XXVIII - Flamejante

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Leia e Luke foram deixados numa ala do palácio relativamente cómoda, descontando o facto de tudo ter aquele aspeto gasto e desbotado comum às outras construções da capital, ao planeta que era rico em ouro, mas pobre em ostentação. Pelo menos não os levaram para a prisão e Leia considerou que essa tivesse sido a concessão ao seu caso, pelo facto de ela viajar como diplomata e de ter feito a exigência de respeitarem o seu estatuto de imunidade. A única contrariedade, até existirem mais, foi terem-nos separado de Artoo.

A ala era constituída por duas salas e três quartos, incluindo uma pequena saleta equipada com computadores e outros equipamentos que permitiriam linhas de comunicação com toda a galáxia, o que exacerbou a falta do pequeno astromec. Leia mordeu os lábios a olhar para o imenso painel com algumas luzes a piscar, indicando que estava em modo suspenso.

Luke ligou alguns interruptores, um monitor acendeu-se.

- Está operacional. Não devemos usá-lo para já, para não atrairmos atenções.

- Precisamos de Artoo. Não sabemos se estaremos sob escuta.

- É o mais provável. Acho estranho terem-nos deixado com a facilidade de nos comunicarmos com Chandrila.

- Um gesto de boa vontade, como sou uma senadora. Querem que envie uma mensagem a indicar que nos encontramos bem, embora tenham existido percalços. Contigo, primeiro. Comigo, agora.

- Queres enviar essa mensagem agora?

- Não.

Leia foi verificar os quartos. Austeros e práticos, eram escassamente mobilados e as camas não tinham cobertores. O ambiente era frio, pelo que se adivinhava uma noite desconfortável. Passou pela sala que tinha pouco mais do que sofás e cadeirões, uma mesa, um aparador, tudo vazio, móveis envelhecidos e descartados. As janelas estreitas, sem gelosias manuais ou automáticas, sem cortinas davam para um pátio com um jardim selvagem.

- Por quanto tempo? – murmurou ela.

Luke entrou na sala.

- Deixei um farol para a Falcon. Assim vão saber que estamos aqui.

- Arriscado se recebermos o relatório do Threepio sem estarmos mais seguros da nossa situação. Não quero que descubram os nossos segredos e que já sabemos dos clones.

- Não podemos pedir mais. Podíamos estar na mesma prisão onde fui envenenado. Falam em tribunais, num julgamento, mas podem decidir a nossa sentença sem uma audiência formal. São tiranos, Leia.

- Não me engano em relação a quem governa este estranho planeta, mas não irei abortar a missão por falta de condições. – Queixou-se: – Precisamos muito de ter o Artoo de volta!

Respirou pesadamente. Sentia-se vulnerável sem o blaster, sem o sabre de luz, mas Luke sussurrara-lhe que confiasse na Força. Era fácil para ele dizer isso, que era um mestre Jedi plenamente treinado, imbuído de todas as capacidades fantásticas desses magníficos cavaleiros estelares, mas ela gostava de coisas mais concretas, mais práticas. Era fria nos seus raciocínios e o poder dissuasor de uma boa arma – e agora parecia Han Solo a falar – ajudava a manter uma posição de autoridade e de respeito. Viu Luke pálido.

- O que foi?

- Uma perturbação na Força...

- Não estou a sentir nada. Apenas um formigueiro na nuca, mas pensava que fosse do cansaço.

- Estão a deslocar os Ysalamiri para mais perto. Querem criar uma bolha ao redor deste lugar para nos conter.

Leia espreitou por uma janela com minúcia, cobrindo todos os ângulos que era possível vislumbrar através do vidro duplo. Os jardins eram varridos por uma brisa persistente e suave que agitava as ramagens das árvores que ela reconhecia agora serem da espécie Olbio. Franziu a testa, consternada.

- Não perdem tempo.

- E vamos ter uma visita – acrescentou Luke num tom grave.

As portas da sala escancararam-se, deslizando para os lados. Leia girou sobre os calcanhares. Tinha um peso súbito no peito, como se o coração se tivesse transformado numa pedra densa e escura. Abanou a cabeça, confusa, para afastar a sensação de estar a... irritar-se. Seria uma manifestação insidiosa do Lado Sombrio e ela estranhou estar tão permeável.

Um homem vestido com uma túnica dourada apareceu, a caminhar devagar pelo aposento, arrastando a bainha comprida que se estendia atrás dos seus passos como um manto. Tinha as mãos atrás das costas e, pela postura majestosa, tratava-se de alguém importante na casa real de Hkion. Era calvo, cabeça afilada com ângulos abruptos como se cortantes, olhos vazios, uma pele doentia. Leia postou-se ao lado de Luke e esperou que o homem se apresentasse. O que ele fez com um indisfarçável fastio e sobranceria irritante.

- Sou Tir'etakion, o mordomo de Hkion e governador do sistema. Querias uma reunião comigo, princesa de Alderaan. Aqui me apresento perante ti. Nem todos obtêm a honra da minha presença.

E só ali estava, pensou Leia desdenhosa, porque ela era princesa. Não se dignara a receber um cavaleiro Jedi e nem receberia uma senadora. Odiaria a República. Era um autocrata, um déspota, uma criatura poderosa e inatingível cheia de vícios. Sentia-lhe o negrume, a ambição, a indiferença. Chegava a ser contaminante. Pigarreou subtilmente e disse, na sua voz mais régia e astuta:

- Os nossos sinceros agradecimentos por acederes a este encontro connosco, nobre Tir'etakion. Sou uma senadora da Nova República e fui despachada para Hkion após termos tido conhecimento que as tentativas isentas de mediação do vosso conflito interno por parte do cavaleiro Jedi, Luke Skywalker, tinham falhado. Pretendemos somente ajudar, sempre com a premissa de não existir qualquer interferência da nossa parte.

- Uma mediação é por definição, isenta de interferência.

- Perfeitamente, nobre Tir'etakion. A Nova República ficou preocupada com as notícias que provinham de Hkion e decidiu perceber o que se passava para tentarmos uma solução pacífica e prolífica para todas as partes envolvidas.

O mordomo semicerrou os olhos estreitos.

- Nós não utilizamos escravos nas nossas minas de ouro.

- A Nova República considerou a petição que apresentava a queixa relacionada com os eventuais escravos de Hkion, mas nunca iria tomar uma decisão definitiva sem as apropriadas audições.

- Esperávamos uma comissão, não... – Olhou depreciativamente para o Jedi, franziu a boca numa careta azeda. – Não um único elemento com uma visão parcial e embotada pela antiga religião dos fanáticos da Força.

- Não gostam dos Jedi.

- O que pretendes fazer, princesa de Alderaan? – cortou o mordomo.

Leia ensaiou um sorriso, suavizou a sua voz.

- Nobre Tir'etakion, agradeço a tua presença e a vontade de resolvermos a presente situação. Que inclui, obviamente, a minha detenção e a acusação que pende sobre o cavaleiro Jedi. Por isso, rogamos que aceitem a mediação da Nova República e o seu critério que pretende ser justo e satisfatório para todos os envolvidos, sem perda de privilégios. Registei que apreciariam uma comissão completa, composta por vários senadores, e apresentarei hoje mesmo esse pedido à Chanceler. – Dava a indicação de que conhecia a saleta das comunicações daquela ala. O mordomo não colocou qualquer objeção e ela continuou: – Entretanto, queiram devolver-nos o nosso androide e os nossos objetos pessoais. Concordamos em manter-nos sob a vossa... proteção especial. Seremos os vossos convidados até chegar a comissão senatorial.

O mordomo quedou-se em silêncio, a apreciar a proposta.

- Qual a vossa primeira exigência... sabendo que concordaram em manter-se sob a nossa custódia?

- Queremos audiências, em separado, com os dois príncipes que disputam o trono. Kar'kion e Gil'kion. Queremos ouvir o que eles têm a alegar para estarem a defender um conflito em vez de uma negociação pacífica para a transmissão de poder.

Se ficou surpreendido, o mordomo não o demonstrou. As suas vestes cor de ouro – ou provavelmente fabricadas com o famoso ouro de Hkion – flamejaram quando ele abandonou a sala nos mesmos passos vagarosos.

Não tinha deixado uma resposta à princesa de Alderaan.

Os Fantasmas da NévoaWhere stories live. Discover now