Capítulo 58: O luto

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MANOEL

Mãe, eu tô com um sério problema — falei, no dia seguinte ao velório de Ofélia, assim que chegamos do enterro, exaustos. Passamos a noite toda com Eva e sua família. Era mais de 10h da manhã quando viemos para casa. Minha sorte era estar de folga hoje e minha mãe resolveu cancelar qualquer compromisso que tivesse no salão.

Minha irmã subiu com Alícia para dormir e eu precisei falar com minha mãe antes que subisse para seu quarto também.

— Você precisa me falar agora? Não pode ser mais tarde? — perguntou. 

Pior é que não dava. Eu costumava ter esse tipo de conversa com meu pai, mas agora não havia outra pessoa para falar. Tinha que ser agora, enquanto eu não perdia a coragem. 

— Esse assunto é urgente. 

— Tá bom — disse ela, sentando-se por cima da perna, no sofá. — Pode falar.

Me sentei ao seu lado, porém na outra ponta do assento.

— Quão errado seria eu querer beijar uma garota no velório da avó dela? — perguntei com cuidado. Mas notei que a pergunta soava ainda mais absurda quando saiu da minha boca. 

— Manoel, o que você fez? 

Eu a encarei, tamborilando os dedos no encosto do sofá. 

— Nada, mas poderia. Digo, foi por pouco. Acho que deu pra disfarçar bem o meu desejo, mas... as coisas estão ficando cada vez mais complicadas, mãe. Tenho orado, lido a bíblia e jejuado. Acho que são essas coisas que estão me segurando, me impedindo de ir adiante com Eva. Mas hoje... Ela se declarou, mãe. Por que toda vez que tento agir de um jeito, ela não segue o roteiro e estraga tudo? Eu não aguento, a garota é imprevisível demais. Sinceramente, tenho medo que um dia desses ela me agarre e me beije do nada, apenas porque quer. E tô avisando, se isso acontecer, não respondo por mim. 

— Ah, Manoel. Vocês são enrolados demais. Deviam estar juntos, sabe disso. 

— A vovó pensava igual. O problema é o Geraldo. Acho até que é por causa dele que Deus me disse que ainda não era hora de eu namorar com Eva. A senhora sabe que namorar sem a benção dos pais é ruim. Também não quero que fique um clima estranho ou Geraldo pense que eu não o respeito. 

Ela ergueu uma sobrancelha.

— Nesse caso, suas opções são bem limitadas. Talvez, a única forma de você não ceder aos impulsos seja se afastando da Eva, pelo menos até ela terminar a faculdade.

— Aí que tá, mãe. Não posso deixar a Eva agora, porque está passando por uma fase difícil. Não quero agir como um babaca, ainda mais agora que ela finalmente se declarou. Faz ideia do quanto isso deve ter sido difícil pra ela? 

— Já me parece meio errado ela ter feito isso no velório da avó, né?

— Ah, eu entendo. Me declarei quando meu pai foi embora de casa. Acho que ficamos tão fragilizados que deixamos a emoção tomar conta. Só que agora, a Eva precisa da gente, mais do que nunca. 

— Isso que estão fazendo um com o outro se chama tortura, Manoel. Não é saudável.

— Eu sei, mas creio que Deus vai honrar a nossa obediência no final. Eu acho até que é melhor a gente parar de se abraçar e tocar um no outro de certa forma. Nossa relação já evoluiu tanto que essas coisas se tornaram naturais e inevitáveis. 

— Eu sei, vocês já agem como um casal, antes mesmo de ser. Por isso Vera teve aquela reação no velório. Manoel, qualquer pessoa percebe o sentimento entre vocês. 

Entre o amor e a maçã | Livro 1 [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now