Capítulo 7: Atrás das Grades.

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Encarei as paredes de pedra e o quadrado na parede, com grades, algo que eu deveria considerar uma janela. A cama era pelo menos macia e com um colchão decente. Isso pra mim era como tesouro, já que eu dormia em cima de madeiras podres.

Fazia 4 anos que eu estava morando nas ruas e não havia parado atrás das grades em nenhum roubo. Mas claro que há sempre uma primeira vez pra tudo na vida. Suspirei, me ajeitando sobre o colchão macio. Fiquei encarando o chão quando vi as grades sendo abertas e Declan passando por ela.

Ele vestia suas roupas de chefe, com o símbolo do reino, uma coroa pendurada no cabo de uma espada. Seus cabelos eram um pouco longos, na altura dos olhos. A pele bronzeada de ficar tanto tempo no sol. E os olhos âmbar que eu jurava serem detectores de mentira. Ele era jovem e bonito. Todos aqui eram bonitos demais para um lugar tão imundo.

—Trouxe algo pra você comer. —Falou e se aproximou. Me afastei automaticamente, com medo que ele fosse me tocar. Mas Devlon apenas deixou um prato de comida na ponta da cama e se afastou.

Não pensei duas vezes antes de puxar o prato pra mim. Havia carne nele. Carne de verdade. Com legumes. Quase chorei de felicidade com aquilo. Peguei o garfo e comecei a comer.

—Calma, vai se afogar assim. —Afirmou, quando me observou comer como uma morta de fome. E eu definitivamente era uma morta de fome. Diminui o ritmo e comecei a comer com mais calma, tentando apreciar uma comida de verdade. —O que costuma comer nas ruas?

—Qualquer coisa. —Dei de ombros. —Normalmente frutas. São mais fáceis de roubar na feira. Quando tenho sorte, pães. —Ergui os olhos até ele, e vi que o mesmo havia se escorado nas grades e estava me observando comer. —Eu sei que é errado roubar. Mas ninguém vai dar emprego pra um mendigo e também, só estou tentando sobreviver.

—Eu sei, Kayla. —Afirmou em um tom totalmente despreocupado.

—Como sabe meu nome? —Indaguei e ele ficou em silêncio. Revirei os olhos e continuei a comer. —Não vai me comprar com um prato de comida, okay?

—Não estou tentando comprar você. —Retrucou e eu ergui os olhos até ele de novo. —Eu sei que a vida de vocês órfãos na rua é difícil. Se pudesse daria um prato de comida a todos vocês. Mas infelizmente não posso.

Fiquei em silêncio e voltei a comer, vendo que estava quase terminando. Mas minha fome ainda era grande.

—Eu sei o que tem naquela floresta, Kayla. —Falou e o garfo parou no meio do caminho. —Sei que não são apenas lendas e que o que dizem existe mesmo. Sobre O Fantasma.

—Não sei do que está falando. —O ignorei e voltei a comer, ouvindo o suspiro pesado dele. Limpei o prato e o encarei, vazio em minhas mãos. —Eu... eu queria mais.

Devlon se aproximou de mim e estendeu a mão para pegar o prato das minhas mãos. Me encolhi no lugar e ele se afastou até as grades.

—Levi, arrume outro prato e traga água também. —Pediu, quando um guarda se aproximou do lado de fora da cela e pegou o prato das mãos de Devlon. —Quer mais alguma coisa, Kayla?

—Não, obrigada. —Agradeci. Um segundo prato de comida já estava de bom tamanho. Se eu ia morrer enforcada e depois ia para o inferno, que pelo menos fosse de barriga cheia. —Quando vai ser minha execução?

Devlon virou o rosto para me encarar e balanço a cabeça negativamente. Observei ele se escorar mas grades de novo e cruzar os braços.

—Você não será enforcada, Kayla. A safira não foi encontrada com você. Então não podemos enforca-la por uma suspeita. —Afirmou me deixando surpresa.

—Então era mesmo uma safira? —Indaguei e ele pareceu se dar conta de que havia falado demais.

—O que sabe sobre elas? —Questionou e eu fiz uma careta.

—Eu não sei absolutamente nada. Só ouvi que o rei teria encontrado uma. Então quer dizer que a mais de uma? E o que elas são? Valem muito dinheiro? É ligado a magia? Porque o rei quer elas? —Fiquei em silêncio quando ele ergueu as sobrancelhas, um pouco assustado com minhas perguntas.

—Suas perguntas são irrelevantes. —Afirmou e pegou o prato e o copo de água que o guarda havia trazido de volta, estendendo a mim. —Deve ficar feliz por não ter sido pega com ela.

—O príncipe sabe que foi eu. Mesmo assim vai me deixar sair livre? —Questionei e Devlon negou com a cabeça.

—Ele quer conversar com você pessoalmente. Quando ou porque eu não sei. —Devlon passou pelas grades e a trancou, enquanto eu começava a comer de novo. —Acho que vai gostar de saber que talvez seja liberada. —Ergui os olhos até ele. —Posso arrumar um abrigo, roupas e comida pra você.

—Em troca do que? —Questionei e ele abriu um sorriso sem mostrar os dentes.

—Trabalho. —Disse e então virou as costas para se afastar. Engoli em seco e bebi um pouco de água.

—Devlon? —Chamei e ele se virou, olhando pra mim por entre as grades. —Ele pegou... A coisa lá na Floresta do Medo. Eu o vi e ele pegou a safira.

Ele me encarou por alguns segundos. Devlon pareceu pensativo por um segundo, sem expressar nenhuma emoção. No fim ele assentiu e foi embora. Voltei a comer. Eu não perderia nada contando a ele aquilo. Meu único arrependimento foi não perguntar a ele o que era aquele ser. Um rapaz humano no meio da Floresta do Medo e ao lado de Criaturas das Sombras.

Terminei de comer e bebi o restante da água, deixando os dois ao lado da cama. Me ajeitei no colchão e fechei os olhos. Eu não seria enforcada, ainda ganharia abrigo e comida. Tudo isso em troca de trabalho. Eu não sabia de onde vinha essa generosidade de Devlon. Contando que eu conseguisse ir embora daqui sem problemas, estava ótimo.

Mas só tinha uma coisa me incomodando, o príncipe e seu desejo de conversar comigo. Ladrões não conversam com pessoas da realeza. Nós fugimos delas. E era isso que eu pretendia fazer.




Continua...

Uma Conjuração de Magia / Vol. 1Where stories live. Discover now