Nebulare

416 68 30
                                    


*

— Do que está falando? — Verne se levantou, também.

Enquanto Virnan se preparava para responder, o observou escorregar a mão para a espada. A janela às suas costas se estilhaçou e algo pesado lhe atingiu, jogando-a para a frente. O chão duro e frio a recebeu. Por longos instantes, não se moveu. Então, rolou para o lado e arqueou a cabeça.

Observou as gotas de sangue que tingiam o piso de madeira com a visão embaçada. Elas deslizavam, encharcando as pontas dos cabelos negros, formando uma poça ao lado de uma pedra tão grande quanto sua mão.

Por um tempo tudo o que ouvia era o bater forte do seu coração e a respiração pesada. Não sabia onde estava, não entendia quem era. As ideias se misturavam, enquanto uma forte náusea a tomava, obrigando-a a se esforçar para não expulsar o conteúdo do estômago.

Alguém se agachou ao seu lado, a ajudou a ficar de pé. Foi guiada até o outro lado da sala com pernas trêmulas e hesitantes. O sangue escorria farto, agora nublando completamente a visão. Fechou os olhos e foi envolvida por braços conhecidos.

O cheiro de Marie se infiltrou em suas narinas, trazendo a familiar sensação de segurança, enquanto os pensamentos se colocavam em ordem. Outras mãos lhe ofereciam cuidados curativos e a dor foi amainando até que os primeiros sons da luta lhe chegaram.

Abriu os olhos e se deparou com o rosto preocupado de Marie. Lhe pesava ver o reflexo do medo e preocupação que a tomava, mas também lhe comprazia perceber que, por alguns instantes, ela tinha deixado cair a máscara de mentora e amiga. Marie poderia negar para si mesma, para o sol e para as estrelas, mas jamais conseguiria enganá-la. Ela a amava também.

A mestra movia os lábios sem que nenhum som lhe escapasse e a apertou mais contra si. Usou tanta força que o ar lhe sumiu por um momento. Por sobre o ombro dela, assistiu Lorde Verne decepar a mão de um atacante, enquanto Fenris interceptava as investidas de outro. O cavaleiro se esquivou de um corte transversal e se aproveitou de um breve momento de desequilíbrio do adversário para enfiar a espada na perna dele. O homem rugiu, saltando para trás, até trombar com a mesa e se tornar vítima, outra vez, da lâmina do cavaleiro.

Dois homens entravam pela janela quebrada, jogando-se sobre o badir, mas ele percebeu a movimentação e saltou para o lado, desferindo um golpe fatal em um deles, ainda no ar.

Fantin e Alina tinham conjurado uma proteção para elas, impedindo que os inimigos se aproximassem daquele ponto da sala, caso passassem pelos guerreiros de Midiane, mas os dois tinham a situação sob controle e não tardou para se verem rodeados por corpos.

O badir cuspiu no chão, ofegante. Fenris limpou a lâmina da espada na túnica de um dos mortos e se aproximou das mulheres.

— É o melhor que posso fazer, no momento — Melina falou, retirando as mãos dos ombros da guardiã, mas Marie não a soltou, ainda estava embebida no medo que sentiu quando a viu sangrando no chão. Foi como se espíritos maléficos carregassem seu sol, deixando apenas uma noite sem estrelas, onde tudo era apenas vazio.

Pela segunda vez, no espaço de um dia, aquela terrível sensação lhe tomava e odiou-se por se sentir assim. Sobretudo, odiou Virnan por machucá-la daquela forma, mesmo sabendo que não era culpa dela.

A guardiã se aprumou entre seus braços. Lhe sorriu, brejeira.

— Eu já me sinto bem, Marie. E por mais que goste de estar em seus braços, preciso que me solte.

A mestra se demorou a obedecer, apertando-a mais contra si. Virnan até que estava apreciando aquilo, mas não era o momento, então ficou na ponta dos pés, lhe dando um beijinho no queixo. Desconcertada, a mestra a soltou com um violento tom vermelho a lhe tingir a face.

A Ordem: O Círculo das ArmasNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ