51. Fase III - Kintsugi

2.2K 151 1.2K
                                    

Kintsugi: "emenda de ouro".
Refere-se à tradição japonesa de colar rachaduras com ouro/prata para tornar um objeto mais valioso do que previamente era antes de se quebrar.

Ao contrário da cultura ocidental, onde descartamos tudo o que se estraga, os japoneses seguem a filosofia de encontrar valor nas cicatrizes e defeitos. Esse conceito também se aplica às relações humanas, onde muitas vezes é necessário ocorrer um rompimento/desavença para quebrar a nosso conceito de idealização e somente assim compreendermos que alguns laços se tornam fortalecem através da imperfeição.

Nota inicial: as referências visuais desse capítulo está no pinterest nas pastas "cenário", "figurino de Haruno Sakura", "figurino de Uchiha Sasuke" e "referência de objeto/cena".

Boa leitura.



────── ──────



Kyoto, 16 de dezembro de 1877

Ano 10 da Era Meiji



Naquela madrugada, havia nevado pela primeira vez.

Através da grandiosa janela do quarto, conseguiu enxergar as camadas macias de neve encobrindo os galhos das árvores, arbustos e gramados do jardim. O céu enublado banhou o cômodo inteiro em uma luminescência acinzentada e sóbria, e cada floco de neve a despencar reproduzia sombrinhas suaves no piso de madeira; aquela melancólica paisagem, misturada ao imponente frio que alastrava-se por cada parede, fê-la encolher-se sob as cobertas de algodão e bocejar.

Havia acabado de despertar de um desconfortável sonho do qual pouco se lembrava dos detalhes, ainda que o conceito geral estivesse bem gravado em sua memória: era Sasuke decidido a ir embora para um lugar distante e inalcançável e por mais que corresse e gritasse para que ele permanecesse, não tivera efeito algum. Não, afogada em culpa e medo, suas pernas falharam e fora incapaz de se levantar.

Aprendeu a acreditar que cada sonho possuía um significado, Mamãe e Hinata costumavam lhe dizer, desde muito pequena, que todos tinham um e que era a forma que os deuses encontravam de deixarem uma mensagem aos humanos. Mas era cedo demais para conseguir decifrar o sentido daquele; com as sobrancelhas levemente contraídas, encarou o jardim diante da janela e pensou que talvez fosse apenas sua mente tentando puni-la por seu comportamento na noite anterior, por ter se deixado levar àquele ponto do quase com um alguém que não amava.

E, ainda pior, ter suspirado o nome do outro que sequer deveria existir para uma mulher comprometida.

Decepcionada consigo mesma, suspirou baixinho e virou-se na cama, surpreendendo-se ao encontrar o rosto adormecido de Oima ao lado, a mão apoiada no travesseiro macio e os longos cabelos escuros espalhados nas cobertas brancas. Sakura torceu os lábios e fitou-a com expectativa, pensando que – sábia como era – talvez a gueixa soubesse como ajudá-la com tudo o que a estava preocupando no momento.

Permaneceu ali por longos minutos, aconchegada no calor da cama e o travesseiro macio, confortavelmente encolhida e aguardando que ela despertasse, seus olhos verdes recomeçando a pesar de sonolência, o corpo relaxando e querendo que ela voltasse ao estado prévio de adormecimento por mais algumas horas, ainda que já houvesse amanhecido.

Entretanto, ao ouvir Oima respirar fundo e mover-se um pouco, Sakura arregalou os olhos, ansiosa para conversar com ela.

— Ohayo, Oima — saudou em um sussurro — Você está bem?

Kurushimi - A Gueixa e o Samurai (SENDO TRANSFORMADA EM LIVRO)Onde histórias criam vida. Descubra agora