Capítulo 33. Mãos

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Terceiro círculo do Império
Venerna

Quando voltamos para Venerna, os líderes da revolução já sabiam o que eu tinha feito, por causa do olho espião de Kadi. E, pelo corredor de feras que nos recebeu desde as portas da cidade subterrânea até seu centro, percebi que eles não tinham gostado muito do que eu fizera.

- Tem certeza de que quer enfrentá-los? - Kadi sussurrou ao meu ouvido e eu confirmei com a cabeça, firme em cada passada que dava.

- É o preço para as respostas que procuro.

As criaturas ordenaram que eu me ajoelhasse no centro do círculo e eu obedeci antes que partissem a fragilidade do meu pescoço. Me encolhi no chão de pedra e esguiamente levantei os olhos por trás dos fios dos meus cabelos, como se só encarar as torres vivas que me cercavam já pudesse me matar. Procurei por alguma migalha de piedade naqueles seres, mas, se ela existisse naquele Império de feras, eu não estaria tão longe de casa.

Aquelas feras me odiavam porque eu era tão selvagem quanto elas, quando achavam que eram as únicas que podiam ser monstros. Mas logo elas poderiam celebrar a ruína que as estrelas há muito tinham decidido, porque, em um universo como esse, elas não podiam planejar algo diferente para mim.

- DONECEA GAXY! - Um rugido primordial ecoou pelas paredes de rocha e estremeceu os meus ossos. Korrok... Pelo visto eu não era mais sapiens. Eu era estúpida. - Como você deixou isso acontecer, Phaga?!

Kadi deu de ombros, assustadoramente confiante.

- O teste era dela, não meu.

Achei que Korrok fosse explodir quando todo o vermelho de seu corpo subiu à cabeça.

O vorrampe se voltou para mim e rosnou, suas palavras me atingindo o rosto como os ventos de uma bomba:

- Por que você achou que jogar os aprimoramentos dentro de um sol era uma boa ideia?!

- Você nunca disse que os queria... - Murmurei. - Só a chave.

- E onde ela está, por acaso?!

- Ela não tem mais valor, se não guarda nada.

Korrok poderia ter me destroçado só com o olhar que me enviou. E então, para as feras no círculo ao meu redor, ele rugiu:

- SE LIVREM DELA!

Dois seres cobertos de carapaças de pedra que se pareciam com rochas vivas desprendidas das paredes avançaram a toda velocidade na minha direção, um de cada lado meu. Eles estremeciam o chão a cada passada e eu apenas conseguia ver meu corpo sendo esmagado por eles. Não importava que o metriona precisasse de mim, porque aqueles seres me envolveriam no abraço rochoso de suas garras e, se tivessem a benevolência de não me apertar até sufocar, me expulsariam de Venerna para nunca mais voltar à rebelião.

Meu rosto se ergueu para as expressões que me rodeavam, cheias não de ódio ou de sede de sangue, para a minha surpresa, mas de... Expectativa. Consegui ver Kadi cerrar os punhos, em uma tentativa de conter as garras que queriam despontar pelas barreiras da pele, e, de longe, seus olhos gritaram um pedido para mim: que eu lutasse; que eu vencesse; que eu, de alguma forma, provasse que merecia estar ali...

Porque aquilo ainda era parte do teste.

Fechei os olhos, sem querer ver a morte se aproximar caso eu falhasse, e estiquei as mãos aos lados do corpo com as palmas apontadas para os seres de rocha. Senti um ardor percorrer meus braços e migrar sob a pele, uma força incontrolável que não consegui impedir de explodir das minhas palmas em uma correnteza que eu não quis ver. O som de gotas caindo ao chão tomou meus ouvidos e o terremoto de montanhas desabando ao meu redor balançou o universo abaixo dos meus pés, como se a caverna inteira de Venerna estivesse rosnando para mim.

Endossimbiose | Versão Em PortuguêsWhere stories live. Discover now