58. Suspeita

881 88 28
                                    

- Tem certeza de que não pode ficar mais um pouco?
Caroline estava parada na entrada da casa, seus olhos brilhando daquela maneira fofa quando queria comover alguém com seus pedidos. Eu estava quase cedendo, no entanto, fui forte o suficiente para desviar o olhar.
- Eu tenho que ir para casa, Care - falei de maneira gentil - E não é como se não nos víssemos praticamente todos os dias.
Suas sobrancelhas loiras se juntaram em sinal de tristeza.
- Eu sei, mas eu gostei tanto de tê-la aqui em casa e a Eve é uma ótima companhia para as meninas.
Olhei para as duas crianças que estavam agarradas a cintura de sua mãe olhando tristemente para minha filha parada ao meu lado com sua mochila de unicórnios entre as mãos. Ela também não estava feliz com o fato de ter que acabar com aquela semana divertida que tivera na casa de minha melhor amiga. Em parte, eu também me sentia mal por não poder ficar mais um pouco, mesmo não admitindo Caroline era a pessoa mais maravilhosa de todas, ela havia transformado aquela semana sombria e assustadora em algo bom e feliz. Mas eu não podia nem mesmo agradecê-la por isso, pois corria o risco de ter que contar o que estava ocorrendo.
Não podia fazer isso. Não agora.
- Que tal ir lá em casa amanhã, depois do trabalho, hein? - sugeri - Leve as meninas também. Nós podemos ir no Mystic Grill. O que acha?
Ela sorriu, assentindo com a cabeça.
Eu sempre soube o motivo pelo qual minha amiga sempre queria estar por perto. Ela sentia-se culpada pelo que ocorreu anos atrás, culpada por não ter sido capaz de proteger a mim, de não ter podido me salvar antes que fosse tarde demais. Eu nunca fiquei ressentida de meus amigos, pois sempre fizeram o que estava ao seu alcance para me ajudar. Como poderia julgá-los?
Depois de nos despedimos - com direito à lágrimas e tudo -, eu e minha filha nos dirigimos para casa. No caminho, tive que parar para comprar um pote de sorvete de morango com nata como forma de adquirir paz para com Eve, que veio metade do caminho de cara amarrada e braços cruzados. Ela até podia não admitir, mas quando estacionamos em frente à nossa casa e desafivelei o cinto de segurança, a menina correu para dentro animada com o fato de estar em casa de novo.
- Onde está o Raizo? - ela perguntou, vasculhando pela casa e demais busca daquele cão pulguento.
- Stefan disse que traria ele mais tarde - informei, vendo-a sorrir.
As gêmeas de Caroline tinham alergia a cães, algo que herdaram de Josette. O pai delas achava essa característica adorável. Acho que isso o fazia sentir-se mais próximo da mãe biológica de suas filhas.
Eve estava prestes a escapar para qualquer canto da casa para aprontar uma das suas, quando parou no meio do corredor que levava até a entrada.
- Que cheiro é esse? - ela fungou, franzindo o cenho - Isso é sangue?
Empalideci.
Depois de minha "discussão" com aquele maldito herege desprezível, certifiquei-me de que cada centímetro da casa em que seu sangue tocara estivesse impecável de tão limpo, mas eu havia esquecido que o olfato de um vampiro era muito sensível, mesmo que Eve ainda tivesse uma parte humana.
- Sangue? -  fiz a sonsa, forçando uma risada - Ah, você deve estar falando de uma das bolsas de sangue que eu deixei cair no chão quando vim aqui em casa antes.
Eve ainda estava fungando, andando pelo corredor até parar exatamente onde estavam as marcas de sangue antes.
- Esse cheiro é estranho… - disse, ainda concentrada.
- Estranho? - engoli em seco.
- É. Sinto como se já o… conhecesse, mas não consigo lembrar de onde.
Ela estava prestes a tocar na parede onde eu o havia empurrado e mesmo sendo uma vampira, ela também tinha um lado sensitivo como eu. Saberia o que aconteceu no momento em que tocasse naquela parede. Antes que pudesse pensar em uma forma de pará-la a campainha soou.
Eve tirou os olhos da parede e correu até a porta, apenas para encontrar Stefan do lado de fora da casa. Ela deu um gritinho de felicidade ao ver o cão que sacudia a cauda ansiosamente, também, com saudade. Eu nunca me senti tão feliz em ver aquele cachorro ingrato.
Passamos a tarde toda no sofá, apenas aproveitando o fim de semana e assistindo aos programas favoritos de Eve. Mesmo quando eu estava em casa essas atividades eram raras porque sempre estava atarefada com trabalho até a garganta. Nunca tinha muito tempo para ela e isso me fazia sentir a pior mãe do mundo às vezes.
Quando anoiteceu, não deixei Eve dormir sozinha em seu quarto. Era a primeira noite que passávamos em casa depois do incidente da barreira e eu não queria me afastar dela nem um segundo sequer. Não demorou para que ela pegasse no sono, mas eu fiquei acordada mais um pouco, olhando apenas para ela e desejando profundamente poder senti-la dentro de mim mais uma vez, onde estivesse segura de todo o mal do mundo.
Suspirei, fechando os olhos e meu último pensamento como em todos os dias foi ela. Amy.

LAÇOS MORTAIS | Bonkai |Onde as histórias ganham vida. Descobre agora