Assassino

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_Nikolai_

Ele nem resistiu.

Acho que ele já esperava algo do tipo –não reclamo, deixou meu trabalho mais fácil.

Ele estava sozinho em casa, sua esposa o havia deixado, bom para ela, pensei, ele era uma péssima pessoa.

Quando entrei em sua sala, ele estava sentado em sua poltrona de costas para mim, no entanto, era contra o meu código pessoal tirar a vida de alguém sem que a pessoa visse para quem perdia a vida. Sei bem que isso nada mudaria, a maioria nunca sequer tinha visto meu rosto antes e, com certeza, não voltariam a ver, porém, era uma das minhas regras, não que eu gostasse de ver o sangue escorrendo pelo corte preciso feito no pescoço ou a luz se esvaindo de seus olhos. É péssimo isso, desgastante, desumano, sei muito bem, contudo, acho que eu preferiria olhar nos olhos de quem me mata do que morrer na ignorância, então pelo menos dou isso à eles. Dou à eles a oportunidade de me amaldiçoarem enquanto se despendem desse mundo. Não vejo problema nisso, nunca fui fiel à qualquer coisa e parecia deixá-los com um pingo de dignidade enquanto iam.

Depois de tudo feito, levei-o enrolado em um saco vazio de grãos e o joguei de um desfiladeiro depois de encharcá-lo em banha de porto para que atraísse animais e não deixassem muito do corpo quando me deparei com o passar do tempo, o céu quase completamente escuro após o crepúsculo. A rapidez de como o dia se foi me surpreendeu.

Saíra do castelo bem cedo, pegando uma estrada mais limpa, não gostava de comer a poeira de cavalos, carroças ou carruagens à minha frente, além de que gostava de correr na montaria de Flynn, meu cavalo desde que tinha 15 anos, no entanto, aos galopes rápidos, minha barriga começou a me lembrar de que ainda se recuperava, obrigando-me a diminuir minha velocidade. Cheguei à Leste-Ilaria com o sol alto no céu, próximo do horário de almoço, dei uma pausa em Poeira Brilhante, deixei Flynn descansando com água e feno e me permiti perder algumas horas até ficar mais próximo de escurecer para visitar Daze Bechen.

O homem era um tolo, Miranda facilmente o pouparia se ele não tivesse se provado um risco para quem ousasse trabalhar com ele e para a integridade da economia de seu setor com tamanho prejuízo. Ele era tão burro a ponto de pensar que não descobriríamos o desaparecimento de três pessoas em seus contatos e 1870 pekins?

Grogan, o dono da estalagem que eu me encontrava, era um senhor em seus 50 e tantos anos, simpático e simples, fazia questão de me hospedar aqui sempre que tinha assuntos a resolver em Leste-Ilaria, além de que seus preços eram os mais justos que eu tinha visto pelos arredores desse setor, o setor de investimentos, onde o entretenimento dos morados era extorquir novos investidores. Lá era onde ocorria a parte burocrática, onde o dinheiro era depositado para as atividades rentáveis do reino, o lar dos piores aproveitadores de Althaia –não me surpreendeu o fato de Daze morar aqui.

Ainda estava no desfiladeiro, olhando para onde havia um saco de grão no fundo do penhasco com animais já curiosos, desviei meus olhos enquanto pensava em quanto ainda estava relativamente cedo. Deveria ser seis da noite, no máximo. Não era ideal cavalgar de noite, a previsão era usar um quarto em Poeira Brilhante, mas deitar na minha cama era tudo que eu queria.

Era de se esperar que a experiência viesse a tornar mais fácil tirar a vida de alguém e, realmente, eu não era o mesmo Nikolai que matou pela primeira vez, entretanto, não era um hábito que se adquiria. Toda morte tira algo de você, cada pessoa é diferente e isso deixa tudo pior. Eu tenho uma noção do que geralmente pode acontecer, não certeza –e raras são as vezes que acerto minhas previsões. E isso deixa qualquer um exausto. Precisava descansar em meu quarto, não em uma estalagem qualquer, no quarto onde outra pessoa havia deitado no dia anterior e onde outra deitaria no dia seguinte. Se eu pegasse a estrada agora, chegaria pouco depois da meia-noite, talvez. Valeria a pena.

O nome da sombra - Crônicas de sombra e luzOnde as histórias ganham vida. Descobre agora