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LETICIA

Para falar a verdade, eu nunca imaginei como seria minha morte. Em algum momento da sua vida você simplesmente percebe que não viverá para sempre, geralmente é um período em que você ainda é uma criança se questionando sobre tudo ao seu redor.

O medo invade e você começa a notar que o mundo é bem mais terrível do que se parece, aqueles contos de fadas que você já leu se torna totalmente patético quando se descobre a verdade sobre viver em um mundo tão coberto de maldade. Bom, eu conheci isso mais cedo do que queria.

Morrer já foi uma opção agradável para mim, mas um dia o meu tormento simplesmente se foi e algo melhorou em minha rotina, por pouco tempo. Morrer nas mãos dos meus tios não me parece algo muito bom, mas contando com o fato de que o universo já me salvou de muitas situações, posso dizer que essa morte foi muito mais leve do que o esperado.

Então é isso, esse deve ser o meu fim. Quer dizer, eu esperava algo mais emocionante do que isso, mesmo assim é uma morte considerável.

Sinto o vento bater em meus cabelos e tento pensar em algo que vá acalmar aquilo. Se eles não relaxarem vamos morrer com um acidente de carro.

— Tem como me explicar o que estão fazendo?! — Tentei desfazer o nó da corda em meus pulsos.

— Você ligou para a polícia, o que esperava dessa merda? — Ok, eles estavam bravos.

— Garanto que esperava algo bem diferente disso.

Meu coração estava tão rápido quanto a turbulência de um avião, toda a minha vida parecia um filme em minha cabeça. Eles não podem simplesmente me jogar dentro de um carro e fugirem comigo.

— Para onde estão me levando? — O silêncio foi uma praga contra mim — Eu fiz uma pergunta!

— Caralho Leticia, será que você percebe que não têm muito direito de fala nesse momento?! — Bruno disse bem nervoso.

— Será que vocês percebem que estão me sequestrando pela segunda vez?!

— Olha, só nos de um tempo, ok?

— Não, não tá nada ok, me expliquem o que vão fazer comigo... Se forem me matar só acabem logo com tudo isso.

— Na verdade nós deveríamos mesmo fazer isso — As palavras de Lucas machucaram bem mais que o esperado.

Puxei o ar para meus pulmões e tentei me acalmar com toda essa merda. Por que eu simplesmente não fiquei quieta esperando alguém vir me salvar? Ninguém merece morrer sem ter a chance de se redimir por seus pecados.

[...]

Foi uma viagem longa e silenciosa, não trocamos mais palavras depois da curta discussão. Eu já estava preparada para o que vinha pela frente, mesmo não sabendo o que iria acontecer.

Olhei para a enorme casa em que nos aproximavámos e tentei não entrar em choque total ao notar o quanto aquele lugar era enorme. Ok, isso foi inesperado.

Eu esperava que eles fossem me matar em um lugar mais discreto, mas isso aqui é tão... Lindo.

Os dois desceram do carro, Lucas veio até mim e abriu a porta do passageiro, só ousei sair quando ele indicou com a cabeça.

— Onde estamos? — Tomei a iniciativa de perguntar.

— Longe de casa — Foi a única coisa que Bruno me disse.

Meus tios andaram até a casa e me senti totalmente receosa para acompanhar eles, mesmo acabei seguindo ambos.

Paramos em frente da porta e Lucas tocou a campainha, demorou até que fossemos atendidos, mas assim que as portas se abriram, um homem, muito lindo, nos recebeu com um sorriso aberto. As coisas ficaram ainda mais confusas em minha cabeça.

— D'angelos! É um prazer receber vocês em minha casa.

— Estávamos com saudades, Ben — Meus tios o cumprimentaram com um abraço.

— Confesso que não esperava receber uma mensagem dos dois, então, o que aconteceu para vocês pedirem ajuda?

O foco dos três vieram até mim e me senti bem desconfortável com isso. Eu conhecia aquele olhar que pairou no rosto do desconhecido, já tinha visto essa expressão dezenas de vezes.

— Sabrina? — Em toda minha vida já ouvi isso mais vezes do que consigo contar nos dedos.

— Ah... Ben, essa é a nossa sobrinha, a Leticia.

— Ai meu Deus, desculpa, eu pensei que...

— Sem problemas — Disse com um sorriso falso nos lábios.

— Eu não sabia que Carlos tinha uma filha ainda mais com... — O homem olhou para o Bruno, senti uma compreensão em seu rosto.

— A gente pode entrar? Precisamos da sua ajuda.

— Claro! Por favor, fiquem a vontade.

Ben deu espaço para nós e assim que entrei foi impossível não observar cada detalhe do lugar. Depois que me mudei para a casa dos meu tios fiquei acostumada com requintes, mas isso aqui era outro nível.

Não sei explicar, mas me sinto estranhamente bem nessa casa.


LUCAS

Ben deixou nossa sobrinha com a governanta da casa e eu seriamente fiquei preocupado por deixá-la sem uma supervisão de confiança.

Mesmo assim acompanhamos nosso amigo até o escritório e contamos tudo para ele, bom... Nem tudo.

— Vocês o que?! — Olhei o pavor nos olhos do moreno — Sequestraram a menina, por a caso estão loucos?

— Ela sabia de mais, Ben — Bruno tentou argumentar.

— E por esse motivo vocês a sequestram? Eu entendo que já fizeram isso outras vezes, mas é a sobrinha de vocês!

— Fizemos besteira e agora queremos concertar, ela pode ter ligado para a polícia e estamos com medo de rastrearem a gente — Disse a ele — Não podemos estar envolvidos com nada no momento.

— Deviam ter pensado nisso antes de levá-la para uma cabana.

Eu sabia que teria esses julgamentos e sinceramente eu achava bem merecido, fizemos besteira, isso é um fato.

— Olha, — Ben passou a mão no rosto e respirou fundo — vocês podem ficar aqui na minha casa até a poeira baixar, mas não quero nenhuma ligação com vocês caso a polícia se intrometer nesses assuntos.

— Pode deixar e muito obrigado por sua hospitalidade.

— Só tentem concertar tudo, vou pedir para organizarem um quarto para vocês — Ele foi até a porta mas antes de sair olhou para nós novamente —  E Bruno, a Leticia não lembra a...

— Isso é uma conversa para outro momento, Ben — Meu irmão não o deixou completar a frase.

— Entendido, fiquem a vontade.

Nosso amigo saiu e eu olhei para Bruno, acho que nós dois pensávamos na mesma coisa. Estamos fodidos.

100 Camadas De DesejoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora