Capítulo 55. Necrotério

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Núcleo da Galáxia

Rumamos na Hasta a toda velocidade para o núcleo da galáxia, perfurando o vazio do espaço como o disparo de um projétil atrás de Bleine.

Encarei as estrelas do outro lado do vidro, encolhida naquela cama em que um dia não dormi só, enquanto Kadi se escondia na outra área da nave.

– Você deveria falar com ele. – Korrok sussurrou para mim, às minhas costas. – Quando tudo estiver acabado, ele vai embora.

– Porque eu matei o metriona?

– Porque ele sempre ia, sapiens. Mesmo depois de todas as vezes em que tentei fazê-lo mudar de ideia e falhei.

Kadi não ia querer me machucar com a dor de dizer adeus, e não esperaria pela manhã seguinte para me dar a chance de implorar que ficasse. Senti meu peito apertar, agora que o que eu achava que nunca aconteceria, por mais que eu tivesse sido tantas vezes avisada, estava me alcançando.

Lentamente eu caminhei para a outra parte da nave, meus passos metálicos contra o piso anunciado a minha chegada. Kadi me enviou um olhar por sobre o ombro, curvado sobre o painel da nave como se tivesse o peso do Império inteiro sobre os ombros.

– Quem diria que terminaríamos vivos... – Sussurrei.

– Ainda está muito cedo para dizer. – Ele não estava errado.

– Eu... – Engoli em seco, tentando criar coragem para continuar: – Eu queria me desculpar...

– Está tudo bem. – Ele se virou para mim. – Você não precisa...

– Não. – Eu o interrompi. – Preciso contá-lo que me arrependo; de ter mentido e escondido a verdade sobre as doses; de ter agido como se os meus objetivos fossem mais importantes; de não ter aceitado o quanto ir embora era importante para você, mesmo depois de ter me dito tantas vezes... Me arrependo de todo e cada erro que cometi na tentativa de não o perder... – cautelosamente me aproximei. – Mas não o peço que me perdoe, porque não seria justo.

– Doxy... – Ele diminuiu a distância entre nós, se equilibrado sobre aquela corda frágil que nos ligava. – Eu já sabia que a cura não era real... – Ele... Sabia? – Eu sabia que o fevino não ia me matar de dentro para fora, mas continuei indo para o núcleo... Porque, pela primeira vez na vida, eu tinha um proposito além de buscar uma ilusão... – Ele engoliu em seco, seu pomo de adão subindo e descendo no pescoço. – Eu finalmente tinha uma razão para ficar.

Então ele não estava indo porque eu o tinha chantageado, mas porque ele... Queria? A mudança, o propósito, a aventura?

– Isso não justifica os meus erros...

– Eu sei... – E, nos seus olhos, vi sua capacidade de me perdoar, porque tantas vezes perdão fora tudo que ele quisera. – Mas eu não deveria tê-la pedido que poupasse o assassino da sua mãe... E não deveria tê-la prometido um destino que eu não estava pronto para viver. – Desde que o conheci, ele sempre estivera de luto... Não só pelo seu pai ou família, mas pela vida que perdeu; pelos anos que deveriam ter sido os seus melhores e piores, mas que lhe foram tomados. Ele sempre estivera de luto, pela única chance que cada mortal recebe nesse universo; e porque a sua tinha sido estragada. Mas nossa... Ele fazia me abandonar parecer tão difícil; e me amar tão fácil. Kadi sacrificaria tudo que ganhou para ter de volta o que perdeu, para cuidar daqueles que precisavam dele, porque nada aqui fora capaz de curar as suas dores. – Depois de termos sido tão injustos um com o outro, nos resta apenas perdão, Doxy... Ainda que nada disso mude o meu destino.

– Sei que não muda... Só não conseguiria continuar com o peso de nunca dizer essas palavras... Principalmente agora que estamos indo para a última batalha.

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