Capítulo 94

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Os batimentos do meu coração estavam tão fortes, mas meu corpo parecia quase não se movia.
Meus olhos estavam ainda fixos na escuridão.
Morte se aproximou me tirando da água já fria e me enrolando na toalha a contra gosto.
Eu estava paralisada, ele tinha entendido, mas não queria tocar no assunto.
- Vista uma roupa seca. Disse ele me entregando peças de roupa e saindo do cômodo.
Minhas mãos tremiam segurando a roupa, meus olhos vasculharam pelo cômodo tentando encontrar qualquer figura, mas não havia nada.
Tirei as roupas molhadas e vesti as secas, nem percebi que estava sentada no chão até o momento que o toque de Morte sobre meu ombro me tirou do devaneio.
- Você não quer nada?
Neguei com a cabeça.
Ele se sentou ao meu lado cobrindo meu corpo com uma coberta.
- Você já pensou como teria acontecido se não fosse desse jeito? Indaguei sem nem notar as palavras serem ditas por mim mesma.
- Como assim?
- Se meus pais não tivessem morrido... eles estariam aqui do meu lado? Ou teriam fugido como os outros?
- As vezes é complicado saber o que passa na sua cabeça... você sabe que eles estariam ao seu lado.
Fechei meus olhos sentindo o calor do fogo da lareira em minha pele.
Eu não conseguia entender, eu não queria entender...
Surgindo como um calor por minha pele, senti uma queimação em meu corpo e ela aumentava gradualmente.
Me contorci e Morte me analisou preocupado.
- O que está acontecendo? Indagou ele olhando minha pele.
Eu passava as mãos freneticamente pelos meus braços e pernas, meu corpo parecia estar em chamas.
- O que é isso? Indagou Morte segurando em meu braço.
Algumas marcas começaram a surgir em meus braços e pernas, do lado direito as marcas e escritos tinham uma cor marfim com um enorme brilho e do lado direito as marcas tinham o tom de laranja escuro. A cada novo traço eu me contorcia, gritando de dor.
Morte me pegou em seus braços analisando cada marca em meu corpo, cada letra.
- A maldição... a maldição está escrita por seu corpo. Disse ele me segurando.
- Como faço a dor parar?
- Eu não sei, mas os escritos já estão preenchendo todo o seu corpo, acho que depois disso a dor vai passar.
Meus dedos se cravaram no chão, minhas unhas quebraram e sangue escorria por meus dedos.
Meu corpo parecia em chamas, senti cada letra se formando por meus braços, pernas e tronco. Eu ainda me contorcia e Morte me segurava.
- Está acabando. Disse ele secando o suor da minha testa.
Depois de sabe se lá quanto tempo meu corpo parou de queimar.
Passei as pontas dos dedos cobertas de sangue pela minha pele, as letras ficaram com o mesmo tom brilhante de antes.
Me levantei apressadamente e Morte já estava ao meu lado.
Corri até um velho espelho e vi meu corpo preenchido por palavras, apenas meu rosto e meu pescoço não tinham nada escrito.
Morte passava os olhos por minha pele lendo o que nela estava escrito, o puxei pela mão tirando seu olhar da minha pele e fazendo ele encarar meu rosto.
- Não quer saber o final?
- Eu não me importo com o final e não quero que você também se importe.
Ele passou a mão sobre meu ombro passando com os dedos pelas palavras.
- Está na hora de eu ir.
- Não importa o que aconteça hoje, eu sempre vou estar do seu lado.
- Eu sei. Disse me aproximando um pouco dele.
Nossos lábios se encontraram, com ternura se envolveram, aquele não era um beijo sedento, não era um beijo com desejo, era um beijo de despedida, ele sabia disso. Suas mãos me envolveram me deixando mais próxima o possível dele, ele levou uma mão até meu rosto e acariciou enquanto nosso beijo durava, ele sabia o que poderia acontecer e por isso não quis se afastar, nem mesmo quanto eu tentei.
- Eu tenho mesmo que ir. Disse enquanto afastava não só nossos lábios, como os nossos corpos e o meu coração.
- Eu vou estar lá com você.
- Eu quero estar lá sozinha, preciso fazer isso sozinha... espero que me entenda.
- Eu não concordo, mas eu te entendo.
Sua mão segurou a minha e seus olhos foram dos meus para elas, ele sabia o que as minhas palavras significavam e estava ali de alguma forma tentando me impedir.
- Não fique assim. Eu disse quando notei o que sua feição significava.
- Eu te amo, Luna. Ele disse ainda segurando minha mão e olhando para ela.
Eu senti a dor da suas palavras, senti que ele sabia o que eu ia fazer, mas ele não podia fazer mais nada para me impedir.
- Eu também te amo, mas agora tenho que ir. Disse me afastando, mas ele segurou meu braço.
- Prometa que vai fazer de tudo para voltar, me promete que você vai lutar para voltar...
- Eu não posso te prometer isso, mas vou fazer o que tenho que fazer.
- É disso que eu tenho medo. Disse ele soltando minha mão, desapareci em seguida.

Eu tentava não admitir para mim mesma que ele sabia dos meus planos, mas ele sabia.
Surgi no castelo de Sol, seus olhos inspecionaram minha pele.
Desde que as marcas surgiram em minha pele eu me sentia como se pudesse destruir o mundo com um estalar de dedos, me sentia como se em toda minha vida eu nunca tivesse tido nem 1% dessa força.
- Acho que já está quase pronta.
- Acho que sim, vim até aqui para definir algumas coisas do plano.
- Pode me dizer.
- Você prefere que eu entre ao seu lado ou ao lado de minha mãe?
- Entre do lado de sua mãe, quero ver a cara que ela vai fazer quando você for para o meu lado.
- Nosso plano de ataque já foi definido antes e não devemos fazer alteração, manteremos nosso plano até o final e assumiremos juntos o poder do mundo.
- Você escolheu o melhor lado, Luna. Disse Sol com um enorme sorriso.
- Eu sei.
Mas o seu sorriso não duraria por muito tempo.
- Aguarde ser invocada com sua mãe, o lugar você só irá saber na hora.
Confirmei já desaparecendo.

Surgi no castelo da Lua.
- Acho que você não notou que a batalha é hoje. Disse Lua se aproximando e me olhando de cima a baixo.
- Vou entrar na batalha ao seu lado, Sol acha que vou te trair, então quando eu for para o lado dele, vou mata-lo.
- Esperei muito tempo para ouvir essas palavras saírem de sua boca.
- Não há mais volta.
Lua sorriu vitoriosa.
- Vamos, precisamos arrumar você para a batalha.
Caminhei atrás de Lua pelo castelo, umas vinte criadas estavam atrás de mim, elegantes como a Lua.
Paramos em frente a um enorme salão.
- Tome um banho e lave o sangue de suas mãos, me encontre em seguida aqui, neste salão, vamos te preparar para a batalha.
Concordei seguindo uma das criadas.
A cada passo refazia cada detalhe do plano, pensava no que poderia dar errado, mas já estava tarde para fazer um novo plano.
Entrei na banheira e deixei a água acalmar meu corpo, enquanto minha mente estava totalmente inquieta.
Saí da água e vi as letras por meu corpo, mas não quis ler a história escrita em minha pele, não queria saber o final...
Cheguei ao salão e todas as criadas se aproximaram.
- Deixe me ver suas mãos. Disse Lua.
Estendi as mãos e ela olhou com nojo para minhas unhas, quebradas e arruinadas. Ela colocou suas mãos sobre as minhas e os machucados desapareceram.
Me colocaram sentada enquanto uma das criadas passava algo em meu cabelo, uma outra maquiava meu rosto.
- Preciso mesmo disso? Indaguei, eu estava indo para batalha e não para um desfile.
- Acha que vai entrar do meu lado desarrumada?
Nem me dei ao trabalho de responder.
- O cabelo está pronto, senhorita.
Meus cabelos que estavam a muito sem cuidado, foram presos em uma trança que ia até abaixo do meu quadril, diferente dos meses que haviam se passado meu cabelo estava com vida, brilhante e saudável, eu me importaria com isso antes, mas agora só me parecia uma coisa desnecessária.
A criada se aproximou segurando uma coroa com a lua e o sol, nela pude ver as pedras de diamante que estavam no símbolo da lua e o reluzente ouro do símbolo do sol.
- Tem que se vestir, senhorita.
Uma das criadas me alcançou um vestido.
- Lua, eu estou indo para uma batalha, então, por que diabos eu usaria um vestido.
- Ele é uma armadura e um vestido, vai ficar protegida e também vai te deixar apresentável.
Desnecessário mais uma vez.
- Meus braços não precisam de proteção?
- Temos que mostrar a maldição escrita em sua pele.
Sem discutir, faça o que tem que ser feito.
Relutante vesti o vestido, ele era  inteiro preto, feito de um tecido quase rígido por baixo e por cima um tecido esvoaçante com diamantes espalhados. A parte de cima do vestido foi coberta por um colete de armadura, no lugar do coração o símbolo do sol feito em ouro e a lua feita de prata. Meus braços eram cobertos até os cotovelos pela armadura e nela haviam os símbolos do sol e da lua, nos suportes da armadura coloquei as minhas adagas. O vestido era solto no corpo o que não me impediria de lutar.
Adicionei sem que ninguém percebesse um suporte de adaga na minha coxa direita e nela coloquei a adaga que Dastan tinha me dado, tive que fechar os olhos para impedir as lágrimas de rolarem por meu rosto.
As criadas me entregaram botas que iam até os joelhos, nas botas também  haviam alguns suportes para adagas, escolhi algumas e as coloquei, elas me colocaram em frente ao espelho e eu vi meu próprio reflexo tentando lembrar da minha última imagem, o cabelo branco em uma trança que ia a baixo do quadril, com uma coroa com o símbolo da lua e do sol, os olhos cinzas brilhantes por ansiedade ou medo, os braços e corpo coberto pela maldição. Eu era aquilo, eu tinha me tornado aquilo, tudo que eu tinha feito, tudo que eu tinha vivido era para me levar até aquele momento, nem percebi que já empunhava minha espada.
Eu era a escolhida, eu ia lutar até morrer, ou até que eles morressem.
Aquela era hora, aquele era o fim, de um jeito ou de outro tudo acabava hoje.

A Maldição da Lua Vol: 2 Entre a Lua e o SolWhere stories live. Discover now