Capítulo 49: O aniversário

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MANOEL

Seria exagero falar que minha vida nunca mais foi a mesma? Não consigo nem mensurar o tamanho do vazio que ficou na minha casa desde a partida do meu pai. Porém, o que mais doeu não foi o buraco que ele deixou em meu peito ou no de Gabi, mas foi a dor que deixou no coração da minha mãe. A mulher tentava ser forte, mas cansei de vê-la chorando pelos cantos da casa, meio escondida.

Um das primeiras medidas que tomei foi trancar a faculdade. Eva estava comigo e me deu todo apoio, apesar de não concordar com essa decisão. Os dias depois desse foram piores, porque meus pais entraram com processo de divórcio. Tanto eu quanto minha irmã fizemos de tudo para não vê-lo nessa ocasião. Porém, ainda tínhamos ao menos uma expectativa que ele nos mandasse mensagem, esforcando-se para manter uma relação amigável conosco. 

Mas foi só nos primeiros dias.

Depois de algumas semanas, simplesmente aceitamos que nosso pai nos abandonou, oficialmente. Porém, cada um de nós tentava seguir com a vida do seu jeito. Minha mãe começou a fazer terapia junto com Gabi. Eu voltei para o trabalho e tentei me distrair com minhas funções. Quando não dava certo ou nos dias de folga, eu gostava de ir para a casa de Ofélia e passava horas ali, entretido com as conversas da senhora e de Eva. Eu ainda amava ouvi-la falando sobre a faculdade e buscava ajudá-la com o curso, sempre que podia. Por outro lado, Eva era tão compreensiva comigo. Entendia que eu estava vivendo uma espécie luto e já não conseguia ser tão bem humorado e divertido como antes. Se o cara que eu era tivesse morrido junto com a partida do meu pai, eu nunca o perdoaria por levar embora uma das partes que eu mais amava em mim. 

As únicas coisas que me impediam de não surtar ou entrar em depressão era minha vida com Deus, a companhia de Eva e o fato de ter começado a frequentar a igreja de Ofélia. Buscava orar e fazer devocional sempre, ainda que terminasse em lágrimas, algumas vezes. Em outros momentos, Eva ainda compartilhava passagens bíblicas comigo e tínhamos uma discussão bem saudável sobre vários assuntos. Mas foi logo no primeiro culto na igreja de Ofélia que eu e minha família nos debulhamos em lágrimas com uma pregação sobre o perdão. Ao sairmos de lá edificados, minha família e eu concluímos que aquele era o lugar certo para nós e passamos a frequentar a igreja sempre que possível. 

Quando menos esperei, já era março. Quase não acreditei que o tempo passou tão depressa. Minha mãe estava se reerguendo. Gabi parecia animada porque quando a bebê nascesse, passaria a estudar em casa (minha mãe fez um acordo com a diretoria da escola e os professores se disponibilizaram para dar aulas online para a garota). De alguma forma, estávamos seguindo em frente. Porém, somente quando Eva sugeriu que eu passasse meu aniversário em sua casa e levasse minha família, voltei a sorrir. Sempre quis que nossos pais se conhecessem e eu sabia o quanto foi difícil para a garota tomar essa decisão. Mostrava que ela estava dando um novo passo em nossa relação, ainda que não soubesse disso ou não quisesse admitir. E mesmo assim... eu a fiz pensar que tudo não passava de amizade entre nós. Qual o meu problema? Bom, estava passando por uma fase complicada, só isso. Talvez, por isso a garota se sentiu confiante em apresentar nossas famílias. 

Que ótimo.

Quando chegou o dia do meu aniversário, o nervosismo quase tomou conta de mim assim que descemos do uber e tocamos a campainha da casa de Eva. Porém, a sensação horrível deu lugar ao alívio imediato quando Ofélia veio nos receber. A mulher representava um lugar seguro para mim, como um bote salva-vidas. Eu nunca entenderia esse super poder dela, mas imaginava que Eva se sentisse da mesma forma com a senhora, não é à toa que vivia em sua casa. 

Ofélia abriu o portão sorrindo e nos recepcionou como se a casa fosse sua. Assim que entramos na sala, Geraldo e Vera vieram nos cumprimentar, como se estivessem com todos os pés atrás. Uma vez, Eva me contou que eles não tinham o costume de receber ninguém em casa. Talvez, por isso, estivessem tão deslocados. A boa notícia é que minha mãe e Ofélia eram especialistas em quebrar gelo e as interações delas tornaram tudo menos esquisito. 

Entre o amor e a maçã | Livro 1 [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now