42. Fase III - Tsumetai

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Tsumetai: refere-se a alguém com personalidade/atitudes frias. 

Eu vou responder todos os comentários do último capítulo assim que possível, mas saiba que eu li cada um deles com muito carinho e agradeço demais a todos que estão votando e interagindo!

Boa leitura!

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Tóquio, Lótus Celeste– 14 de novembro de 1877

Ano 10 da Era Meiji


Abriu os olhos.

Uma luz azulada clareava o cômodo ao seu redor suavemente, apenas o bastante para que reconhecesse o padrão de flores do teto de seu próprio quarto. Inspirou, querendo mover-se, mas descobriu estar pesada como uma pedra, os membros não querendo obedecê-la como se desconectados de seu corpo.

Da mesma forma estavam suas lembranças, tão difusas e enubladas, chegando a ela em pequeninos fragmentos: tosse, sangue e escuridão, nada parecendo encaixar-se completamente, uma estranha ausência pairando entre uma e outra. Mas não demorou até que retornassem de uma única vez e, com elas, lágrimas brotaram de seus olhos verdes, escorrendo pelas bochechas coradas, pingando no futon abaixo.

Hina... — o lamento pesaroso escapou de seus lábios entreabertos, culminando em soluços que balançaram o peito e os ombros.

A lembrança de sua onee-san sem fôlego, caída, ensanguentada, tanto sangue, a encheram de uma tristeza que parecia prestes a rasgá-la por dentro, insuportável. E sentiu-se tão culpada, sabendo que nada daquilo teria acontecido sem seu egoísmo de tê-la consigo, sem aquele estúpido pedido que era fruto de sua curiosidade infantil.

— Está dormindo.

Sakura arfou, surpresa.

Ao tombar o rosto para o lado, notara o general encostado na janela aberta, os olhos perdidos na paisagem externa, a luz prateada das estrelas e da lua delinearam sua figura despida do paletó escuro que utilizara na festa, permanecendo com a camisa e a gravata. Ela investigou o cômodo à procura de outra pessoa, encontrando a criada a sentar-se na almofada diante de sua mesa baixa de refeições, no segundo ambiente do grande quarto.

As leis do karyukai eram estritas ao tratar-se dos homens; com exceções de médicos e notícias urgentes, eles não podiam adentrar ao okiya após determinado horário, sobretudo para ficar a sós no quarto de uma moradora do hanamachi. Mas acostumada com a maneira desesperada que Otsu parecia violar todas as regras pelo general, Sakura não se surpreenderia se estivessem desacompanhados.

— Orochimaru-sama... — murmurou, virando-se para olhá-lo — Então ela não está...? Não está... — sua voz morreu, sobrepujada por um choro que não pudera controlar — Ah.

Em resposta, Orochimaru negou em um gesto de cabeça, descruzando os braços e caminhando lentamente, o piso de madeira estalando sob a pressão de seus pés. Tão contaminada de alívio e tristeza – sem saber ao certo qual deveria sentir primeiro –, a maiko deixou-se dominar pelo choro angustiado, escondendo o rosto com ambas as mãos, as palmas inundando-se de lágrimas.

Não havia palavras que pudessem expressar o peso que saíra de seus ombros ao saber que ainda estava viva, temendo que tivesse de deixá-la ir e, consequentemente, perder uma parte de si mesma e o resto de amor que ainda existia naquela casa. Sobretudo agora, quando já não lhe restava mais nada e ninguém.

Kurushimi - A Gueixa e o Samurai (SENDO TRANSFORMADA EM LIVRO)Where stories live. Discover now