Capítulo 8: Biblioteca Real.

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Acordei ouvindo o barulho da rua. Parecia que estava havendo uma festa no centro da cidade, por conta da música alta e das risadas exageradas e certamente bêbadas de quem estava lá.

Olhei envolta vendo que já estava noite. Eu havia dormido o dia todo. Praticamente desmaiei sobre o colchão macio. A cela estava escura e silenciosa. Eu não podia ver os prisioneiros ao lado, já que a parede que dividia uma cela da outra era de pedra. Então era o mesmo que estar sozinha.

Me sentei na cama e me encolhi contra parede. Pela primeira vez eu não estava com fome. Olhei para a pequena janela e vi as estrelas no céu, brilhando com certa intensidade. Meu corpo se arrepiou inteiro quando um vento gélido invadiu a cela e tocou em mim.

Olhei por entre as grades. Para o corredor escuro da prisão e engoli em seco. Havia apenas escuridão ali. Mas de um jeito estranho que fazia todos os pelos do meu corpo se eriçarem, parecia que ela estava olhando diretamente pra mim.

Me encolhi mais contra a parede, sentindo algo queimar na minha nuca. Era como se eu estivesse naquela floresta de novo. E aquilo estava olhando pra mim. Mas não havia nada ali. Era apenas noite sem fim.

Me sobressaltei quando fofos de artifício explodiram no céu e olhei para a janela, vendo o céu explodir em várias cores. Minha boca ficou seca e eu voltei a me deitar na cama, ainda com aquela sensação envolta de mim.

Era possível ele estar ali?

[...]

Me coloquei de pé quando as grades foram abertas e encarei Devlon, vendo ele me esperar do lado de fora. Passei por elas e tentei ficar o mais afastada possível dos guardas.

—Vou levá-la até sua nova moradia. Precisa entender que deve se comportar, Kayla. Vão lhe dar abrigo e comida, em troca de ajuda em trabalhos matinais. —Devlon explicou, me guiando por entre os corredores da prisão. —Não pode mais roubar ou andar nas ruas como fazia antigamente. Precisa se comportar ou vai voltar pra cá. O rei está sendo generoso deixando que lhe deem um emprego.

—E porque ele está fazendo isso? —Questionei e ele deu de ombros.

—Ele aprecia sua coragem de roubar do príncipe real. Ainda mais algo tão importante. —Explicou e eu soltei uma risada.

—Sendo assim, ele deveria tomar mais cuidado. Não deveria deixar algo tão importante dando sopa em um simples bolso de casaco. —Afirmei e Devlon sorriu, como se estivesse concordando. —Pra onde vai me levar?

—Biblioteca Real. Você vai ajudar as fadas a preservar o acervo de livros. —Murmurou e eu engoli em seco. —O que estava fazendo na igreja naquele momento, Kayla? —Questionou, como se soubesse que eu havia fugido usando aquele túnel da biblioteca.

—Você sabe, eu roubei o dinheiro do padre. —Ele me olhou. —Com todo respeito, é claro.

Devlon balançou a cabeça para os lados, desacreditado e me guiou até a saída da prisão. Fiquei feliz quando os guardas se dispersaram e apenas ele ficou comigo, me guiando pelas ruas da Cidade dos Ossos até a biblioteca.

—Você irá dormir lá junto com as fadas. Será ajudante delas. Deve fazer tudo que elas mandarem. —Assenti com a cabeça. Aquilo era melhor do que morar na rua e passar fome.

—Por quanto tempo? —Questionei e ele me encarou, como se não tivesse entendido minha pergunta. —Por quanto tempo tenho que trabalhar pra elas?

—Eu não sei. Você por acaso tem outro compromisso? —Indagou com certo tom de ironia. Balancei a cabeça negativamente. Eu só não esperava viver naquela cidade o resto da vida.

Devlon me levou até a biblioteca e me guiou até uma sala de estar ampla. Eu ainda estava com minhas roupas imundas do dia anterior e certamente com um péssimo cheiro.

—Devlon. —Uma mulher de cabelos loiros encaracolados apareceu. Como eu esperava, ela também tinha os olhos violetas como as outras Fadas da Luz.

—Tina, está é a Kayla. A moça que eu comentei ontem. Ela precisa de abrigo e comida. Está disposta a ajudar com o que for necessário aqui.

Olhei para a fada vendo ela me analisar de cima a baixo e abrir um sorriso simpático. Tentei retribuir, mas sem o mínimo de sucesso.

—É um prazer, Kayla. Eu sou Tina, uma das fadas que trabalha aqui na biblioteca do rei. —Olhei para Devlon e vi ele arquear as sobrancelhas pra mim, em uma ordem silenciosa.

—O prazer é meu. Fico grata pela gentileza de me abrigarem. —Falei e ela assentiu com um sorriso tranquilo, voltando sua atenção para Devlon.

—Mais alguma coisa? —Questionou e ele caminhou até a entrada de um dos corredores.

—Miriam está? —Olhei para Devlon ao ouvir aquele nome. Talvez até rápido demais. Coisa que poderia ter me denunciado, caso a atenção dele não estivesse toda na fada loira.

—Sim, na biblioteca particular. Está esperando por você. —Afirmou e ele se afastou sem olhar para trás. Olhei para fada, vendo os olhos dela vieram até mim. —Venha comigo, Kayla. Vou mostrar o seu quarto e deixar que tome um belo banho. Está com fome? Precisa de alguma coisa?

—Comida não seria ruim. —Falei, seguindo ela pelos corredores. Não iria negar um prato de comida nunca. —E roupas limpas.

Olhei para a sala do vestido dela, imaginado se teria que usar aquilo também. Eu certamente não gostaria. Vestidos nos deixam expostas demais e impossibilitam uma corrida.

Sempre analisando, Kayla. Sempre calculando.

[...]

Entrei embaixo da água quente e soltei um gemido. Nunca havia tomado um banho tão quente e tão bom na vida. A água fez meu corpo relaxar instantemente. Suspirei, lavando meus cabelos que a muito tempo não viam uma água limpa.

Sai do chuveiro quase uma hora depois, apenas porque meus dedos já estavam murchos como uma mão de velho. Entrei no quarto enrolada em uma toalha e encarei o vestido verde musgo que estava dobrado em cima da cama.

—Pouco tempo, Kayla. Pouco tempo. —Falei para mim mesma. Eu só precisava conseguir mais moedas de ouro e então iria embora. Só mais alguns dias e tudo isso ia ficar pra trás.

Peguei o vestido e coloquei com a maior dificuldade possível. Virei de costas para o espelho, tentando fechar o zíper atrás. Meus dedos tremeram um pouco quando encarei as marcas e cicatrizes nas minhas costas. Havia muito tempo que eu não olhava pra elas. Fechei o zíper com o maior dos esforços e tentei parecer o mais natural possível.

—Pode entrar. —Falei, quando alguém bateu na porta. Meu sangue gelou quando Miriam apareceu e me encarou, abrindo um sorriso que dizia tudo.




Continua...

Uma Conjuração de Magia / Vol. 1Donde viven las historias. Descúbrelo ahora