EVA
Quando sua boca fina se afastou do canudo, Manoel deu uma risada curta e fraca, ainda olhando para o copo.
- Você tá me deixando sem graça me encarando desse jeito.
Na mesma hora, arregalei os olhos e olhei para a frente. Senti o rosto esquentar. Como ele sabia? Nem estava me olhando de volta! Que ódio, eu odiava ser pega no flagra. Eu e essa mania de encarar as pessoas aleatoriamente...
Mas eu sempre desviava o olhar quando elas olhavam de volta. E ninguém nunca reclamou comigo. Na verdade, eu encarava as pessoas e começava a divagar.
- Ah, des-desculpa. Eu não sabia que... Como você...?
Ele riu e se inclinou um pouco para mim. Recuei disfarçadamente no assento.
- Visão periférica, querida.
- Ah.
Ótimo. Agora eu queria sumir. Sabia que um dia essa minha mania me faria passar a maior vergonha.
- Então, você sempre faz isso? - ele perguntou, ainda inclinado. Sentia seus olhos sobre mim, ainda que eu estivesse vidrada na tela do cinema.
- Isso o quê?
- Encarar as pessoas quando acha que não estão olhando?
Morta de vergonha, eu disse:
- Preciso ir ao banheiro.
- Agora? O filme já vai começar...
Fiquei de pé e o deixei falando. Quase tropecei nos degraus da sala escura na hora de descer. Precisava encontrar Júlia e dar um jeito de trocar de lugar com ela no cinema.
Por sorte, eu a encontrei no meio do caminho. Ela carregava duas pipocas médias, meu suco e um refrigerante.
- Eu sei, eu sei. Demorei demais. Mas ainda bem que você veio atrás de mim, acho que ia derrubar isso tudo nas escadas da sala.
- Podemos trocar de lugar?
Ela me encarou.
- Sim, mas por quê? E por que você tá com essa cara de quem viu um fantasma?
Soltei um suspiro.
- Você armou pra mim, Júlia?
- Do que você tá falando?
- Do Manoel. Ele tá aqui, ele sentou do meu lado e ficou tentando puxar assunto. Foi você que armou que ele viesse? Porque isso é estranho demais.
Júlia arregalou os olhos, depois riu.
- Menina, não acredito! Não tenho nada a ver com isso. Não sei o que é mais bizarro, ele sentar justo do seu lado ou ver um filme romântico. Não sabia que ele era esse tipo de cara. Eu vou zoar ele eternamente, pode apostar.
- É, mas por favor, troca de lugar comigo. Ele estava me deixando desconfortável. Ele é muito inconveniente, amiga.
Ela ergueu uma sobrancelha.
- E eu não sei? Mas não liga pra isso não. A gente troca de lugar sim. Vamos entrar?
Eu assenti. Quando entramos na sala, a tela exibia o trailer de outro filme e o ambiente ficou mais escuro ainda. Dei uma olhada de relance em Manoel e vi que ele comia sua pipoca tranquilamente, enquanto vidrava os olhos na tela. Depois, deixei Júlia passar na minha frente e ela sentou ao lado dele.
Com um suspiro, me permiti relaxar no assento, enquanto saboreava minha pipoca doce com uma garrafa de suco de morango. O filme já começou mostrando a cidade de Nova York e uma daquelas trilhas sonoras clássicas de romances, ao som de violão e uma voz feminina suave cantando sobre como o amor era lindo.
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Entre o amor e a maçã | Livro 1 [CONCLUÍDO]
RomanceEva e Manoel não poderiam ter se conhecido de forma menos convencional. Ela numa festinha de fim de semestre da faculdade, ele surgindo, de repente, interrompendo uma conversa para lhe passar a cantada mais ridícula de todas. O que devia ser uma noi...