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LUCAS

O relógio era o único som perceptível por aquela sala tão vazia e ao mesmo tempo tão cheia de memórias e sentimentos aflorados, em meu peito não existia muita coisa além de um buraco precisando ser preenchido por qualquer coisa reconfortante.

Esse era mesmo o seu fim?

Poderia lembrar das vezes que ela tinha sido rigorosa e até antipática comigo, mas isso seria doloroso de mais para alguém que se encontrava próxima ao leito de morte. E afinal de contas tudo isso foi apenas para o meu bem, não é?

Eu não sabia onde meus irmãos estavam e pela primeira vez isso não foi um incômodo para mim, eles deveriam estar aqui? Sim, mas era esperado toda essa falta de consideração por nossa mãe.

Escutei passos se aproximando e logo enxuguei as lágrimas que tinham conseguido escapar de meu olhos, estava lutando para que isso não acontecesse.

Levantei o olhar e vi a jovem mulher que estava na minha frente, ela segurava uma bandeja nas mãos e o sorriso em seus lábios não era alegre, apenas reconfortante.

Fiquei contente ao notar a presença de Valentina.

— Olá, querido — Ela colocou a bandeja na mesa de centro e notei que aquilo era para mim — Eu trouxe um aperitivo para você.

— Obrigado, mas eu não quero.

— Você têm que comer, senhor Lucas — Seu tom parecia mesmo preocupado — Nada vai se resolver se você ficar de estômago vazio.

— Valentina...

— Por favor, apenas um pouco — Seus olhos pareceram brilhar por súplica. Estranho.

Respirei fundo e me estiquei para pegar um pedaço do bolo que ela tinha trago. Mordi apenas um pouco e senti o sabor explodir a cada mordida, não era ruim.

— Você têm que se cuidar melhor, querido — Ela sentou ao meu lado e senti seus olhos me perfurando, era bem assustador — Eu sei que as coisas estão difíceis, mas pelo menos tente.

— Meu pai morreu, minha mãe está deitada em uma cama sem nem conseguir respirar direito e meus irmãos não conseguem ficar quietos em casa... Como eu vou me cuidar melhor?

Precisava de um desabafo, isso era nítido, mas acho que não deveria fazer isso com uma diarista.

— Olha, senhor...

— Só Lucas, por favor — A corrigi.

— Tudo bem, Lucas... Eu sei das coisas que você passou, estou aqui olhando e vendo cada passo que acontece nessa casa, tudo pode estar um caos agora, mas você precisa se manter firme.

— Acho que não consigo, Valentina.

— Claro que consegue, você pode tudo com um pouco de esforço, não deixe seu mal humor te colocar para baixo... Ok? — Ela levantou e arrumou o avental.

— Valentina — Abri um sorriso para a loira — Obrigado.

— De nada — Seu sorriso pareceu afrouxar — E Lucas... Não tenha medo de chorar no conforto do seu lar, até mesmo você precisa de silêncio para o tormento que vive dentro da sua cabeça.

Ela se afastou me deixando novamente sozinho. Acho que devo me acostumar com isso, a solidão, vai ser desse jeito a partir de agora, ou será que sempre foi assim?

Eu poderia ter continuado preso em meio a minha bagunça, mas o som da maçaneta preencheu a sala e eu olhei para o homem de jaleco se aproximar. Levantei imediatamente.

100 Camadas De DesejoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora