Somente você

Oficina

O treino tinha me cansado muito, nós estávamos com falta de pessoas para dançar, principalmente garotas. Eu não entendia como elas entravam e saíam tão rápido do grupo de dança, nós não éramos tão ruins para todas desistirem naquela velocidade. O ensaio era em um estúdio de dança, com espelhos em todas as paredes, em duas delas era só metade, mas ainda dava para ver os passos. O lugar é limpo e arejado, as instalações físicas não se mostravam um problema real. A única explicação seria que nós, os dançarinos, fossemos o problema, entretanto não era um problema achar rapazes para dançar. Talvez o problema fosse com as garotas.

Sai do treino e instintivamente coloquei a mão dentro da mochila que eu levei e procurei minha garrafa de água e minha toalha de rosto. Não achei nenhum dos dois, o que era estranho já que eu sempre deixava tudo arrumado um dia antes. No meio da minha procura achei uma latinha e a retirei de lá, a sede falou mais alto, era um energético. Encarei a embalagem e depois da onde ela veio, aquela mochila não era minha. Saindo da minha zona de conforto percebi que eu tinha pego a mochila errada e de que esta que eu havia levado era da pessoa que me deixou em casa no dia anterior. Mudar a minha rotina impecável não me ajudava, principalmente por eu ser muito distraída, se algo mudava eu só percebia quando precisava deste algo.

A jaqueta, pensei ao lembrar que cedo estava frio e eu só peguei os objetos que estavam perto da minha porta e me encaminhei correndo para o estúdio. A jaqueta não estava mais onde eu havia deixado, não estava mais sobre a mochila preta. Tentei manter a calma e me levantei olhando ao redor, ignorei todos a minha volta tentando refazer meus passos. Refiz tudo, olhei em todos os lugares em ir tinha passado, mas eu definitivamente havia perdido a jaqueta da única pessoa que me estendeu a mão naquele show estranho do dia anterior. Sem muitas opções corri para aquela que poderia me ajudar, se ela não soubesse eu estaria perdida.

— Íris — chamei tentando parecer calma, mas isso não funcionou — eu vim com uma jaqueta de couro preto hoje e não a encontro mais, será que alguém pegou por engano? — questionei controlando melhor minha voz.

— Não que eu me lembre — comentou olhando para cima como se procurasse resposta — já falou com as meninas?

— Não está com ninguém — suspirei pesadamente — alguém de diferente entrou aqui hoje?

— Teve uma pessoa que estava saindo quando eu vi — falou distante tentando lembrar — eu não acredito — falou dando um leve tapa em sua testa em sinal de reprovação.

— Em que Íris — falei me debruçando sobre o balcão tentando tirar a informação de alguma forma.

— Eu pensei que a jaqueta fosse da pessoa que veio mais cedo hoje, combinava com seu estilo — murmurou abaixando a cabeça triste pela sua distração.

— Você se lembra de como era essa pessoa? — questionei aflita com essa informação.

— Maior que você — falou com o olhar baixo — cabelos negros, muito escuros, que contrastam perfeitamente com a pele pálida. Quando saiu pude ver de relance seu rosto fino com feições definidas, tinha um sorriso sínico e um olhar intenso... — falou com a mão nos olhos, como se tentasse lembrar do momento — Eu sinto tanto por isso, eu não devia supor as coisas, principalmente do tipo "os meninos daqui nunca usaria uma jaqueta assim, muito menos as garotas". Eu sou um fracas.

— Não precisa de tanto — falei firme e encarando seu rosto — olhe para mim e me diga se eu um dia compraria uma jaqueta daquela — completei sorrindo sabendo quem havia buscado a jaqueta — a pessoa que veio mais cedo só pegou o que era dela. A jaqueta era emprestada como essa mochila — apontei para o objeto ainda apoiado na parede — eu amo usar coisas mais alegres, menos pretas — comentei vendo a rir.