Ciúmes Irracional

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Como todos os dias em que chegava à faculdade, Fernanda chamava a atenção de todos por onde passava. No intervalo, sentou-se ao lado da amiga Tânia, quando um conhecido se aproximou:

- Boa noite Rubi, lembra de mim?

- Daniel Valência, certo? – respondeu.

- Exatamente. Aliás, eu adorei o novo visual. Seu cabelo está lindo. Não só o cabelo, bom, você entendeu...

Ela sorriu. Adorava constranger aos garotos mais novos.

- Eu estava pensando, será que gostaria de almoçar comigo qualquer dia?

- Que tal amanhã? – ela perguntou, entusiasmada.

- Amanhã? Claro! Adoraria! Onde...

- Pode me buscar no trabalho – interrompeu ela – Trabalho no hospital Buenaventura.

- Fechado!

- E espero que me traga algum presente! – disse ela, enquanto voltava pra aula.

- Pode deixar!




O Dr. Cárdenas estava muito atarefado em seu consultório. Pegou o telefone e discou o ramal da recepção:

- Fernanda, bom dia! Preciso que me traga a agenda com a relação dos médicos de plantão dessa semana e da próxima, por favor.

- Claro, é pra já!

Ele mal tirou os olhos de seu computador quando Fernanda entrou em seu consultório. Com sorte, conseguiria chegar no horário hoje em casa.

- Obrigado Fernanda, bom d...

Seus olhos se encontraram com os dela e ele a admirou da cabeça aos pés... Agora, mais do que nunca, se parecia com Rubi. Trajava um vestido vermelho até o joelho, uma jaqueta jeans e sapatos vermelhos de salto médio. Seu cabelo estava escuro e liso, como da primeira vez em que vira Rubi em sua vida. Sentiu seu coração acelerar e um calor entre as pernas. Ficou sem reação.

- Dr. Cárdenas? Está tudo bem? – ela perguntou, fingindo preocupação.

Ele continuou a admirá-la por mais alguns segundos, até que se deu conta de que não agia normalmente.

- Sim, está tudo bem. Me desculpe, estou muito ocupado hoje... Fernanda, você fez algo com o seu cabelo?

- Sim, resolvi mudar de visual. Achei que contrastou melhor com a minha pele. Você gostou?

Ele demorou alguns segundos para responder:

- Preferia como antes – e voltou a trabalhar.

Fernanda saiu furiosa do consultório se perguntando o que havia feito de errado. Ou melhor, o que sua tia havia feito de tão errado para que ele a desprezasse tanto assim.

"Não é culpa sua, siga o plano" – ela pensava.


Pouco antes de acabar o expediente, Fernanda arrumava suas coisas para ir embora. O Dr. Cárdenas mal conseguira a olhar nos olhos o dia todo e o clima estava muito estranho entre ambos.

Ele acabara de sair de seu consultório, quando avistou um menino, com aproximadamente a idade de seu filho, presenteando a Fernanda com um colar:

- Quer que eu o coloque em você? – ele perguntou.

- Eu quero! – ela estava animadíssima.

- Um rubi para uma Rubi! – ele disse – Você está linda! – e lhe deu um beijo nos lábios.

O Dr. Cárdenas, que até então apenas observava a cena, vociferou:

- Posso saber o que está acontecendo aqui?

Fernanda e Daniel se assustaram.

- Com licença senhor, eu apenas...

- Você apenas o que, moleque? Não sabe que aqui é um local de trabalho? Some daqui! – Daniel se pôs a correr em direção à saída.

- E você, Fernanda? – ele gritava – Supõe-se que na sua primeira semana de trabalho, deveria dar o exemplo ao seu chefe, não é mesmo?

- Do que é que você está falando? – gritou Fernanda – Eu não fiz nada de errado, ele apenas veio me buscar para almoçar!

- Buscar para almoçar? Por favor, Fernanda! Você por acaso sabe como funciona a mente de meninos de vinte anos? Eles só pensam em uma coisa, e não medem esforços para conseguir!

- É aí que você se engana. Acha que não sei como funciona a mente de garotos da minha idade? E além do mais, porque é que você está achando ruim? Eu de verdade não estou entendendo!

Ele ficou em silêncio por alguns segundos e abaixou o tom de voz, mudando seu discurso:

- Fernanda, não me leve a mal. Você é como se fosse uma filha pra mim, e eu não quero que ninguém tire sua inocência. Me entristece ver gente se aproveitando de você.

- Tudo bem, eu entendo. Mas como disse, eu sei diferenciar as coisas. Não sou a mesma menina inocente de vinte anos atrás, Alessandro. Eu mudei, eu cresci. Conheço mais coisas e também já experimentei muita coisa – ela disse, projetando levemente seus seios em direção a ele. Ele percebeu e mudou de assunto:

- Eu ouvi mal ou ele a chamou de Rubi?

- Você não ouviu mal. Ele me chamou assim.

- Por quê? – ele parecia mais desapontado do que curioso.

- Nada demais. O pai dele tem uma joalheria, ele sabe que eu gosto muito de rubis, e por isso, me chamou de Rubi.

- Fernanda, você não...

- Alessandro! – ela o interrompeu – Eu já sei que não preciso agir igual a minha tia! E não estou tentando agir assim! Estou cansada de ouvir todo mundo me comparando com ela, eu mal me lembro do rosto dela, apesar da nossa semelhança! Será que pelo menos uma vez na vida, as pessoas podem me deixar tomar as minhas próprias decisões, sem ficarem me julgando e dizendo que vou acabar como a minha tia?

Ele se calou e a admirou. Seu olhar era de compaixão. Alessandro a abraçou e aliviado, lhe disse:

- Você puxou a ela em sua beleza extrema, mas fico muito feliz que sua personalidade seja o oposto da que era a dela.

"Continue acreditando nisso" – ela pensou.




- Ele ficou com ciúmes? – perguntou Loreto, animado.

- Caidinho de ciúmes! E tem mais, Loreto... Acho que ele finalmente parou de me ver como uma garotinha, e passou a me ver como uma mulher!

- Não sabe o quanto me alegro de saber disso, primor! E agora, você já sabe qual o próximo passo, não sabe?

- Qual?

- Uma desilusão amorosa! Você precisa se abrir com ele sobre uma desilusão para que ele te console!

- Você acha que vai funcionar?

- Eu tenho certeza que vai! Ele não vai resistir quando você se aconchegar em seus braços e implorar chorando, por alguém que te ame de verdade...

Ela riu e arqueou uma das sobrancelhas.

- Fernanda... Tão bela quando dissimulada...

Rubi - O RetornoWhere stories live. Discover now