Uma Marca de Morte

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— Como ela está?

Marie voltou-se para a porta e deparou-se com a cabeça loira e desgrenhada de Fantin. A companheira do círculo da sabedoria a abriu completamente, com o familiar jeito bruto. No entanto, a fechou devagar e silenciosamente, então jogou-se sobre a outra cama do quarto minúsculo e abafado. Franziu o nariz para a poeira que se elevou do colchão. Seu cansaço físico era mais que evidente, mas ela se mantinha alerta e com um sorriso pueril.

Tinham conseguido atravessar o Cinturão de Bévis com sucesso, mas o navio sofreu graves avarias. Por diversas vezes, foram jogados contra as pedras até que o casco se rompeu em alguns pontos e foi necessário usarem magia para impedir que a água invadisse a embarcação e naufragassem.

Assim que atracaram e se certificaram de que estavam seguros, Lorde Verne guiou as ordenadas para uma estalagem e as deixou sob os cuidados de Fenris, enquanto cuidava dos rituais funerários para os companheiros que faleceram durante o embate com os axeanos. A grã-mestra fez questão de acompanhá-lo e prestar honras aos mortos.

Uma mancha de infiltração se espalhava pela madeira do teto mofado, chamando a atenção da recém-chegada. Com certeza, Lorde Verne podia pagar um local melhor ou poderiam se abrigar em uma das casas de apoio da Ordem. Embora não fossem oficiais, esses locais eram habitados por aspirantes ou ex-ordenados, que seguiam os ideais da irmandade e ofereciam alimento e cura para quem necessitasse. Estavam sempre em contato com a Ilha Vitta e, frequentemente, hospedavam os ordenados em suas viagens àquele reino.

Entretanto, foi de comum acordo que decidiram buscar um local mais discreto, nos arredores do porto.

Era certo que tinham conseguido despistar os axeanos por algum tempo, afinal, eles não ousariam enviar soldados para invadir uma das maiores cidades de um reino com o qual mantinham vantajosos acordos comerciais. Contudo, muitos outros inimigos estariam à espreita, ansiosos por ganharem a gorda recompensa que Lorde Axen oferecia pela eleita.

A fim de manter a discrição, a bandeira da Ordem foi retirada do mastro do Guerreiro dos Mares e as velas recolhidas. Os ordenados abandonaram as túnicas e faixas ornadas com seus símbolos e usavam roupas civis para se locomover pela cidade. O mesmo foi feito pelos homens de Midiane.

"Ainda inconsciente." — Marie respondeu.

Olheiras profundas circundavam os olhos vermelhos de cansaço e sono. No entanto, ela se mantinha firme nos cuidados da ex-pupila. Fantin brincou com uma mecha dos fios dourados em sua cabeça, então atirou o braço sobre os olhos. Assim que se encontraram em segurança, Virnan se entregou ao cansaço e desmaiou, lhes causando enorme preocupação. Jamais admitiria em voz alta, mas também se sentiu aflita com o estado de exaustão da guardiã.

Aqueles dias no mar lhe permitiram enxergar alguns aspectos dela, que a convivência na Ilha Vitta jamais deixou, já que fazia gosto por evitá-la e às suas brincadeiras. No navio, estavam se esbarrando constantemente e teve a oportunidade de confirmar o que Marie lhe disse, dias antes, enquanto ela retornava à ilha com os novos ordenados. Apesar de inconsequente, Virnan se tornava muito séria quando em missão.

Isso causou estranheza em Fantin, que já tivera a oportunidade de participar de uma missão na companhia da guardiã e, pelo o que se recordava, Virnan não se poupou de ser irritante, irresponsável e traquinas em nenhum único dia dos dois meses que passaram em Niramar. Agora, pensando sobre isso, ela concluiu que a atitude desleixada da guardiã se dava pelo fato de que o Guardião Milan, líder do Círculo Protetor, comandava a missão e tomava as decisões difíceis. Agora que a liderança era dela, Virnan mostrava seu lado responsável e firme.

A Ordem: O Círculo das ArmasWhere stories live. Discover now