Fragmentos do passado final

70 13 10
                                    

Saí da casa dele correndo sem olhar para trás, desesperado, angustiado, magoado com tudo que se sucedeu minutos atrás. Um mundo de coisas vieram a minha cabeça, cenas intermináveis de situações que eu vivi com minha mãe e com o sr Kang, só de pensar que realmente eu posso ter suprimido todas essas lembranças e as enterrado no meu subconsciente me fazem surtar, e isso me faz ficar ainda mais desesperado. Me lembro dos nossos encontros, das coisas ditas pelo sr.Kang, coisas do início, quando tudo era bom, quando eu estava feliz, lembro de tudo que se sucedeu logo depois e me dou conta de que ele está certo, e eu odeio essa sensação.
Como eu pude deixar alguém me usar dessa forma? Por que desde cedo me permiti ser um brinquedo na mão das pessoas, por que o sr Kang escolheu a mim? Como ele entrou na minha cabeça assim? O despertar é muito doloroso, minha cabeça parece que vai explodir, meu coração parece estar sangrando, a dor é real, só quero me afastar pra poder entender tudo isso.
No momento em que saí de lá coloquei tudo a perder, ele nunca mais vai querer me ver, ele falou de forma dura, ríspida e altamente crítica. Ele odeia o que eu sou? Ele me acha um tolo? Ahhhhh, só quero sumir, preciso me afastar mais e mais, quero que essas cenas parem de passar na minha cabeça, só quero que tudo acabe, quero tanto deixar de existir, simplesmente sumir, seria mais fácil assim, ele não precisaria amar um lixo como eu, um ser tão mediocre, meu pai poderia começar novamente com a Bora, ser feliz, ter outro filho e dessa vez ter um que valha a pena. O tempo parece congelar, no trajeto ao desconhecido não consigo ver rostos, nada de move, apenas eu, sinto o ar batendo no meu rosto mas não ouço nada, não vejo nada além de borrões e luzes.
Quando voltei a mim, eu já estava em outro bairro, me pergunto por quanto tempo corri? Onde estou? Meu cansaço somado ao meu estresse me dão uma ânsia tão grande que eu começo a vomitar, acho que foi o estresse, talvez nojo de mim, desse lixo que me tornei por permitir que alguém me usasse, talvez seja o meu corpo dando sinais físicos desse meu esgotamento, minha cabeça está a mil, rodando sem parar, sinto falta de ar, meu coração está muito acelerado e eu simplesmente desmaio ali mesmo.
Inconscientemente minha mente me leva a um lugar que já estive antes, em um parque, me lembro bem por conta da árvore de ameixas, meu pai sempre pegava elas para mim, eram super doces, eu vinha sempre brincar alí, a praça está cheia de crianças mas eu estou brincando sozinho, olho em volta e a minha mãe está lá sentada conversando com um homem que não era o meu pai. O gramado é verde está bem alto, a praça é bem movimentada, somente mães, babás e crianças, algumas pessoas olham para o lugar em que a minha mãe está e parecem cochichar. Não consigo entender, mas sempre que uma criança se aproxima de mim alguém a retira imediatamente. Percebo que eu não estou feliz, dá pra sentir a tristeza por mim emanada, em contrapartida minha mãe está aos risos, o homem que está com ela a abraça e a beija em público, provavelmente por conta desse comportamento as mães não deixam os filhos brincarem comigo, mas quem deixaria o filho perto de uma criança que a mãe tem atitudes duvidosas e inapropriadas em plena luz do dia?
De repente ouço uma voz conhecida, olho para trás e vejo meu pai, sorrio para ele que se agacha e fala comigo, não consigo entender o que ele diz, somente vejo sua boca se mexer, ele se afasta de mim e vai em direção a minha mãe, as pessoas em volta olham assustadas, minha mãe tenta se explicar, o homem que está com ela intervém e meu pai briga com ele, dá um soco , o homem cai e a minha mãe se agacha para socorrer, ela tenta se justificar mas ele viu a traição, ele não fala nada, não grita, diferente dela, meu pai me toma em seus braços e me tira dali, sou levado para o carro dele, ele me põe sentado na cadeirinha no banco de trás, nisso minha mãe se aproxima do carro gritando, socando o carro, até que ele sai de lá a deixando para trás.
Sinto meu coração bater acelerado, tenho dificuldades até para respirar, ouço de longe uma voz e percebo alguém tentar me trazer de volta a consciência, ao retornar e despertar e o vejo, aos prantos, chamando por mim, me envolvendo em seus braços, como eu ofegante, seu semblante transmite uma dor e um desespero que poucas vezes presenciei em toda minha vida.

Arriscando Tudo Book 1Where stories live. Discover now