cinquenta e dois

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"você não encontrará paz fugindo da vida" - virginia woolf

Styles acordou um pouco depois com a vibração suave do banco e o barulho das rodas no asfalto. O assistente viu pelo retrovisor o chefe bocejar e esfregar os olhos.

- Bom dia, flor do dia! - tentou falar mais baixo

- Bom d... - parou abruptamente quando percebeu que ainda era noite e franziu a testa

O cérebro ainda estava se ambientando com o carro frio já que a última coisa que se lembrava era adormecer no ombro do de olhos azuis.

- Como eu... - a entonação era indagativa

- Louis me chamou pra te buscar - as mãos estavam firmes no volante - Coisa mais engraçada do mundo um cara daquele tamanho te carregando, de longe parecia uma criança carregando um adulto, hilário - deu uma gargalhada - Mas graças a deus pelo menos ele sabe que você não pode ficar fora a noite toda, te salvou da Ellie chamando a polícia de novo

- Bom, eu não sou tão pesado - cruzou os braços e quase fez um bico

Harry nem ligava mais para tudo aquilo. Ele poderia arruinar sua carreira e não pensaria duas vezes, se ao menos ele pudesse ficar ali, afundado no espaço entre o ombro e o pescoço de Tomlinson, por um número incontável de horas. 

Estava até levemente irritado pelo fato de ter caído no sono e não ter transado com o acompanhante como pretendia.

- Não é nem sobre peso, aquilo ali parecia estar desafiando as leis da física - ergueu as sobrancelhas e continuou rindo

É, eles entendiam muito sobre desafiar as leis da física.

- Que horas são? - passou a mão nos cachos

- Você não dormiu muito tempo, a gente tá quase chegando no hotel. Depois você dorme mais umas quatro horas e a gente vai pro set

- Eu tenho meeeesmo que ir? - encostou a cabeça na janela

Depois de alguns anos trabalhando para ele, eram raros os momentos que Niall não conseguia lê-lo. Esse não era um desses momentos.

- O filme tá quase acabando, vai! - tentou motivá-lo - Só mais alguns dias até você ser nominado pro Framboesa de Ouro - a risada do irlandês era única

- Finalmente, preciso de pelo menos um mês sem fazer nada

O "fazer nada" só se referia a uma pessoa: Louis Tomlinson. E ambos sabiam disso.

- E você vai continuar mesmo em Los Angeles? - estava curioso

- Preciso ficar - os dedos pairavam sob os lábios

- É que tem algumas coisas em Nova Iorque ainda, e como a Ellie tinha falado sobre vender a mansão... - acionou a seta do carro e fez uma curva

- Eu vou pelos dias que for necessário mas por hora eu vou ficar - interrompeu o assistente

- Harry... - o tom de voz denunciava que estava prestes a entrar em um assunto difícil

- O quê?

- Você não pode ajustar sua vida toda só pra ficar se esgueirando com esse cara...

- Ai meu deus, começou - passou as mãos no rosto, já frustrado

- Eu não tô falando pra parar de ver ele, eu só tô falando que você tá meio que largando tudo pra poder ficar o tempo todo com ele! - diminuiu a velocidade do carro - E isso me preocupa por que você tá agindo exatamente igual você agia todas as vezes que a gente precisou internar você! - aumentou a voz - Você realmente acha que isso é normal? Saudável? Por que eu não acho!

Harry Styles não se importava.

- Meu deus, eu não posso ter UMA COISA na vida mesmo, né? - até a linguagem corporal era defensiva

- Você tá se fazendo de burro de propósito! - bufou - Eu tô dizendo que se você realmente quer fazer isso, por que não, sei lá, chamar ele pra sair, fala com a Elle, com o Simon, faz o negócio certo! Igual uma pessoa normal, no caso, pra não ter que ficar escolhendo entre ter uma vida, uma carreira, amigos ou ficar com ele 24 horas por dia...

A fala de Horan pareceu uma proposta de casamento e isso fez as palmas das mãos de Styles suarem, permanecendo em silêncio.

- Mas você não vai fazer isso, né? - o assistente quebrou o silêncio, desapontado

- Não é assim... - abaixou a voz

Silêncio de novo enquanto Niall considerava se realmente falaria o que queria, mas decidiu que não. O irlandês tinha tido essa conversa com o cacheado tantas vezes antes que já estava cansado. 

Era frustrante ver o ciclo se repetir toda vez, mas infelizmente era assim que funcionava. A luta de um viciado contra um vício é diária. Constante. 

No entanto, ao contrário do que o senso comum dita, o oposto do vício não é sobriedade: é conexão

Ratos de laboratório que ficavam sozinhos em suas gaiolas e eram oferecidos água com variadas drogas e água normal, bebiam tão frequentemente a água adulterada que acabavam sofrendo overdoses em períodos curtos de tempo. Mesmo em períodos de desintoxicação, escolhiam depois àquela que era prejudicial. 

Porém, quando colocados em uma gaiola com vários brinquedos, atividades e, principalmente, outros ratos, eles nunca escolhiam os entorpecentes. Eles não precisavam mais preencher uma realidade entediante e dolorida com fantasias porque a realidade era finalmente melhor. 

Mas, assim como os pequenos roedores, mesmo com tudo à seu dispor, Harry não se conectava com outras pessoas. Não aquelas que o proporcionavam tanto prazer quanto as drogas. Não aquelas como Louis Tomlinson. 

Ele não queria se conectar. Não sabia como. Ainda passava pela vida anestesiado, vendo todas as possibilidades possíveis para obter o máximo de prazer. 

E a eterna anedonia e insatisfação com a vida tornavam isso necessário. A dor era real mas ainda usada como uma carta, uma justificativa para permanecer naquele ciclo.

Somente quando ele se permitisse conhecer verdadeiramente outra pessoa e, no processo, se conhecer também, é que ele poderia ser liberto da infinita desconexão. 

Quando ele não visse mais Louis como alguém que só estava ali para satisfazer todos os seus desejos. 

Mas ele não sabia como. Não queria. Não agora. Algo sobre a dor, sobre as drogas, sobre aquele lugar onde todos o serviam era confortável. 

Horan fez uma curva e avistou o hotel no final da avenida.

- E você também sempre diz iss... - o irlandês continuou

- Na boa, eu não vou ouvir opinião do que é saudável de você! Como se estar apaixonado pela Elle não fosse fodido também - gesticulou agressivamente

Apertou os freios, causando uma parada brusca em frente ao hotel.

- Eu não s... - apertou os olhos

- Como se ninguém reparasse o jeito que você age perto dela.. - balançou a cabeça - E ela NUNCA vai corresponder, só pra ficar claro - abriu a porta e saiu de supetão

- Espera eu estacionar, porra - olhou no retrovisor

- Não quero você aqui hoje, me busca depois - virou as costas e foi embora

Ok, ele estava se sentindo mal pelo jeito que falou com o amigo, mas não conseguiu evitar. Não queria que a bolha de felicidade fosse estourada. 

Não queria realidade. Queria fantasia.

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