Capítulo 32. Humanos

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Terceiro círculo do Império
A mansão

Quando eu estava pronta para a missão, ouvi batidas na minha porta e falei que quem estava do outro lado podia entrar: Kadi; porque eu duvidava que outra criatura fosse pedir permissão para mim. Observei-o caminhar lentamente na minha direção, tão elegante quanto uma taça de champagne.

Ele estava vestindo um terno negro sem gravata com detalhes prateados bordados nos ombros que contrastavam com o dourado no meu vestido. Éramos como manhã e noite, se encarando no crepúsculo.

– Você está... Apresentável. – Ele murmurou, provavelmente ainda frustrado comigo.

Exibi o tecido da saia, com todos aqueles olhos.

– E o que você acha que eu estou pensando de você?

Ele ergueu uma sobrancelha e o canto dos lábios, cruelmente charmoso.

– Não é você que tem que dizer?

– Estou mais curiosa sobre o que você pensa que eu penso do que o que eu realmente penso. – Me inclinei para ele, balançando os olhos perolados na saia. – Seja sincero.

Ele passou a mão pelos cabelos e, depois de hesitar, ele me estudou.

– Acho que você está pensando que... – Kadi abriu um sorrisinho galanteador e então as palavras lhe escaparam: – Eu sou a pessoa mais atraente que você já viu em toda a sua vida. Cheguei perto?

Corei; porque aquilo era o que ele estava pensando de mim, e os olhos no vestido refletiram para que ele achasse que fossem os meus pensamentos. Mas talvez minha opinião não estivesse tão longe daquilo.

– Bom palpite... Mas errado. – Me aproximei para que meus dedos ajustassem sua lapela. – Porque eu encontrei a pessoa mais atraente que já vi no meu próprio reflexo.

Ele riu. E então me observou por um instante, até que a pergunta se formou na sua mente e ele se deixou dizê-la em voz alta:

– Está preparada?

Ergui meus olhos para os seus e, fácil assim, eu me senti tão translúcida. Não havia nada que eu estivesse pensando ou sentindo que ele não pudesse perceber... Tudo exposto na superfície mais do que se eu estivesse nua; e isso me assustava tanto quanto aquelas feras que conseguiam sentir o cheiro do meu medo sempre que eu transpirava. Humanos eram perigosos também... Porque éramos treinados desde o primeiro abrir de olhos a ler as emoções naqueles que nos observam... A única de nossas comunicações que não consegue mentir.

– Não tente me fazer mudar de ideia. – Murmurei.

– Eu já aprendi com minhas derrotas, Doxy... Não se convence o mar a desistir de formar ondas.

Inclinei a cabeça.

– Mas e se essas ondas forem tsunami?

– Se estiver mergulhado fundo o suficiente... – Ele se aproximou, os olhos afundando em mim na busca pelas cidades perdidas que eu tinha inundado dentro de mim. – Não se percebem as ondas na superfície...

– Mas elas continuam lá... E eu não quero ser um tsunami...

Ele ergueu a mão para o meu rosto e o tocou suavemente, acalmando a turbulência abaixo.

– Você é o mar. E as ondas são só a resposta para os terremotos... Mas o mar nunca sucumbe às próprias tempestades.

E eu quis acreditar naquilo... Mas na iátrica eu tinha aprendido que nem nunca, nem sempre.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsWhere stories live. Discover now