XXI - Um segundo exército

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Han solo inclinou-se, tinha as mãos pousadas sobre os joelhos.

- O que queres dizer... com clones?

Bekbaal aumentou a careta, o seu rosto contorceu-se com o desagrado que lhe queimou o sangue.

- Estão a fabricar clones aqui? – insistiu o corelliano.

- Um passatempo de reis que remonta aos tempos da Velha República.

O velho encarou Luke. Admitia apenas falar com ele naquelas questões sensíveis. Tinha ajudado os outros a salvar o cavaleiro Jedi, mas apenas para que pudessem ter aquela conversa. Não queria assistência, não admitia interferências. Considerava os amigos do Jedi inferiores, néscios, insignificantes. Dissera-lhe isso como aviso prévio àquele encontro, o melindre era óbvio, mas Luke ignorou-o. Queria que prosseguissem as confissões e as revelações. E já tinha afirmado que os amigos iriam ouvir tudo o que se destinava aos seus ouvidos somente.

- Continua – incentivou, fez um gesto de mão.

O velho empertigou-se. Engoliu saliva, a glote moveu-se lentamente.

- Os maiores mestres de clonagem são originários de Kamino, um planeta aquático do Labirinto de Maze, uma galáxia anã que se situa a sul desta galáxia. É difícil lá chegar e por isso o planeta manteve-se invisível e desconhecido. Os kaminoanos usaram o seu isolamento para se dedicarem a práticas experimentais com a genética. Desenvolveram técnicas de clonagem requintadas e com elevadas taxas de sucesso. Foi em Kamino que se criou o exército usado na Guerra dos Clones, o episódio tristemente célebre que conduziu à queda da decadente Velha República.

- Lutaste na Guerra dos Clones? – inquiriu Leia.

- Como todos os Jedi desse tempo, senadora.

- Hkion apoiava os esforços de Kamino na produção dos clones? – perguntou Luke.

- Hkion entra em contacto com essa tecnologia sensivelmente na mesma altura da produção em massa de soldados clonados para a República. Há um embaixador enviado pelo rei que faz uma visita inesperada a Kamino. Houve uma mensagem intercetada, não sei explicar os detalhes que conspiraram para unir a ambição de um soberano de Hkion com o conhecimento científico excecional de Kamino... O certo é que uma aliança estratégica se formou em segredo, longe da avaliação da Velha República, que, convenhamos, não tinha capacidade para verificar o que se estava a passar e nem tinha inclinação para verificar o que quer que fosse com uma guerra a desenvolver-se. Então, os clones foram produzidos para Hkion... Sem que ninguém ficasse a saber do contrato.

- Os clones de Hkion... serviram para a guerra? – perguntou Leia séria.

- Não. Serviram para o rei de Hkion, senadora. – O velho fechou os olhos por um instante, como se estivesse a recordar-se desse passado que ele eventualmente teria protagonizado. Mas não fora assim. Impossível. Ele era um mestre Jedi, os Jedi durante a Guerra dos Clones lutavam ao lado da Velha República, não estariam a par dos pactos pérfidos que se estabeleciam entre locais remotos galácticos. A voz veio-lhe rouca, a fingir-se emocionada: – As minas de ouro da lua rica eram exploradas por escravos. As criaturas que me seguem e que eu libertei são descendentes desses escravos. São os Otrok, um povo indígena da lua que os condenou a uma vida degradante de servidão. Foram, durante incontáveis eras, obrigados a escavar as galerias do subsolo para extrair o precioso minério que torna o sistema de Hkion próspero, independente, bárbaro e agressivo. Os reis locais nunca precisaram de interagir com outros povos da galáxia, ou fora dela, para se manterem nos seus tronos dourados! Tiveram o ouro. Claro que existe comércio, mas todos os processos são controlados fanaticamente pela família real e um punhado de nobres. As gerações vão-se renovando com o mesmo senso de corrupção, de malvadez, de impunidade. Ninguém quer destruir esse equilíbrio, esse estado que lhes garante a sobrevivência e o bem-estar, que lhes assegura a supremacia incontestada sobre os seus súbditos.

- Entretanto, apareceu um problema de sucessão, os dois príncipes, e o sistema perfeito desintegrou-se – observou Leia.

- Antes disso, muito antes disso, havia os clones – cortou o velho, ríspido e amargo. – O ouro de Hkion pagou a Kamino e um complexo kaminoano foi instalado na lua mineira. A produção dos clones seria local. Foi um negócio perfeito para quem não gosta de estrangeiros... E estou a falar de ambas as partes! Logo que puderam, os de Hkion despediram os de Kamino. Logo que puderam, os de Kamino entregaram o controlo do complexo aos de Hkion. A responsabilidade passou a ser integralmente do rei. Os clones são pertença de Hkion.

- Não se trata de um verdadeiro exército – contestou Han, cruzando os braços. – Os clones de Hkion não são soldados para combater numa guerra. São trabalhadores para as minas. Seres criados com o objetivo de serem esgotados até completarem o trabalho duro de extração do ouro.

- Os reis de Hkion são ambiciosos. Não abandonam o seu palácio, o seu planeta, não se entregam em demandas galáxia fora pois conhecem muito bem os perigos externos, as esmagadoras oportunidades de derrotas humilhantes. No entanto, conhecem o valor do ouro que usam para adquirir as suas riquezas imensas. No entanto, conhecem o valor da política. A lei do mais forte! Criaram trabalhadores e a seguir dedicaram-se a criar soldados.

- Para uma guerra? – admirou-se Luke.

- Sim, nobre Jedi. Para lutar uma guerra.

- Contra quem? – interveio Leia perturbada. – Antes da Nova República havia o Império Galáctico. Hkion queria declarar guerra a Palpatine?

- Não. Hkion apenas deseja poder.

- Então, contra quem? – insistiu Leia inclinando-se. – O poder pode-se conquistar através das armas. Os clones são perfeitos para proteger a população de um sistema. Ao usar-se clones em vez de guerreiros, existe uma vantagem derivada da pura contabilidade dos números. Podemos enviar clones sem qualquer remorso para a frente de uma batalha, ao passo que enviar os filhos das famílias pode levantar alguns problemas morais.

- Os reis de Hkion nunca tiveram moralidade – alertou o velho.

- Então, contra quem? – tornou Leia irritada.

Luke levantou um braço para evitar que a irmã se exaltasse.

O velho sorriu, trocista.

- Não tens estado a escutar-me, senadora?

- Não estou a compreender...

- O grande poder de Hkion... está na Força. Estamos num santuário da Força, um lugar de suma importância para o folclore dos Jedi, dos Sith, dos sacerdotes cinzentos, de todos os que lidam com esta energia mística que tudo liga no Universo. É um lugar muito mais importante que Moraband, que Jedha... Que Ahch-To, a ilha longínqua onde se ergue arruinado o primeiro Templo Jedi. Os reis sempre quiseram dominar a Força, os loucos, os ambiciosos! Esse é o poder que perseguem incansavelmente. Querem os clones para uma guerra particular.

Luke susteve a respiração. A sua pele formigava com as vagas destoantes que o envolviam. A Força era forte, mas havia mais qualquer coisa nos intervalos vazios que o confundia e lhe macerava a atenção.

- Contra quem? – perguntou Leia.

- Contra os fantasmas da névoa.

Lando resumiu todo numa frase:

- Estás a dizer-nos que o exército de clones está a ser criado para lutar contra os fantasmas da névoa?

- Sim, general.

A cara de Han Solo tinha uma expressão cómica de incredulidade.

- São homens? Os clones? Ou são cópias das criaturas que exploravam as minas? Os Otrok?

O velho levantou-se tão de repente que todos se puseram de pé com ele, acionados por aquele comando não verbalizado que exigia que o imitassem.

- São homens. – Baixou a cabeça e murmurou: – Agora sabem que o problema dos escravos na mina é, na realidade, um problema de clones que são uma arma que pode ser utilizada por um dos príncipes herdeiros. Agora sabem que são dois exércitos que a Nova República precisa de desmantelar. Agora sabem o que vos contei. Têm o anel, conseguirão encontrar-me... E regresso ao meu exílio.

Sem nunca levantar a fronte, o velho abandonou o abrigo.

Os Fantasmas da NévoaWhere stories live. Discover now