Capítulo 36. Pressentimento

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Segundo círculo do Império
Distrito de Veneno

Minha mente estava mais turva do que o normal durante aqueles últimos noxdiems... Como se o universo estivesse tentando revelar algo para mim que eu não conseguia traduzir, ainda que meus pensamentos entrassem em sintonia com a sua voz quanto mais eu escorregava para o escuro.

Assim, quando um dos soldados da minha guarda pessoal irrompeu para dentro do salão, eu demorei mais do que devia para perceber a sua chegada.

– Senhor, recolhemos os corpos da nave rebelde abatida. – Ele disse, me arrancando do universo.

– E?

– Um dos líderes da rebelião está entre eles...

Aquilo despertou meu interesse.

Dispensei o soldado com um movimento e o ouvi fechar a porta às minhas costas, deixando-me sozinho na vastidão do salão. Caminhei até a varanda e observei a paisagem abaixo, onde a cidade central do meu Distrito de Veneno se estendia até o encontro do horizonte com o céu, gloriosa em suas construções ônix ameaçando rasgar as estrelas. Meu Império disfarçado de Distrito, apenas esperando o momento certo de crescer... Um momento que poderia ter chegado, na forma de uma nave rebelde abatida.

Desci as escadas para o pátio à frente do palácio, onde os soldados enfileiravam os corpos dos rebeldes pelo piso. Eram mais do que eu tinha imaginado... Talvez nós tivéssemos conseguido interromper algo realmente importante.

Caminhei pela fila até que o brilho do broche de um uniforme alcançou meus olhos, o tecido tingido de vermelho em uma patética tentativa de ressignificar as roupas do exército do Distrito de Sangue, assim como aquele mundo inteiro tinha sido. Ou talvez todo aquele vermelho fosse seu, por causa da sua própria derrota.

Observei aquele vorrampe por um momento, cheio de broches condecorando suas vestes para simular algum poder que o Império nunca o teria dado... Korrok, líder dos rebeldes. E, se ele já estava morto, eu duvidava que aquele movimento patético duraria muito mais.

– Guardem o cérebro desse aqui. – Apontei para ele com a ponta do meu ferrão. – Quero ler as suas memórias.

Meus soldados rapidamente se prontificaram de isolar a cabeça daquela criatura e me dar acesso às ruínas da sua mente, onde encontrei sentido para os mistérios naqueles pensamentos que passei a ter nos últimos noxdiems. Nada podia estar mais certo. Aquela era a verdade que o universo tentara me revelar por todo aquele tempo, depois de eu ter sido o escolhido para receber a sua glória e espalhá-la por toda Ítopis – por que quem mais o universo escolheria?

No mesmo noxdiem eu voei para o Distrito de Proteção para revelar a minha descoberta.

– Como sabe que aquele corpo era mesmo o de Korrok, Telson? – Bleine me indagou, profundamente intrigada. – Todos os vorrampes se parecem.

– Ele tinha insígnias do comandante da revolução. – Ela entortou o pescoço, não convencida. Tudo aquilo poderia ter sido fabricado para nos enganar, mas eu tinha certeza de que o que eu vira era a confirmação do que o universo quisera me avisar. Ainda assim, eu não podia contar para Bleine sobre as minhas crenças, depois do banimento das religiões no Império. – E eu vi as memórias dele.

Bleine flutuou na minha direção.

Ter o Distrito de Proteção como aliado era exatamente o que o meu precisava para a sua expansão, assim como há tanto tinha sido desejado por mim. O universo tinha tardado em me entregar as suas bençãos, mas ele enfim compensava a sua demora.

– Planos de guerra? – Ela indagou, ao que eu lentamente confirmei.

– Eles vão atacar o seu Distrito.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsWhere stories live. Discover now