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LETICIA

Tinha sido uma noite mal dormida para mim, pensei que depois que saísse da cabana ia finalmente conseguir dormir com mais tranquilidade, mas não foi bem isso que aconteceu.

Eu ainda estava tendo visões das lembranças passadas frequentemente e isso tem tirado meu sono que é quase impossível pregar os olhos por alguns segundos. Mesmo morto aquele embuste ainda vinha me perturbar.

Respirei fundo e me esforcei para colocar uma boa expressão no rosto e parecer de bem com a vida. Ok, é só um café da manhã.

Abri as portas dupla e o olhar dos dois homens vieram até mim, fui para o meu lugar de sempre e notei que tinha alguém faltando. Ben e Lucas estavam sentados diante a mesa, mas não tinha nenhum sinal do Bruno.

Não tinha visto ele depois daquele beijo na noite retrasada e apesar da iniciativa ter sido minha eu sentia que não devia ter feito aquilo, ou era só um grande medo dele não ter gostado tanto quanto eu. Talvez fosse melhor fingir que nada aconteceu.

Por que eu sinto que o ar está tão tenso?

— Bom dia — Cumprimentei os dois e comecei a me servir.

Meu tio estava um verdadeiro caos, só o seu semblante já soava uma bela derrota e Ben mantinha um sorriso contente no rosto, sua simpatia as vezes me irritava.

— Bom dia, Leticia — O moreno me cumprimentou e passou as panquecas para mim.

— Onde tá o Bruno? — Lucas ficou tenso assim que ouviu o nome do irmão. Isso era estranho.

— Ele deve ter saído para resolver alguma coisa?

— Estamos falando do mesmo Bruno?

Antes que a conversa se estendesse um barulho alto ecoou do corredor e foi impossível não notar que algo tinha quebrado através daquela porta. O homem logo entrou na sala de jantar e vi o quanto acabado ele estava.

— Bom dia, família — Bruno disse se embolando com a própria língua.

O cheiro de bebida era nítido mesmo estando longe dele, suas roupas estavam amarrotadas, tinham pequenos ferimentos em seu rosto e seu semblante era a coisa mais desastrosa que já presenciei.

Algo muito sério havia acontecido, ele costuma descontar os problemas com a bebida, mas não desse jeito.

— Bruno? — Ben se levantou e foi até ele — Por Deus, o que aconteceu?

— Oi — O moreno segurou meu tio para que ele não caísse — Acho que a essas horas você já deve saber o que aconteceu.

— Do que tá falando?

— Oh, meu irmãozinho não disse? Quer dizer, acho que não posso mais chamá-lo de irmão, né?

— Bruno! — Lucas pronunciou seu nome como uma repreensão — Por favor, pode esperar ficar sóbrio para falar alguma coisa?

— Você ainda não disse, não é? — Ele se virou para mim — Já contou para Leticia?

— Contou o que? — Olhei Lucas e vi aquela preocupação em seu rosto.

— Deixa eu resolver isso — Ele se levantou e foi até o irmão — Ben, pode levar Bruno para o quarto?

— Claro.

Os dois se afastaram do cômodo e eu observei meu tio sair pelo corredor, levantei da cadeira e o segui.

Lucas parecia esconder alguma coisa, eu sabia que algo estava errado, quando fiquei desatenta com coisas simples?

Segurei seu braço e ele notou minha presença, sua respiração pareceu falhar e eu podia jurar que vi a mentira naquelas pupilas.

— Leticia...

— Do que ele tava falando?

— Podemos conversar sobre isso depois?

— Não, não podemos.

Fiquei de frente para meu tio, ele nem sequer olhou em meus olhos. Dezenas de pensamentos veio para minha mente para me atormentar, algumas teorias se formaram.

— O que tá acontecendo?

— Nada.

— Tá sim! Me explica, agora.

— Você vai ouvir o que um bêbado está dizendo?

— Sim, Lucas, eu vou ouvir — Me aproximei dele e seu corpo recorreu — Por favor, sem mentiras.

— Eu... Olha, é bem mais complicado do que parece.

— Acho que eu aguento.

Seus olhos se encheram de lágrimas e vi a vulnerabilidade naquele rosto tão entristecido, algo em meu peito pareceu se incomodar.

— Me desculpa — Ele sussurrou e segurou meu rosto — Me desculpa, por favor.

— O que tá acontecendo?

— Eu juro que não sabia sobre você, foi um surpresa para mim.

— Ei, me explica — Coloquei minhas mãos sobre as suas e fiz carinho com o polegar — Lucas, tá tudo bem?

— Não, não tá — Por que tinha tanto medo e receio no seu tom de voz?

Suas mãos tremiam, sua respiração não passava de um fio fino prestes a quebrar e suas lágrimas não paravam de escorrer. Isso parecia uma crise.

— Você deveria ter ido embora quando teve chance, por que não fez isso? — Ele puxou meu rosto para cima com delicadeza e fez nossos olhos se encontrarem — Por que ainda tá aqui Leticia?

— Não posso sair até descobrir a verdade.

— Não somos bons para você, não deveria ficar nessa casa.

— Lucas...

— Deveria ir embora.

— Você tá me assustando.

Ele beijou o topo da minha testa, largou meu rosto e se afastou, seu peito se estufou e notei que ele puxava o fôlego. Foi preciso um momento para se acalmar.

Mesmo com todo o caos, com aquela dor nítida por todo seu corpo, Lucas permanecia lindo, era estranho que em meio a toda tristeza o homem e minha frente poderia facilmente ser pintado como um anjo.

— O que Bruno quis dizer naquela hora, foi que... — Ele passou a mão nos olhos e enxugou as lágrimas.

— Não somos irmãos — A confusão se instalou em mim.

— O que?

— Nós não somos irmãos, Leticia — Ele respirou fundo mais uma vez — E você não é nossa sobrinha.

Minhas pernas fraquejou assim que sua frase se encerrou, senti meus sentidos se aflorando e derrepente tudo pareceu girar ao meu redor Por algum motivo lembranças de nós três vieram a minha cabeça, isso não podia ser verdade.

Toda a culpa que eu carregava em meus ombros pareceu se acalmar, ficar mais leve, mas rapidamente voltei a realidade em segundos. Foi a minha vez de ter uma crise.

— O que? — Sussurrei para mim mesma.

— Isso mesmo que você ouviu... Não temos parentesco — Foi a única coisa que ele disse antes de sair.

Espera, essa é a sensação de alívio ou desespero?

100 Camadas De DesejoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora