7. Fase I - Yaeko Sakura

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Notas da autora:

-Você encontra o significado das palavras marcadas com asterisco (*), assim como de todos os sufixos usados (ex: -dono, -sama) em Glossário & Honoríficos.

- Acesse o link da pasta de Kurushimi no pinterest para ver as referências visuais deste e de outros capítulos na minha bio. Se essa é sua primeira vez aqui, cuidado com possíveis spoilers.

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Tóquio, Lótus Celeste – Março de 1872

Ano 5 da Era Meiji


Na primavera, a sagrada mãe-natureza ordenou que todas as flores desabrochassem. Obedientes ao poder da divindade, elas floresceram, uma a uma, colorindo e perfumando as ruas de Tóquio. Sábia, exigiu que outra acompanhasse o ciclo natural intrínseco ao seu ser e, frágil ante àquele poder irrevogável, a cerejeira submeteu-se ao rito de passagem à fecundidade, derramando o vale púrpura para anunciar o fim de sua infância.

No mês de seu décimo segundo aniversário, fora presenteada com um novo título: mulher.

Inocente, sequer compreendia como aquela palavra seria traiçoeira, uma gaiola de ouro cujo brilho atraia jovens meninas e as trancafiava para sempre. Ser mulher – aprenderia desde então – era moldar-se às expectativas da sociedade e tornar-se um símbolo de beleza e fragilidade, despindo-se de seus sonhos, valores, personalidade e liberdade, uma casca vazia feita de curvas e orifícios.

Ao despertar, encontrara seus lençóis manchados de vermelho e sentiu-se novamente como a pequena menina de anos antes, arrastada para um novo universo cheio de segredos. Descobrira que aquele, no entanto, não era unicamente seu, mas um rito compartilhado por todas as mulheres daquele mundo: seiri, o sangue feminino da vida. E ainda que essa capacidade lhe soasse extraordinária, aprendera que os deuses o consideravam um kegare*, sendo obrigada a permanecer em casa até estar purificada outra vez.

Como se a menstruação dissolvesse a máscara daquele universo que outrora fora cheio de cores e perfumes, começara a perceber que o okiya não era mais um lar acolhedor onde a irmandade entre mulheres reinava absoluto, mas um mundo tão inóspito e traiçoeiro quanto qualquer outro, cheio de malícia, intrigas, inveja e competição. Por trás dos painéis decorados, meninas eram como flores que sonhavam desesperadamente com a primavera, estiolando-se na fúria da espera pelo momento em que tornar-se-iam mulheres.

Encabeçadas por suas irmãs mais velhas, eram ensinadas a almejar o favoritismo de Mamãe, a destruir a reputação da outra, a se tornarem obcecadas com a própria aparência a ponto de odiar qualquer menina que pudessem ameaçá-las futuramente, roubando seus clientes por serem mais desejáveis e, sem saber que sua puberdade também era um sinônimo de ameaça, ela se tornara o novo símbolo de inveja e ciúmes, um sentimento estabelecido, acima de tudo, pela forma como sua situação tornara-se quase um evento.

No hanamachi, a crença de que era preciso uma vila inteira para criar uma criança era vista com tamanha seriedade que as notícias de cada okiya eram compartilhadas com toda a comunidade, não demorando sequer algumas horas para que o anúncio de sua puberdade se tornasse um motivo de conversa e Lótus Celeste recebesse flores, presentes e visitas interessadas em conhecê-la pessoalmente.

Kurushimi - A Gueixa e o Samurai (SENDO TRANSFORMADA EM LIVRO)Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon