Era pra ser só uns dias. Uma fuga. Um descanso. Um tempo. Mas o tempo se esticou, se fez colo, se fez lar. E agora, quase um mês depois, eu ainda tô aqui. Ainda na Bahia. Ainda me reconstruindo. Ainda me encontrando. Acordo cedo, como sempre. Mas agora não é mais por ansiedade. É porque o corpo quer sentir o sol entrando pelas frestas da janela. O mar continua ali, batendo na areia do mesmo jeito, mas eu não sou mais a mesma que viu essa vista pela primeira vez. Já não acordo esperando notificação. Já não penso mais em respostas que nunca vieram. Henrique... virou lembrança. Uma que eu não nego, mas também não alimento. Ele ficou onde precisava ficar: no passado. Hoje, minha rotina é outra. Tomo café com Jurema quase todo dia, ali na varanda da casa dela, com cheiro de café coado e bolo de aipim quentinho. A gente ri, a gente se cala, a gente fala de sonhos. Ela me ensina os nomes dos orixás, me mostra como preparar banho de folhas, e sempre repete: Jurema: Você tá florescendo, minha filha. Isso não tem volta. Passei a ajudar nas oficinas com ela. Ensino as meninas da comunidade a fotografar com o celular, a montar uma lojinha no Instagram, a acreditar que o que elas têm na mão pode virar renda. Vejo em cada uma delas um pedacinho de mim — da mulher que saiu do Rio tentando entender quem era longe das dores. E o mais louco: eu me sinto inteira. Não tem luxo. Não tem glamour. Mas tem verdade. Tem chão. Tem propósito. Outro dia fui até a praia sozinha. Levei uma canga, um livro que mal li, e sentei pra ouvir o mar. Fechei os olhos e senti. Um enjoo leve, um cansaço no corpo que já não era só da caminhada. Eu sei. Eu ainda não fiz exame nenhum. Não botei nome, nem confirmei nada. Mas meu corpo já me contou. Tem vida aqui. Dentro de mim. "Cuida, Hadassa"— a voz de Jurema ecoa na minha cabeça toda vez que respiro fundo. E eu tô cuidando. Com silêncio. Com sol. Com comida boa. Com água de coco e fé. E entre uma pausa e outra, bate a saudade de casa. Da mãe. Da minha irmã doida. Meus sobrinhos, até do meu irmão que vive só na rua e da akira... minha filhotinha sapeca de quatro patas. É... Duas vezes Henrique me deu presente pro resto da vida. Hoje, no meio da tarde, deitada na rede do hotel, mandei mensagem no grupo "Família ❤️": 📱 Hadassa: “Ei, sumidas. Como tá minha bebê mais linda desse mundo? Akira tá comendo direitinho? Demorou um pouco e já veio resposta de hyurica... Hyurica: Quem tá sumida é você, querida. Não volta mais não? Sua filha tá bem e só o pai procura saber dela, tá? Kkkkkk. Hadassa: Em breve tô de volta. Como assim procurando a saber dela? Hyurica: Ele vem direto ver essa cachorra chata e ela fez uma festa, tá? Mãe: Oi minha filha, tô morrendo de sdds. Volta logo. As lojas estão bombando, você tá acompanhando daí, né? Realmente esse Henrique vem direto ver a cachorra e vira e mexe pergunta de você, digo que não sei de nada. Akira toda vez que tô ouvindo seus áudios sai correndo pra porta, ela tá com sdds. Fiquei um tempo conversando com elas. Era isso. Era esse carinho, essa simplicidade, esse cuidado que me mantinham firme. Mesmo longe, o elo seguia forte.
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