16. ARANHAS, ASFIXIA, FOGO, QUEDA

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NO INÍCIO DA TARDE de sábado, o doutor Janson avisou a Enrique que estava saindo.

- Aquele problema das garotas com pesadelos que falaram ontem?

- Exato. Espero voltar em duas horas, e então daremos nosso passeio. Ocupe-se com a simulação até lá.

- Pode deixar, tem bastante serviço aqui! - Enrique sorriu. - Boa sorte com as garotas. Espero que consiga ajudar!

- Eu também!

No dia anterior, a ajuda do doutor Janson fora requisitada pela equipe da enfermaria, que não sabia mais o que fazer com quatro alunas atormentadas por pesadelos há uma semana. Elas estavam sendo sedadas, mas, se a sedação atenuava e elas adormeciam, os pesadelos recomeçavam. Uma passara a ter visões semelhantes aos pesadelos mesmo acordada. As moças estavam em péssimas condições e a Medicina não sabia o que fazer, pois não havia alterações nos exames de laboratório ou de imagem. A equipe de Psicologia do campus também não tinha ideia do que estava acontecendo.

No caminho para a enfermaria, Carl Janson suspirou. Pesadelos incapacitantes iniciando de forma simultânea em quatro jovens que, de acordo com o relatório médico, eram muito amigas? Exames laboratoriais descartaram a hipótese mais óbvia, o uso de drogas.

Será que alguém teria perguntado se as garotas tinham um inimigo comum?

- Sim, doutor Janson, questionamos essa parte - assegurou a psiquiatra que o aguardava na enfermaria. - Elas negam. Ainda que essa hipotética pessoa existisse, precisaria ter acesso a elas para administrar a droga alucinógena. Elas estão isoladas aqui há vários dias e os exames laboratoriais foram ampliados para cobrir todas as possibilidades. Além das que nós mesmos estamos administrando, não há qualquer substância psicoativa no organismo de nenhuma das quatro.

A médica relatou suas impressões sobre as quatro jovens, apenas confirmando o que constava no relatório já lido pelo doutor Janson. Amanda e Luciana eram irmãs; Luciana, ou Lu, era um ano mais velha, e bastante protetora em relação à irmã mais nova. Os pesadelos de Amanda eram com aranhas. Os de Luciana, com morte por asfixia. Sharon era amiga de infância das irmãs e seus pesadelos eram com fogo, onde ela era queimada viva. A quarta garota era Cibele e conhecera as outras três no ano anterior, ao chegar à Escola Superior. Seus pesadelos eram com quedas.

- Os pesadelos são sempre variações do mesmo tema, mas não se repetem. Estão em tal estado de exaustão que Sharon, ontem, alucinou. Apesar de acordada, acreditava que seu quarto estava queimando.

O doutor Janson conversou com as garotas uma a uma. A privação de sono e o medo de dormir haviam deixado as quatro em estado lastimável. Não era preciso mais do que uma palavra para desatarem a chorar ou tremer. O psicólogo fez suas perguntas de modo gentil. Elas imploraram que ele fizesse aquela tortura parar.

Para cada uma delas, perguntou se havia alguém que sentisse prazer em vê-las daquela forma. Com lágrimas escorrendo pelos rostos cansados, as quatro negaram.

- Nunca fiz mal a ninguém, doutor Janson, eu juro! - murmurou Sharon, a ruiva. - Por favor, por favor, por favor, não me deixe dormir! Não deixe o fogo voltar!

Ao terminar as entrevistas, o psicólogo suspirou. Quatro jovens, quatro grupos de pesadelos. Aranhas, asfixia, fogo, queda. O que tinham em comum? Simples. Cada uma das garotas era, noite após noite, aterrorizada e morta por seu maior medo. O que havia desencadeado os pesadelos? Isso era óbvio, mas não simples, com as quatro negando desentendimentos com quem quer que fosse.

Precisaria partir para métodos não tão convencionais.

* * *

O DOUTOR JANSON pediu para ver novamente Luciana, a mais controlada do grupo. Recebeu-a na porta, tendo o cuidado de trancar a porta após fechá-la. A moça não percebeu. Ele conduziu-a até a poltrona e a fez sentar, inclinando-se um pouco diante dela nesse momento.

Olho do FeiticeiroWhere stories live. Discover now