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Quando se fala da 2º Guerra Mundial lembra-se principalmente do nazismo ou no holocausto juntando a isto os campos de concentração/extermínio como Auschwitz mas para além desse existiram muitos outros que muitos desconhecem como Bełżec...

A minha avó contava-me sobre o que aconteceu durante a guerra, o que ela e a sua família sofreram nas mãos do regime nazi, ela foi das poucas pessoas a sobreviver num dos muitos campos de concentração espalhados por parte da Europa juntamente com a sua mãe e quando por fim estava livre fugiu para a América onde se casou com um soldado americano e onde viveu a sua vida por fim em paz. 

Atualmente tem andado bastante doente e os médicos dizem que não irá durar por muito mais tempo e quando ela morrer será uma vida cheia de histórias que se apagará, lembro-me de quando ela me contava histórias sobre quando vivia na Europa, de quando vivia em Paris até se mudar aos 14 anos para Varsóvia na Polónia até que a guerra começou em 1939 quando esta tinha apenas 18 anos e foi para os campos de concentração. Já o meu avô, como tinha dito ele era um soldado americano que lutou na guerra conhecendo a minha avó quando começaram a chegar sobreviventes de guerra a Nova Iorque, não me lembro muito dele pois morreu quando eu tinha 10 anos ou seja à 13 anos mas a minha avó contava-me o quão incrível ele era.

Nos últimos dois dias passei o tempo inteiro na sala de espera do hospital central de Brooklyn devido a umas complicações que a minha avó teve no coração, ninguém me diz nada sobre o seu estado, se está melhor ou não, apenas vejo pessoas ao longe no corredor que entram e saem do seu quarto.

-Miss Anderson? A sua avó deseja falar consigo.- uma enfermeira por fim veio até mim dizendo-me que podia  entrar e falar com a minha avó, o corredor era comprido mas no final cheguei ao quarto hesitando a entrar acabando por o fazer, deparei-me com uma das pessoas mais especiais para mim deitada com fios por todo o lado a olhar para a janela e fiz o caminho até a mesma recebendo a sua atenção.

-Como estás?

-Já estive melhor querida.- a sua voz já não parecia a mesma, aquela pessoa já não era a mesma, tudo mudou nestes dois dias e eu não sabia o que fazer, sentia-me tão perdida.- Madison, eu quero que faças uma coisa depois de eu partir...

-Não digas isso, ainda vais durar muito mais tempo vó.- disse mentindo pois eu e ela sabíamos que isso não iria ser verdade, mais cedo ou mais tarde iria acontecer.

-Querida, eu preciso que vás à minha carteira e procures uma carta, eu preciso que entregues essa carta à pessoa para quem se remete ou a algum descendente. A carta ainda está aberta e...há algo que eu nunca te contei. É a última história que tenho para te contar.- a mesma disse e apressei-me a procurar a tal carta acabando por a encontrar guardando-a na minha carteira concentrando-me novamente na mulher que se encontrava na cama do hospital.- Madison? Tens dormido, tens comido?

-Com o que tem acontecido nos últimos dias? Não, é impossível...

-Vai para casa descansar querida. Amanhã já estarei de novo em casa e iremos lanchar as duas, farei daquelas bolachas que tanto gostas.

-Claro... Adoro-te.

-Eu também minha querida.

Infelizmente foi a última coisa que me disse, naquela noite após abandonar o hospital o seu corpo deixou de responder, desistiu de lutar, e agora faz um mês que partiu e foi um período complicado, não fui para o trabalho durante uma semana, mal comia, mal dormia mas vim melhorando, foi uma fase bastante complicada. No meio disso tudo descobri que me deixou a sua casa  em Brooklyn e a sua herança foi dividida entre filhos e netos, na realidade eu não precisava da casa e pensava vende-la mas por enquanto ela seria minha e foi então que decidi começar a limpar algumas coisas que ela guardava encontrando uma caixa onde se encontrava escrito "Europa" em letras carregadas, a curiosidade foi mais forte e acabei por leva-la para baixo até à sala pousando-a sobre a mesa de jantar que ainda possuía umas flores já mortas no centro, abri a caixa encontrando livros e cartas tal como um vestido sujo mas onde ainda se percebia as riscas azuis e brancas e rapidamente o pousei ao lado da caixa lembrando-me assim daquelas histórias que a minha avó contava sobre quando chegou a Bełżec, a maneira como a trataram, a ela e a todos os outros prisioneiros, a maneira como lhes retiraram todos os seus pertences, a sua liberdade e a maneira como viviam....miseravelmente.

-Ainda à volta da casa Madison?- por momentos parecia ouvir a voz da minha avó novamente mas quando me virei era apenas a minha mãe que se encontrava encostada à porta com um sorriso como se estivesse a dizer "Anda, está a ficar tarde".- Está a ficar escuro, é melhor irmos embora. Amanhã tens de acordar cedo para ir trabalhar.

-Eu já vou, apenas estou a arrumar umas coisas. Eu já vou ter contigo ao carro.- acabei por dizer fazendo com que voltasse a estar sozinha, a olhar para aquela caixa até que ao fundo vi uma fotografia já bastante antiga onde mostrava um jovem rapaz com 20 anos talvez mas antes que observasse todos os detalhes ouvi a buzina do carro da minha mãe tocar quase como se dissesse "Mexe-te" e apenas tive tempo de guardar a mesma na carteira saindo por fim daquela casa seguindo caminho até o Ford Focus azul que me esperava para me levar de volta para Queens onde morava desde que acabei a faculdade.

Queens é na realidade um bom sítio para viver, um pouco longe dos problemas que existem no centro de Nova Iorque e também foi aqui que a vida da minha avó começou quando chegou da Europa, muitas das pessoas que emigraram para os Estados Unidos e que eram sobreviventes de guerra ficaram por Nova Iorque e especialmente em Queens até que começaram a espalhar-se por toda a cidade. 

Não demorou muito até chegarmos a Queens e estar à frente do meu apartamento, despedi-me da minha mãe e sai do carro seguindo para a entrada do prédio onde fiquei cerca de cinco minutos à procura das chaves que se encontravam algures na minha mala até que por fim encontrei-as acenando mais uma vez para a minha mãe e subindo as escadas devido ao elevador continuar avariado até estar por fim à frente do 3B entrando sendo logo cumprimentada por Bucky, o pug que me ofereceram quando acabei a faculdade, pousei a carteira sobre o sofá pegando no pequeno seguindo até à cozinha onde o pousei preparando-lhe algo para comer e depois para mim visto que já não comia nada desde a hora de almoço mas enquanto aquecia algo no microondas olhei através da "janela" que me mostrava a sala de estar parando na carteira vermelha sobre o tecido bege do sofá lembrando-me assim da fotografia que trouxera da casa em Brooklyn, acabei por parar o microondas seguindo até a carteira onde procurei pela tal fotografia vendo a carta que a minha avó me tinha entregado, nunca mais me tinha lembrado dela até que por fim a tirei da carteira e fiquei a admirá-la por algum tempo até que me dirigi novamente à cozinha pousando a mesma sobre o balcão e acabando de preparar algo para comer mas enquanto comia a curiosidade de saber o que se encontrava escrito naquele pedaço de papel era mais alta e isso fez com que pousasse o prato e pegasse na carta sentando-me na mesa da cozinha.

-De Heinz Brauer para Eleanor Freud.- Procurei por uma morada mas nada, eu apenas tinha aqueles dois nomes e teria de descobrir onde morava esse tal Heinz Brauer e entregar-lhe a carta se queria cumprir com a promessa. Pouco depois abri por fim a carta esperando um pouco antes de ler o conteúdo na mesma.- "Heinz Brauer..."

"...como estás? Lembras-te de mim? Lembras-te de Bełżec? Sim, eu sobrevivi e agradeço-te pois se não tivesses sido tu eu não o teria feito, tu ajudaste-me, tu quebraste regras para me salvar acabando preso por estares no lado errado.

Bem, desde que fui libertada em 1944 que vim viver para Nova Iorque onde acabei por me casar com um soldado americano, parece que tinha queda para soldados, mas sem nunca me esquecer de ti, tive dois filhos e na realidade o mais velho chama-se Heinz, o meu marido não entendeu o porquê desse nome e apenas eu sabia o significado que tinha para mim, tu eras especial e ainda hoje és pois além de me ajudares tu viste em mim o que os outros não conseguiam ver. Adorava regressar a Varsóvia mas a minha vida agora é em Nova Iorque, é aqui que tenho a minha família.

E tu? Como vai a tua vida? Foste feliz?

Aguardo uma resposta em breve.

Da tua querida Eleanor Freud"

Quem era esta Heinz Brauer? Qual era a sua história?     

AVISO: A história é ficção tal como as suas personagens.

NotaBełżec foi um campo de extermínio alemão situado na Polónia. Foram poucos os sobreviventes.

O segredo de BełżecWhere stories live. Discover now