𝙲𝚊𝚙𝚒𝚝𝚞𝚕𝚘 𝟸𝟺 - 𝙰𝚗𝚝𝚎𝚜

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Fiquei ali chorando por um longo tempo, até ouvir a porta do meu quarto rangendo ao ser aberta. Nem precisei me virar para saber que era o meu pai. Ele se sentou ao pé da cama e ficou acariciando as minhas pernas, com movimentos lentos e reconfortantes. Aquele simples gesto de carinho me fez chorar ainda mais.

— Quer conversar? — Ele perguntou baixinho.

Neguei com a cabeça, me escondendo entre os braços.

— Agora não, pai. Só preciso de um minuto... — Falei. Papai concordou e se moveu um pouco mais para perto de mim, acariciando meus cabelos ondulados.

Ficamos ali os dois em silêncio. Papai me passando força indiretamente e eu pensando em que rumo errado minha vida estava tomando. Apanhar de homem era o fim. Por um momento me deixei imaginar que havíamos voltado no tempo, para anos atrás quando eu tinha somente sete anos e meu pai se deitava comigo todas as noites para me contar uma história diferente.

As minhas histórias preferidas eram as fábulas, porque sempre havia uma moral por trás delas. Amava a fábula da A lebre e a tartaruga. Ela mostrava como a pessoa, por mais simples que parecia, que realizava suas coisas com zelo e persistência, sempre o êxito a esperava no final.

— Sei que está com problemas querida, mas fique tranquila. Tudo ficará bem, papai está aqui e vai cuidar de você. — Ouvi ele dizer antes de finalmente cair no sono. 

Tive pesadelos a noite toda com Relíquia me espancando novamente.

•   •   •

Acordei de manhãzinha com uma dor desconfortável na cabeça. Devia ser pela surra e pela noite mal dormida. Logo após o café da manhã, tive que inventar umas desculpas para o meu pai, dizendo que tinha saído no tapa com uma menina na praia. Ele pareceu não engolir muito bem a minha história, principalmente porque cheguei em casa com a roupa toda respingada de sangue, mas estava atrasado para o trabalho e me avisou que queria saber mais sobre essa briga a noite. Até lá pensaria em mais detalhes.

Depois que papai saiu, liguei para Maite e avisei que não iria para a escola aquele dia. Ela parecia ter curiosidade do porquê de eu não ir, já que estávamos na penúltima semana de aula, mas não entrou muito no assunto. Bruninha na hora do intervalo me mandou uma mensagem, preocupada comigo. Parecia que ela sentia que eu não estava bem. Pedi para ela passar na minha casa depois da escola e adiantei um pouco o assunto, dizendo que estava acabada.

Tomei uma ducha rápida e me assustei quando me vi pela primeira vez no espelho. A região abaixo do meu olho esquerdo estava roxa e inchada, assim como o meu queixo e o resto do meu corpo. Não conseguia acreditar que aquele monstro havia mesmo me batido. Eu o odiava com todas as minhas forças!

— Covarde... — Sussurrei com meus lábios trêmulos, ameaçando chorar. Mas não derramaria mais nenhuma lágrima por causa daquele desgraçado, o que era dele estava por vir.

Passei o restante da manhã encolhida na minha cama, não querendo sair dali e me deparar com a realidade do mundo. Por volta das uma da tarde, Bruninha bateu na porta do meu quarto. Mandei-a entrar e vi o seu rosto chocado assim que me olhou toda roxa.

— Amiga o que foi que te aconteceu? Quem fez isso com você? — Bruna entrou correndo no meu quarto. Ela segurou meu rosto entre as mãos e começou a analisá-lo milimetricamente. — Eu pensei que você estava brincando quando disse que estava acabada, mas pelo jeito não! Quem fez isso contigo, Dulce?

Dono do Morro [M]Where stories live. Discover now