O Plano Sênior

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Fernanda estava certa do que queria e do que valia. Quando passava, os homens se jogavam aos seus pés. Houvera herdado a beleza de sua tia e isso, todo mundo lhe dizia:

- Pode ser uma maldição, se você não souber como usá-la.

Fernanda estava em seu segundo ano da faculdade, cursando publicidade. Morava em um apartamento na capital, deixado por seus pais, que há alguns anos, resolveram se mudar de lá. Seu padrasto, Marcos, havia recebido uma proposta ótima de emprego para atuar como diretor de um hospital em uma cidade pacata do interior. Sua mãe, Cristina, relutou muito para deixá-la morando sozinha:

- Fernanda, como é que vou te deixar sozinha aqui? Você é nossa filha, eu e seu pai precisamos de você do nosso lado!

- Ai mamãe, quanto drama! Vocês vão estar há apenas 6 horas de viagem... Poderei visitá-los quando quiserem!

- Meu amor, a Fernanda tem razão – Marcos interveio – Afinal de contas, ela á é maior de idade, pode decidir o que fazer da vida. Além do mais, a faculdade aqui na capital é muito melhor. Há mais oportunidades de emprego e ela poderá criar independência mais cedo!

- Viu só, mamãe? Até o papai sabe que meu lugar é aqui!

- Mas não se deixe enganar, meu amor – disse Marcos, lhe dando um beijo na testa – vamos te ligar todos os dias para perguntar como estão as coisas. E queremos te ver batalhando para conseguir sua independência!

- Papai, com a beleza que deus me deu, pode ter certeza que sem emprego eu não fico.

A feição de Cristina mudara no mesmo instante. Estava brava e parecia não ter gostado nada do comentário de sua filha:

- Quantas vezes vou ter que repetir que beleza não é tudo, Fernanda? – seu tom de voz era alto – E que pode se tornar uma maldição se você não souber como usá-la?

Marcos interveio nesse momento, puxando suavemente Cristina de lado, e cochichando tão baixo que, se não fosse a audição perfeita de Fernanda, ela não teria o ouvido dizer para a sua mãe:

- Lembre-se de que ela não é a Rubi.



Ela estava a caminho da faculdade, quando encontrou sua colega de classe, Tânia:

- Boa tarde Fernandinha. Já viu que gato o aluno novo? – ela apontou para um menino moreno e alto, conversando com outras calouras da faculdade.

- Quem é ele? – Fernanda parecia interessada. Erguera uma de suas sobrancelhas, como sempre fazia, ao demonstrar interesse por alguém.

- Não sei, ainda não falei com ele... Ai meu deus, ele está olhando pra cá!

O aluno novo olhou na direção de Tânia, e seus olhos pousaram em Fernanda. A mediu dos pés a cabeça e Fernanda o observou quando ele arrumou a própria postura e encheu seu peito, abrindo espaço entre as calouras e indo em direção à ela.

- Muito prazer! – disse ele, se apresentando às duas – sou Daniel Valência, acabo de entrar para o curso de publicidade!

- Daniel Valência? – perguntou Fernanda – Da família Valência? Aqueles que tem várias joalherias?

- Sim, meu pai é o dono – ele confirmou, sorrindo.

- Muito prazer, Daniel. Eu sou a Tânia, é essa é a F...

- Rubi – Fernanda a interrompeu – Eu me chamo Rubi.

- Rubi? – ele sorriu – nome de joia preciosa. Quem sabe qualquer dia não te levo para conhecer a outros rubis mais de perto? Não prometo que serão tão belos quanto você, mas posso te presentear com um!

- Aceito – Fernanda sorriu.

- Bom, vou nessa, minha aula já vai começar. Prazer em te conhecer, Rubi!

Ele se afastou enquanto as duas o observavam. Tania de repente, encarou a Fernanda e a contestou:

- Que mentirosa, Fernanda. Por que você disse a ele que se chamava Rubi?

- Porque a partir de hoje, quero que me chamem assim: Rubi!



Fernanda, apesar de ter uma origem humilde, não gostava nada de ter que pisar na vizinhança onde nasceu. A casa que antes, havia pertencido a sua avó e posteriormente a sua mãe, agora estava mais vazia e acabada do que nunca, não fosse por alguns ratos e por uma senhora manca e amargurada, sem metade de uma perna do joelho para baixo, que raramente era vista por alguém da vizinhança. Havia boatos de que a casa era mal-assombrada, por isso, ninguém se aproximava dela. Ninguém exceto pela menina atraente dos cabelos loiros e cacheados, que toda semana, se comprometia a levar sacolas e mais sacolas de compras.

- Tia, cheguei! – ela abria caminho entre os escombros com sua bota de salto fino. O cheiro de mofo lhe atingiu as narinas e inevitavelmente, sua expressão mudou para nojo.

- Estou aqui atrás – uma voz ranzinza lhe respondeu. Vinha de uma mesa velha em um canto mal iluminado.

- Quando é que você vai sair desse buraco e aceitar morar comigo, hein tia? – perguntou a menina loira dos cabelos cacheados.

- Fernanda, as coisas não devem ser feitas com pressa. Você sabe que não posso ser vista com você, e agora, mais do que nunca. Nosso plano vai finalmente entrar em ação...

- Como assim? – perguntou Fernanda, curiosa.

- Alessandro Cardenas está de volta ao México!

- Tia, você tem certeza? – a menina estava mais entusiasmada do que nunca.

- Nunca tive tanta certeza. Ele está de volta, com sua família. Seu filho, Carlos, e sua esposa, a manca da Maribel...

- Voltaram para ficar de vez?

- Sim, e dessa vez, você não o pode deixar escapar.

A menina tirou algumas compras da sacola. Entregou uma garrafa de suco para a tia, e de outra sacola, tirou alguns remédios e curativos. Sentou-se ao lado da tia e começou a limpar os ferimentos de suas mãos e rosto.

As cicatrizes eram evidentes. Seu rosto estava todo cortado, assim como seus braços e pescoço. A menina os cuidava com muito amor. Passou então, uma pomada por cima:

- É um novo cicatrizante. Paguei muito caro, mas promete uma eficácia de noventa por cento. Tia, tenho certeza que dessa vez, a senhora vai conseguir se admirar novamente no espelho!

- Fernanda, eu não preciso me admirar no espelho. Eu só preciso que você siga à risca o plano que combinamos há anos. Agora preste bem atenção: Alessandro vai assumir a direção do hospital Buenaventura. Seu filho, Carlos, vai começar a cursar faculdade de medicina na mesma faculdade em que você estuda.

- Na mesma faculdade em que eu estudo? Isso é que é sorte!

- Não é sorte, Fernanda. Lembre-se: nunca conte com a sorte. Ela pode se virar contra você, quando você menos esperar. Se Alessandro está de volta como diretor, é porque nós conseguimos manipular as pessoas do hospital. E se o filho dele está na mesma faculdade que você, é porque esse sempre foi o meu plano.

- Sim, tia. Estou certa disso.

- Ótimo. Fernanda, você vai fazer com que Alessandro se apaixone por você novamente.

- Fazer com que se apaixone por mim?

- E não apenas ele. O filho dele também. Você tem que fazer com que o amor dos dois por você seja tão grande, que a vida da Maribel se transforme em um inferno. E que pai e filho se matem por você.

- Tia... O que a senhora está me pedindo é muito complicado...

- Acha que não consegue fazer o que pedi?

A menina parou por um momento e pensou. Arqueou uma das sobrancelhas e sorriu:

- Obrigada por tudo o que a senhora tem me ensinado em todos esses anos, tia. A senhora é a pessoa que mais amo no mundo, minha mentora, minha inspiração. E se tem uma coisa que aprendi com a senhora, é a sempre conseguir tudo o que quero e que a senhora me propõe. Considere a família Cárdenas como destruída.

Rubi - O RetornoWhere stories live. Discover now