tempestade logo abandonaria o continente e seguiria para a ilha em que se encontrava.

A embarcação ainda estava distante, mas apertou os olhos e conseguiu distinguir as vestimentas dos seus ocupantes. Entre o marrom encardido do barqueiro e o cinza escuro dos novos ordenados, avistou o verde escuro da túnica de Virnan e Petro.

Um leve palpitar de alegria lhe tomou.

Não via a amiga desde que partiu para o continente, sob a incumbência de aplicar os testes para o ingresso de novos ordenados. Era um trabalho que ela nunca apreciou, mas tinha pedido a grã-mestra para executá-lo. Infelizmente, Marie sabia que o motivo não foi o desejo de servir a Ordem, mas a vontade de afastar-se dela.

O barco estava próximo, agora. Já conseguia distinguir a face de traços delicados da guardiã, que estava próxima ao barqueiro, enquanto Petro sentava-se entre os ordenados. Daquela distância, Virnan parecia uma criança, já que era mais baixa e magra que a maioria das mulheres daquelas terras.

— Só três — Fantin falou ao seu lado, trazendo a atenção de Marie para si.

Onde havia uma delicadeza excessiva em Virnan, havia aspereza em Fantin. Não era uma mulher feia, pelo contrário. Possuía um dos rostos mais belos dentre as mulheres da Ordem, entretanto era dona de gestos bruscos e palavras que, embora amenas e agradáveis, sempre soavam rudes.

Ela continuou, com um leve estalar de lábios:

— Estou impressionada. Jurava que essa galhofeira iria trazer um exército consigo. Veja o semblante emburrado de Petro. Deve ter passado por maus bocados ao lado dela.

De fato, o guardião em questão mirava a companheira de uma forma nada amigável, mas esta parecia, ou, mais acertadamente, fingia não notar.

"Você não gosta mesmo dela."  — Marie gesticulou, traçando sinais delicados no ar.

O fazia devagar, para que a companheira conseguisse lhe compreender bem. Mesmo após décadas de convivência, Fantin, assim como outros ordenados, ainda tinha um pouco de dificuldade para compreender a linguagem de sinais.

— Não é uma questão de gostar ou desgostar. Virnan tem lá suas qualidades. Não posso negar que é uma excelente guardiã, mas ainda não engoli aquela história do gato, nem aquela dos lençóis e tantas outras. Às vezes, me pergunto como alguém tão pequeno pode causar tamanho estrago.

Marie sorriu, semicerrando os olhos, e continuou traçando novos sinais no ar:

"Sei que para você foram brincadeiras desagradáveis."

Tomou o cuidado de não dizer que se divertiu com as peças que ela sofreu e mordiscou o lábio para não aumentar o sorriso, enquanto Fantin franzia a testa concentrada na interpretação dos gestos.

"Mas Virnan é muito séria quando se trata do trabalho que desempenha na Ordem. Jamais permitiria que qualquer um, que não fosse merecedor, ingressasse."

A outra deu de ombros, deixando claro que não acreditava muito nisso. A mulher em questão era uma das melhores guardiãs que a Ordem já teve, mas era igualmente irresponsável e dada a fazer travessuras com os companheiros.

— Temo que ela nunca mude e continue nos atormentando com essas traquinagens. — Fantin balançou os ombros, retendo um suspiro, e mudou de assunto. — Ela nunca se ofereceu para esse trabalho.

A Ordem: O Círculo das ArmasWhere stories live. Discover now