40. Fase III - Negaigoto o shite...

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Negaigoto o shite: "Faça um pedido...".
Crédito de tradução do título: Gabrielle Torraca.

Por favor, leiam as notas finais.
Obrigada e boa leitura!



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Tóquio – 11 de novembro de 1877

Ano 10 da Era Meiji

Aprendeu a suportá-la: a dor.

Era ela que a mantinha distante da força que almejava ter, dissipando seus ensinamentos sobre impecabilidade para puxá-la ao fundo de um poço onde nada existia além da escuridão. Desta forma, ao sentir que estava prestes a ser dominada por ela novamente, obrigou a si mesma a encontrar seu ponto de autocontrole, não querendo afundar-se e trazer a menina fragilizada de outrora para a luz.

Porque apenas recentemente havia quase se libertado dos terríveis pesadelos que acordavam-na durante a madrugada, em prantos. Quase, mas não ainda. Na noite anterior, havia apenas vagado por corredores escuros, incapaz de encontrar uma saída, sentindo um cheiro pútrido e incessável. Se comparado aos outros: um mero sonho. Abstrato. Insignificante. Sem lágrimas, corpos desmembrados, medo ou aquele homem com um sorriso maléfico que a sufocava até a morte.

Sem Uchiha Sasuke.

Como em um instinto de autopreservação, sua mente tratou de diluir o trauma para que conseguisse seguir adiante, desfazendo-se, lentamente, do pesar que a corroía por dentro até que a dor do abandono e a desesperança não fosse nada além de uma memória desagradável da qual ela, em um primeiro sinal de recordar-se, apressava a afastar. Esquecê-lo – ou esforçar-se para – foi, de fato, sua única salvação. Porque mergulhada demais naquela tristeza de nunca ter sido amada e sequestrada da oportunidade de trilhar um novo caminho em sua jornada pré-estabelecida, não teria forças para continuar.

Não somente seu emocional fora submetido aos meses de sofrimento, mas o corpo. Aquela curva mais acentuada em sua cintura não era fruto de uma exacerbada vaidade ou obsessão com a magreza – como sua própria mãe adotiva –, mas uma denúncia de sua fraqueza. Patética por ter se permitido chegar ao ponto em que, tão consumida pela tristeza, arrependimento e solidão, tornou-se incapaz de atender as necessidades básicas que a faziam humana: a fome, a sede, o simples ato de dormir.

E seguir adiante, ao contrário das mulheres livres – se havia uma naquele mundo – não era uma mera escolha. Era necessidade. Apenas precisava ser forte, ser salvadora, ser esposa. Ser mulher e assassinar, permanentemente, a menina rebelde e chorona. Uma de verdade, como sua mãe e sua irmã. Deveria, por seu próprio bem, em honra daquelas que a antecederam e para proteger as que a sucederiam. Por Hinata, atotori injustiçada. Por Oima, sua única companheira. Pelas pequenas e inocentes shikomi que não sabiam nada sobre as obrigações que viriam. Para que, no futuro, sua própria herdeira não sofresse da mesma sina.

Para quebrar a roda que girava interminavelmente em Lótus Celeste: mulheres perfeitas e aprisionadas que, sem escolhas, trancavam meninas livres em suas próprias gaiolas.

Aquela compreensão ocorrera somente quando se convenceu de que era a existência dele – e todas as lembranças intrínsecas ao seu nome – que a acorrentava na inércia e na incapacidade, a reduzindo a uma vítima injustiçada que nada poderia fazer além de chorar.

Oh, e fora tão doloroso tentar se libertar porque o amava. Amava tanto que sufocava. Porém, acreditou que merecia amar-se em maior proporção e, no momento, ambos os sentimentos eram incapazes de coexistir.

Kurushimi - A Gueixa e o Samurai (SENDO TRANSFORMADA EM LIVRO)Onde histórias criam vida. Descubra agora