Epílogo

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EVA

Dois anos depois...

Tudo bem, respira! Você consegue — sussurrei, enquanto seus dedos apertavam minha mão. Manoel mantinha os olhos fechados e a postura ereta demais no assento. O suor brilhava em sua testa.

— Está tudo bem aqui? — disse uma aeromoça, parando ao lado da poltrona dele.

Ergui os olhos para ela.

— Meu esposo tem fobia de altura.

— O avião nem saiu da pista ainda. Mas posso buscar um pouco de água para ele.

— Ah, sim. Vai ser ótimo! Obrigada. — Assim que ela saiu, encarei Manoel. — Você ouviu, querido? O avião nem levantou voo ainda, para de drama.

— Drama? Eu chamo de ansiedade pré-fobia ou pré ataque fobiático.

Fiz uma careta.

— Esses termos existem?

— Se não existirem, acabo de inventar. Sério, meu amor. Vamos de carro! Eu já fui pro Maranhão de carro com meus pais, você sabe. Acho que ainda dá tempo de sair do avião.

Suspirei.

Quando nos casamos, meu pai nos presenteou com essa viagem de lua de mel para o Maranhão, pois era o lugar que pretendíamos ir. Manoel queria visitar os avós e outros parentes, além de passear pelas praias. Ficaríamos num hotel há uns dez quilômetros de lá e pegamos um quarto que dava uma vista incrível para o mar. Eu poderia ver o sol nascendo e se pondo pela janela.

— De jeito nenhum! Eu não vou de carro. Pode sossegar ai.

Assim que fechei a boca, senti alguma coisa se movendo bem abaixo dos meus pés. Olhei pela janela minúscula e soube que o avião estava indo para a pista.

— Pelo menos fecha as cortinas da janela — Manoel resmungou.

Pouco depois, a aeromoça voltou com uma garrafa de água. Ele agradeceu e deu longos goles.

— Não, eu quero ver as nuvens lá em cima. — Também era minha primeira vez andando de avião.

Ai, santo Deus... — ele quase gritou quando o avião chegou na pista e deslizou sobre ela em toda velocidade.

Sua mão quase fez a minha virar suco e eu reprimi um gemido. Ele percebeu que estava me machucando e a afastou de mim.

— Manoel, olha para mim — ordenei, sentindo o estômago embrulhar e uma sensação esquisita inundar minha cabeça assim que o avião se ergueu do chão.

— Por favor, não.

Tomei o rosto do meu esposo nas mãos.

— Sim, abre os olhos, meu amor.

Toquei sua mão de novo e reparei que estava gelada.

— Eva, acho que tá na hora de Deus levar a gente. Se tiver algo de que se arrependa, é melhor confessar agora.

Eu ri. Que dramático! Os últimos anos em que estive em um relacionamento com ele foram os mais divertidos da minha vida. Quando pensei que era impossível aprender mais sobre ele, quebrei a cara. Ainda havia tanta coisa que eu não sabia. E eu tinha certeza que no casamento também seria assim. Mas não via a hora de descobrir mais detalhes sobre a pessoa com quem me casei.

Ainda não sabia se ele era o tipo de homem que cantava embaixo do chuveiro ou se ficava quieto. Se largava a toalha na cama ou a estendia no varal. Se roncava enquanto dormia ou se parecia um defunto dormindo, de tão silencioso. Não sabia se ele se mexia muito ou se puxava o cobertor apenas para si. Seria ele um raio de sol pela manhã ou uma nuvem cinzenta que não gostava de falar com ninguém?

Eram os detalhes. Pequenos detalhes da nossa rotina juntos que eu descobriria.

Será que ele falava dormindo?

Quando Manoel abriu os olhos eu lhe dei um selinho.

— Quer brincar de se eu fosse um objeto?

Ele fez uma careta.

— Por quê?

A brincadeira se tornou algo oficial nosso quando começamos a namorar. Era algo que fazíamos o tempo todo durante as férias da faculdade. Mas paramos quando me formei, ano passado. Acho que porque depois de formada, minha vida virou uma correria com os preparativos do casamento e nunca ficávamos entediados. Acho que estressados nos definia melhor.

— Achei que seria uma boa ideia.

Ele relanceou o olhar para a janela do avião e virei seu rosto para que não focasse nisso.

— Não, acho que não vai resolver.

— Tá bom, então eu vou orar por você.

Segurei suas mãos nas minhas, igual no dia em que seu pai foi embora de casa.

— Faria isso por mim?

— Faria qualquer coisa por você. — Então fechei os olhos.

— Eva.

— Sim?

— Eu te amo. Pra sempre.

Apertei os lábios em um sorriso fraco e escorei a testa na sua.

— Eu também te amo, meu amor.

Ele balançou a cabeça e sorriu. Depois, fechou os olhos e me disse que eu já podia orar.

E eu orei. 

Entre o amor e a maçã | Livro 1 [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now