19. Lição

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Para Rennebennett e jully1807

Larguei o caderno em cima da cama ao ouvir o estilhaçar do vidro. Saí de meu quarto em um rompante.
O som parecia ter vindo do quarto de Bonnie.
Cruzei o corredor rápido como uma bala.
- Senior Kai?- ouvi, Sol me chamar do outro lado do corredor.
À julgar pelo pano de prato e o avental, ela estava fazendo o jantar e veio correndo da cozinha. Seus olhos escuros eram cheios de preocupação.
- Está tudo bem, Sol- disse sem olhar para ela por muito tempo. Estava mais preocupado em saber que diabo aquela baixinha teimosa estava fazendo naquele quarto.
Abri a porta e invadi o ambiente escuro. Ela não estava em nenhum lugar que eu pudesse ver. Meus olhos correram pelo quarto relanceando em cima de tudo, até que vi a porta entreaberta do banheiro.
A luz escorria pelo chão, como uma enorme mancha branca. Havia um cheiro acre - adocicado no ar, misturado à um perfume doce e sutil, que eu conhecia muito bem.
Antes mesmo de estar diante daquela porta eu já fazia idéia do que estava acontecendo. Mas ainda assim, eu fiquei surpreso com a criatividade daquela bruxa filha da mãe.
O espelho enorme que ficava sobre a pia de granito branco estava completamente estilhaçado, com cacos caídos por todos os lados. E havia sangue. Mais sangue do que eu lembrava de ter visto em toda a minha vida.
Meus olhos desceram, inevitavelmente, sobre ela.
Bonnie estava caída no piso frio, com os olhos abertos, mirando o nada. Sua garganta estava dilacerada com um corte profundo e o sangue jorrava livremente, encharcando todo o seu tórax e deixando a blusa branca de um vermelho vivo.
Por um segundo, aquilo me perturbou. Provocando marolas naquele mar de calma em que me encontrava. Ondas ameaçaram surgir, mas a às acalmei dentro de minha mente. Eu não tinha porque ficar incomodado com aquilo.
Apurei minha audição e apesar do estado, aparentemente, morto de Bonnie, seu coração ainda pulsava. Muito fracamente.
Ela estava definhando cada vez mais rápido.
Soltei o ar que nem notei que estava segurando.
- Merda- resmunguei, indo para mais perto dela com minha velocidade de vampiro.
Agachei ao seu lado e tentando ignorar o odor delicioso do sangue, ergui sua cabeça do piso encharcado de vermelho.
Mordi o pulso com muita força, sem sentir uma dor real e o sangue jorrou para fora da mordida. Estendi a mão sobre seu rosto, deixando que as gotas caíssem sobre seus lábios pálidos.
- Anda- resmunguei, apertando o punho para que mais sangue cobrisse sua boca- Anda, sua bruxa estúpida.
O coração dela reduziu as batidas à quase zero. Eu a estava perdendo.
- Acorda, Bonnie!
Olhei para o corte em seu pescoço e tive uma idéia. Deixei a mão pairando sobre ele e meu sangue cobriu a ferida, misturando-se ao dela.
- Vamos, Bonnie...
Dei tanto sangue quanto podia, porém ela ainda não reagia. Seu coração estava praticamente parado, pulsando em intervalos longos e com batidas fracas demais.
Eu não podia esperar que ela ressuscitasse da pós morte como uma vampira, pois meu feitiço impedia isso. Bonnie e Elena morreriam se tentassem contornar as regras. Por um segundo, me arrependi de ter feito aquele feitiço que tanto me limitava, até que...
O enorme corte na garganta de Bonnie começou a se fechar rapidamente, até que não sobrasse mais nenhum resquício dele. Seu coração começou a martelar mais rápido contra as costelas.
E finalmente, ela arfou agarrando-se aos meus braços, em desespero por mais ar. Seus olhos verdes vasculharam tudo à em volta de si. E quando focaram em mim, a bruxa começou a chorar descontroladamente.
- Me deixa morrer!- gritou para mim- Me deixa morrer, Kai!
Seus pequenos punhos cerrados acertavam socos débeis contra meu peito, mas não me importei. Eu estava furioso demais com sua atitude.
O mar se revolveu dentro de mim.
- Tem noção do que você fez?- cuspi para ela- Tem noção do que fez, Bonnie?!
Ela se desvencilhou dos meus braços e se jogou de qualquer jeito no chão, se encolhendo como uma criança. A garota estava em um estado lamentável. Pálida como um morto, coberta de sangue e apática.
- Eu não vou desistir- sussurrou.
Não parecia estar dizendo aquilo à ninguém em particular, apenas para si mesma.
- Você não vai fazer isso de novo- me abaixei, sussurrando em seu ouvido de forma fria e contida.
O mar estava extremamente agitado.
Eu queria dar uma surra nela por ter feito isso. Ao mesmo tempo em que todo aquele sangue e suas roupas justas e curtas, estavam provocando minha mente de uma forma descontrolada.
Eu estava cansado de esperar, cansado de adiar o que queria. Por isso, estava decidido nessa mesma noite a fazer o que meu corpo implorava à meses. Mas, esperava um ambiente menos destrutivo.
Estava esperando que ela dormisse, porque assim seria mais fácil dominá - la.
Na minha cabeça, a imagem de Bonnie deitada na cama, à minha mercê, totalmente minha, era perfeita.
E por uma questão de minutos, ela quase tirou isso de mim.
- Você não tem idéia do que a aguarda- rosnei em seu ouvido, completamente possesso de ódio.
E Levantei-me do piso coberto de sangue, deixando-a caída no chão.
- Soledad!- gritei.
A mulher apareceu prontamente na porta, aguardando ordens.
- Cuide dela- rosnei, passando pela governanta.
Não parei em nenhum dos cômodos, apenas marchei furiosamente enxergando tudo em vermelho. O mar estava tão agitado, que podia senti-lo transbordar em minha mente.
Uma enxurrada de dor passou subitamente por mim. Como uma adaga me perfurando. Meus olhos arderam e ficaram marejados.
Um ardor se precipitou em meu peito.
- Não!- rugi, mandando aquilo embora, deixando as ondas o cobrirem.
E tudo finalmente voltou a ser claro. Eu tinha meu objetivo.
Quando me vi, estava no terraço da cobertura.
As luzes da rua não chegavam até esse grande espaço decorado e luxuoso. O único brilho, vinha da piscina aquecida, em tons de azul e branco. O céu noturno escondia suas estrelas, deixando apenas a lua redonda e prateada.
Cadeiras estavam dispostas por todo o espaço, deixando o lugar mais convidativo. Mas, não prestei atenção nisso.
Com a velocidade sobrenatural, fui até o quarto de ferramentas da casa. Vasculhei pelo cômodo exageradamente organizado e não demorou muito para encontrar o que eu queria.
Assobiando uma canção antiga, fui caminhando para dentro de casa, com o tilintar das correntes em meu encalço.

LAÇOS MORTAIS | Bonkai |Where stories live. Discover now