2. Fase I - O Último Samurai

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Noda, Província de Uchiha – 10 de novembro de 1868

Ano 1 da Era Meiji, 3 dias após a invasão.


Era impossível adentrar a cidade de Noda sem suspirar.

No outono, as copas das árvores de bordo ganhavam lindos tons alaranjados, os arbustos kochia – que ladeavam as estradas de todo o território – dobravam de tamanho e suas folhagens tingiam-se naturalmente de um vermelho intenso, como suculentas cerejas satonishiki colhidas no início do verão. Essa amálgama de cores, ao contrastarem com o céu azul do horizonte, pareciam pinceladas de um artista sobre uma tela em branco.

Ao longo do caminho, encontrou meninos de cabelos escuros carregando aljavas e flechas para os centros de treinamento, montando cavalos nos estábulos, seguindo rumo aos dojo para praticarem arte marcial e o manejo de armas de combate. Nas varandas das casas de madeira, graciosas meninas do clã Uchiha sentavam-se diante de mesas baixas com professoras e casamenteiras, aprendendo a arte de servir chá, técnicas de bordados e os bons costumes aguardados de uma dama primorosa, preparando-se para seguirem o destino inevitável de todas as mulheres: o de esposa e mãe.

Às margens do rio a oeste, viu as criadas da Casa Principal reunirem-se nos pomares. Vestidas em amarelo, com as mangas de seus kimonos amarradas para trás, utilizavam escadas e cestos para colherem as frutas da estação, tomando seu devido tempo para inspecionar a qualidade das famosas peras de Noda por serem as prediletas de sua senhora e um motivo de desejo ao longo de toda a gestação.

Tão improvável quanto perder-se naquela estupenda paisagem era adentrar a Casa Principal, lar de Uchiha Fugaku, e não apaixonar-se ao ter um vislumbre de sua esposa a quem todos afetuosamente chamavam de hime – princesa –, uma mulher cuja beleza e graciosidade eram tão conhecidas quanto os feitos heroicos do líder do clã, embora sua notoriedade tenha se instituído através da gentileza e amabilidade, contrário aos méritos de seu marido.

Habituado a caminhar naquela majestosa mansão, o mensageiro seguiu caminho através dos muitos jardins aristocráticos de lírios, crisântemos, camélias e violetas, vendo como os tanques de água cercados de pedras estavam cheios de lótus flutuantes na superfície e peixinhos coloridos ao fundo, uma delicadeza tão destoante à rusticidade que Uchiha Madara deixara para trás e que Fugaku certamente assim preservaria, não fosse os desejos da esposa em modificar aquele lar e enchê-lo de alegria.

Quando chegou ao lado leste do casarão – dedicado inteiramente aos estudos – encontrou-a ajoelhada sobre uma almofada macia na varanda diante do jardim. Pequenos carreteis de linhas coloridas estavam dispostos à sua direita e, apoiado em seu colo, havia um kimono de seda branca do qual supôs ser para uma criança, dado o pouco comprimento.

O mensageiro baixou a cabeça e deu alguns passos para continuar seu caminho, mas fora imediatamente impedido quando a voz de Uchiha Mikoto quebrou o silêncio celestial, graciosa e macia como o canto de um rouxinol.

— Isao-san.

Virou-se em sua direção, se curvando em uma mesura respeitosa.

— Minha senhora.

Mikoto ofertou-lhe um sorriso gentil que a deixara ainda mais bela. Seus cabelos eram negros como as asas de um corvo, brilhantes devido a exacerbada escovação de suas criadas e tão longos que espalhavam-se no chão abaixo, seus lábios rubros como sangue destacavam-se na pele perfeita de porcelana, revelando a nobre condição da mulher que jamais se expunha ao sol ou às mazelas das mudanças climáticas.

Kurushimi - A Gueixa e o Samurai (SENDO TRANSFORMADA EM LIVRO)Where stories live. Discover now