Capítulo 60: A lista

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EVA

Mal preguei o olho à noite. 

As palavras que Manoel proferiu na faculdade estavam cravadas na minha mente. 

Fiquei com o coração saltando e o sorriso tentando surgir no rosto durante toda a apresentação. Às vezes, arriscava olhar para ele e notava que estava sorrindo.

Aquele sorriso bobo, frouxo e fácil. 

Que droga, Manoel. Quão ferrados estamos? 

Levei a mão ao peito e segurei o pingente do colar que ele me deu. Raramente o tirava do pescoço. Meus pais nunca perguntaram quem me deu. Era um negócio tão discreto que nem devem ter notado ou deduziram que comprei numa das feiras de artesanato que eu costumava ir com a vovó.

Só de pensar nela, a mesma ardência de sempre alcançou meus olhos e senti o vazio no peito. Aquele lugar que estava reservado para ela. 

Sempre sentirei sua falta, vozinha. 

Pensar nela me deixava triste. Fazia uns cinco meses desde sua partida, mas eu ainda sentia como se fosse ontem. Nunca mais voltei à sua casa, isto é, antes do meu pai decidir colocar à venda. Eu não suportaria olhar para aquelas samambaias.

E hoje, apesar de amar os feedbacks dos professores sobre meu projeto e comemorar o sucesso na pizzaria, fiquei pensando que a vovó devia estar lá também. Meu sucesso jamais seria completo sem ela. 

Já pensei em desistir da faculdade tantas vezes esse semestre. Se meu pai soubesse disso, brigaria comigo. Eu não podia contar, não agora que finalmente estávamos nos entendendo. O engraçado é que eu sempre achei a vida amorosa seria um empecilho pros meus estudos, mas o que realmente começou a me distrair e se tornou uma ameaça foi o luto pela vovó. Se não fosse por todo apoio de Manoel, já teria trancado o curso. 

Será que meu pai percebeu isso? Será que ele reparou no quanto Manoel estava me ajudando? Boa parte de mim só queria que ele abrisse a mente e me deixasse namorar o rapaz. As coisas estavam cada vez mais difíceis. Por enquanto, eu conseguia fugir de qualquer situação embaraçosa. Mas temia pelo dia que não desse mais. Durante todo o tempo em que conheci Manoel, tudo o que fiz foi me apaixonar cada vez mais por ele. 

Houve momentos que eu pensei que o rapaz não sentia nada por mim e estava me tratando igual a todo mundo. Porém, agora já não me restava dúvida alguma de seus sentimentos por mim. Estava estampado na sua cara, em cada olhar, cada sorriso. Uma vez, até me chamou de “meu amor” pelo celular. Nunca tinha feito isso antes e nunca o vi chamar ninguém assim. Ele também flertava comigo em alguns momentos e fazia parecer uma piada. Típico dele. Não podia ter interpretado errado os sinais. 

 Mas confesso que, às vezes, pela dureza do meu pai, cheguei a pensar que esse relacionamento não fosse de Deus. Até onde eu sabia, os pais precisavam aprovar a relação. Eu tinha muita vergonha de falar sobre Manoel com meu pai. 

Dormi tão mal pensando nessas questões que no outro dia não tinha energia para nada. Era uma sexta-feira e eu precisava limpar meu quarto, como fazia toda semana. E se não fizesse, ouviria um monte de minha mãe depois. Mas eu não achava ruim, amava uma limpeza, me ajudava a organizar meus pensamentos. 

Assim que levantei da cama, já coloquei minha roupa de limpeza: uma camiseta cinza larga e um short de lycra azul, que ia até metade das coxas, porque era confortável. Nunca sairia com uma coisa dessas na rua. 

Fiz um rabo de cavalo mal feito e saí do quarto. Encontrei meu pai na cozinha fritando ovos e quase sorri.

Ele sorriu ao me ver.

Entre o amor e a maçã | Livro 1 [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now