Capítulo 19: A descoberta

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EVA

— Entendi — falei, devagar. Levaria um tempo para assimilar todas as suas palavras. Mas eu tinha certeza que pensaria nelas por horas.

Ele se escorou na cadeira, numa pose relaxada.

— Você acha que o que falei foi a maior heresia que já ouviu, né?

Quase ri.

— Heresia? — Foi uma verdadeira aula de bíblia, mas não podia admitir. Precisava lembrar que estava diante do cara que estava afim de mim. Não podia fazer nada que lhe desse falsas esperanças. Aliás, essa nossa conversa já se prolongou demais.

Como não falei mais nada, ele suspirou e disse:

— Eva, boa parte das proibições de levíticos eram exceção, destinadas apenas para o povo daquela época. Não significa que precisamos seguir tudo à risca também. Se fosse assim, então eu já estaria em pecado por cortar o cabelo, por exemplo. E você também, talvez por usar esse gloss labial.

Encolhi os lábios para dentro e desejei que sumissem. Até no meu gloss ele tinha reparado. Como eu não gostava muito de maquiagem, costumava usar apenas batom, mas os mais fracos, como nude ou rosinha claro. Fiquei surpresa por ele saber o nome do batom, mas lembrei que ele tinha uma irmã.

— Ah, entendi.

Ele sorriu.

— Eu tô te assustando, né? Desculpa despejar tanta informação em você assim. É que eu faço meus estudos e não tenho com quem conversar sobre isso. Você deve tá pensando agora "Meu Deus, quanta heresia!".

— Na verdade, não. Eu só... preciso pensar e refletir mais nesse assunto. Só pra recapitular, de acordo com sua lógica, não há problema em tomar uma cerveja ou um vinho. Certo?

— Depende.

— Do quê?

— Do contexto, Eva. Tomar uma taça de vinho sozinho em casa é ok (contanto que você não tenha problemas com álcool e não se embriague) . Agora, tomar uma taça de vinho na igreja é péssimo.

Eu ri. Que droga.

— Tá bom.

— Estou surpreso que você não tenha ciência dessas coisas. Não te ensinam na sua igreja?

— Como sabe que sou da igreja?

— Ora, senhorita... Primeiro: Te vi lendo a bíblia algumas vezes antes de falar com você. E segundo — ele abriu um sorriso largo —, eu te deixei confusa e desconfortável com esse assunto. E agora você tá pensando se vai me estrangular agora ou mais tarde. Desculpa por entrar na sua mente.

— Você não entrou na minha mente.

Era mentira. Sabia que levaria um bom tempo refletindo sobre esse assunto. Talvez estivesse um pouco irritada porque Manoel estava quebrando alguns paradigmas que tive a vida inteira (como o da tatuagem). Mas de modo geral, estava mais encantada do que qualquer outra coisa. Só que eu nunca o deixaria saber disso.

— Sei.

— E eu não quero te estrangular. — Não mais.

— Ainda bem, porque isso acabaria com nossa amizade.

— Manoel...

— Eva, querida. Eu já decidi. Não importa o que você diga, somos amigos. Agora só me fala como vamos selar essa relação. Um colar de amizade ou apelidos diferenciados?

— Nenhum dos dois. Eu... não tenho amizade com homens. — Em parte era porque meus pais diziam que não existia amizade entre homem e mulher sem que um não sentisse atração pelo outro. Além do mais, eu tinha muita dificuldade em manter amizades.

Entre o amor e a maçã | Livro 1 [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now