MANOEL
Júlia apertou o botão de desligar o rádio e olhou para minha cara assim que viramos a esquina da casa da avó de Eva.
- O que foi? Eu tava curtindo a música! - resmunguei. Tinha acabado de começar Deixa o tempo, da Fresno. Uma das minhas músicas favoritas da banda, por sinal.
- Desembucha, garoto.
- Como assim?
- Você tava aí assobiando a melodia dessa música e tá muito quieto. Quero que você me conte como descobriu que Eva e eu íamos ver um filme hoje e naquele horário.
Eu ri. Poxa vida, ninguém acreditava mesmo que foi coincidência!
- Mano, eu não sabia! É sério. Fiquei tão chocado quanto ela. Não sabia o que fazer com minha cara, na hora. Parece que meu cérebro entrou em curto circuito, sei lá.
- Espera mesmo que eu acredite nisso?
- É. Eu trabalho naquele shopping, Júlia. Olha, deixa eu te contar uma coisa. Eu trabalho numa loja de sapatos e tenho desconto no cinema de lá. Tenho folga aos domingos uma vez por mês. Toda vez que quero ver um filme, eu vou naquele cinema, por causa do desconto.
- Então, você não tem carteira de estudante?
- Sim, eu estudo Farmácia. Mas imagina que louco. Tenho o desconto do serviço mais o da carteira de estudante. O cinema fica praticamente de graça.
- Desde quando estuda Farmácia?
- Há dois anos e meio. Eu tô indo pro sexto semestre.
- E por que nunca te vi antes na faculdade?
- Ah, é que eu sou magro demais pra que alguém possa me ver - ironizei.
Ela riu.
- Tá vendo? Como você não quer ser zoado pelos outros? Você mesmo se zoa!
- Eu posso, né?
- Enfim... Você precisa esquecer a Eva.
- Esquecer? Eu nem fiz nada. Você viu, estava tentando me aproximar naturalmente, sendo eu mesmo.
- O problema é que você é naturalmente irritante. E ela desenvolveu certa aversão a você.
Apertei os lábios.
- Ela te falou alguma coisa?
- Não muito. Mas você deixa ela nervosa, desestabilizada.
Abri um sorriso.
- Isso é bom, né?
- Não, porque não é um nervosismo do tipo "meu Deus, eu tô muito afim desse cara". Tá mais pra "Esse cara tá me assustando, eu preciso fugir".
- Então eu não sei o que faço. Ela fica nervosa quando sou eu mesmo e quando não sou. Ferrou.
- Só esquece.
- Por quê? Esse nervosismo vai se converter em algo diferente, Júlia.
- Você não faz o tipo dela. Não tá de acordo com a list... - Ela bateu a mão na própria testa. - A Eva vai me estrangular.
- Agora que começou, desembucha. Qual o tipo dela? Diz aí.
- Por quê? Você não pode fingir que é o tipo dela, Manoel. Não é justo.
Eu bufei.
- Querida, quem falou em fingir? Se a gente estivesse numa dessas comédias românticas, eu fingiria ser o cara ideal, ela se apaixonaria por mim e no fim descobriria que se apaixonou por uma versão inventada minha. A gente brigaria e cada um iria pro seu canto. E isso é desonesto.
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Entre o amor e a maçã | Livro 1 [CONCLUÍDO]
RomanceEva e Manoel não poderiam ter se conhecido de forma menos convencional. Ela numa festinha de fim de semestre da faculdade, ele surgindo, de repente, interrompendo uma conversa para lhe passar a cantada mais ridícula de todas. O que devia ser uma noi...