Manir

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*

Érion sentiu a mudança nas correntes mágicas que envolviam o mundo, assim como Zarif.

O dragão soltou uma mistura de vapor quente e fogo pelas narinas, enquanto riscava o chão com uma das garras longas e afiadas. Pousou os olhos amarelos sobre seu mestre.

— Você poderia, ao menos, tentar esconder essa felicidade. — Disse o Cavaleiro.

Zarif riu, malvado. Em verdade, nunca se importou em esconder de Érion que o odiava. Só estavam unidos através de um laço mágico, porque ele o enganou.

O mestre continuou:

— Deveria ser mais grato a mim. Afinal, se não tivéssemos feito um pacto, sua existência seria apagada deste mundo.

O dragão soltou outra lufada de vapor, mas permaneceu em silêncio. Agora que sabia que sua antiga senhora estava viva, enchia-se de esperanças de que ela fosse capaz de pôr fim a servidão em que tinha caído. Ainda que estivesse ressentido por ela ter feito um novo pacto, não podia negar a alegria que sentiu ao revê-la. Sua visita a ela teve uma punição dolorosa, mas a recebeu com um incomum bom humor, o que aumentou a ira de Érion.

— Virnantya está na cidade, mas isso não significa que conseguirá frustrar meus planos outra vez. — Fez um gesto afetado, erguendo diante dos olhos, o medalhão que adornava seu pescoço. Um sorriso cruel lhe deformou os lábios. — Antes da última lua cheia, uma guerra irá eclodir e terei poder suficiente para quebrar os círculos que protegem Flyn. Finalmente, irei derrubar os Portões de Cazz.

Desta vez, Zarif não conseguiu ignorá-lo.

— Mas você ainda não tem a pedra do coração.

Era verdade. Se tivesse descoberto antes que a pedra não estava em Flyn, como acreditou por séculos, não teria passado tanto tempo maquinando guerras e procurando almas poderosas para sacrifícios que reforçariam o poder do amuleto que usava.

— Não precisarei dela, afinal. Este amuleto será tão poderoso quanto ela e me permitirá abrir os portões assim que tiver a alma da eleita de Midiane.

Zarif riu, ferindo seus ouvidos.

Será interessante vê-lo tentar conseguir essa alma — zombou.

O cavaleiro fez uma careta para ele, depois sorriu.

— Não importa que esteja em companhia daquela maldita Castir, o dom dela me pertencerá.

**

— Esta é a cidade da nossa juventude.

Não exatamente. — Lyla chegou mais perto dela.

Esticou o braço para lhe enxugar a face com as costas da mão e surpreendeu-se por não lhe recusar. Era a primeira vez que se tocavam desde o pacto e a sensação foi deveras inquietante. Era como se estivesse tocando a si mesma, mas de uma forma tão intensa que as emoções pareciam não caber em si.

Assustada com a força daqueles sentimentos, afastou-se. Reparou que Virnan liberou o ar dos pulmões com alívio e não conseguiu evitar a curiosidade. Lhe perguntou, mentalmente, se tocá-la seria sempre assim. Ela respondeu com um inclinar positivo de cabeça e completou:

— Vai descobrir que essa união é muito mais profunda do que imagina.

Aspirou o ar frio da manhã com grande prazer. Um peso lhe abandonava o peito, ainda que nada estivesse explicado e o perigo muito longe de passar. Focalizou a cidade sem conseguir ocultar um sorriso leve e o vento lhe trouxe os aromas dela. Mirou os soldados que se aproximavam rapidamente e uma dúvida se tornou certeza quando os sussurros da cidade cresceram em seus ouvidos. Ainda assim, indagou:

A Ordem: O Círculo das ArmasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora