Bônus

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| Alessa |

Duas semanas se passaram, e nessas duas semanas ando me sentindo mais estranha, do que já me senti em toda a minha vida.

Primeiro, por estar crescendo um ser dentro de mim, que após a insistência da Johanna, descobri que já estou prestes a completar um mês de gestação.

Segundo, que não tenho mais a família que achava ter…

Desde que a Johanna apareceu, a minha ex mãe morta, venho percebendo que realmente estou sobrando em toda a equação. Uma, porque eu não me sinto mais a vontade de me juntar a nenhum deles, para uma conversa simples que seja; e outra, que vejo pelas ações de cada um deles a pouca importância que dão para mim... Há momentos que me sinto invisível e toda vez que vejo o Mark com a Lisa, e a criança que eles adotaram para si, eu não sinto qualquer empatia. Na verdade eu sinto inveja deles, sentimento esse que vem crescendo mais, a cada vez que vejo os três juntos e sendo este o motivo para eu passar mais tempo fora de casa do que dentro, pois vê-los reunidos como uma família é como se eu levasse um soco no rosto, com luva de aço. Onde meu cérebro só consegue captar que o meu irmão dar mais valor a duas pessoas que não são do seu sangue, do que a mim. Que teve uma bola de neve escura jogada sobre a cabeça e se encontra soterrada até o pescoço.

Sei que se eu procurasse a Vic, poderia encontrar colo, carinho e compreensão; no entanto, meu consciente não deixa. Ele me priva em todas as minhas tentativas. Pois estou presa na ideia de que foi por ela (de acordo com Johanna) que a minha desordem familiar começou, mesmo antes de eu existir... A verdade é que a minha mente estar como se fosse uma balança, medindo todas as coisas e pendendo para qual lado devo abraçar como verdade. E nessa altura do campeonato um dos lados está ganhando, que por estar me doando a atenção no momento mais crítico da minha vida e ser da mãe que me gerou em seu ventre, com o agravante de não ter se mostrado uma mentirosa até o momento, o lado de Johanna estar em grande vantagem. Mas por quê estou me sentindo tão injusta com a Vitória?

Será que tenho medo de me agarrar a ela, em vez da Johanna, e a mesma usar sua profissão de psicóloga para me manipular; me submeter apenas ao seu lado? Não sei de resposta alguma. Só sei apenas que estar mais fácil pôr meus últimos resquícios de força de vontade de viver no algo novo, desconhecido, que é a Johanna, do que em alguém que achava que conhecia bem e hoje tenho a certeza que mentiu para mim, durante anos.

Encaro-me no espelho, prendendo o cabelo em um rabo de cavalo, encerrando toda a minha monotonia. Ignoro qualquer ato de arrumação, não tenho mais ânimo para isso, nem mesmo de cobrir as profundas olheiras que demarcam meus intensos e tristes olhos verdes, que de claros, andam mais escuros que o normal.

Saio do quarto e na surdina passo em frente ao quarto do Mark, que pela porta estar encostada, ouço risos e mais risos do que sei vir de três pessoas no ambiente.

Tento ignorar a vontade de ver com meus próprios olhos a felicidade que apenas os três sentem, mas sou masoquista demais, só isso pode justificar o meu ímpeto de espiar pela porta entreaberta e vê-los na maior união.

O olhar que o Mark dirige para as duas é o que me dói mais. Sendo essa a comprovação de que para a sua felicidade, a redoma tem que estar completa somente com a pequena Ivy e a Lisa. Não há chances para mim, nesse meio! Sinto isso e comprovo quando a facada em palavras é projetada diretamente em meu peito:

"Vocês duas são a minha vida. A razão que nunca pensei que chamaria de felicidade."

Mark declara toda a minha inveja. Declara o que nunca ouvi dele, para mim. Fazendo-me sentir a morta da família. Uma versão feminina dos fantasmas de Scrooge, só que sem um desfecho que me apazigue de todo o tormento.

Marcas Do Passado ⇝ Livro 1《Concluída》Where stories live. Discover now