A noite caiu pesada na VK. Daquelas noites abafadas que nem a brisa quer subir o morro. E eu, sem conseguir dormir de novo, resolvi dar uma volta com o Henry. Ele já tá grandinho, e tá ficando espetinho. Não é de falar muito, é dele. Só fica com a curiosidade de criança no olhar olhando tudo. E no fundo, a verdade é que eu só queria uma desculpa pra sair de casa, pra fugir de mim.
Subi devagar pela rua principal da favela. Os becos tavam cheios de vida - som rolando, riso solto, criançada jogando bola na viela iluminada por luz de poste amarelada.
Henry: sorvete? - moleque gosta de um sorvete, é viciado.
Henrique: Mais tarde, cria… Vamo só dar um rolé antes. - sendo que a cota de sorvete dele já acabou por Hoje. Amanhã levo.
Desci com ele pela Rua do Campo, aquela que corta a área do bar do Cezinha e passa na frente da casa da irmã da Hadassa. Já era quase nove da noite, mas o cheiro de carne assando e o som de pagodinho tocando baixinho entregava: tinha resenha rolando.
Tava ela com os filhos e meu parceiro, Kaio. Tão firme e forte, morando junto e tudo. Ele não é santo, mas tá firme com ela.
Henrique: Vida boa... - falei encostando com a moto no meio fio.
Kaio: Fala meu patrãooo... Aproveitando a folga que você me deu. E aí, molequinho. - foi até o Henry e começou a bagunçar o cabelo do moleque. Henry ria e tentava tirar a mão dele.
Kaio: Senta aí pô, chega mais. Tem problema não né, amor? - ela olhou pra minha cara e negou com a cabeça. Fiquei um tempinho em cima da moto, mas logo me juntei com eles. Henry se juntou com as crianças pra brincar. Ele não tinha a esperteza igual do filho de Hyurica, mas hoje em dia graças as terapias ele consegue se enturmar com as outras crianças.
Hyurica: Ou ou, pode deixando ele brincar também, caralho. Se tu ficar de graça vou dar logo um tapa no teu pulmão e te colocar pra dentro. - menorzinho era do caralho. Saiu batendo perna pra dentro de casa e xingando baixinho.
Kaio: Ele é pica, porra...
Hyurica: É um chato, isso sim. O JOSUÉ, PARA DE GRAÇA E SAI LOGO, SE NÃO VOCÊ NÃO VAI MAIS BRINCAR. - moleque saiu com um patins e voltou a brincar com o Henry e a irmã.
Henrique: Cadê Akira?
Hyurica: Ta lá na minha mãe, minha mãe amanhã cedo vai colocar ela no banho tosa.
Henrique: Me passa teu Pix aí, pra eu dar a moral pra tua mãe.
Hyurica: Ta de boa, relaxa. Hadassa tá deixando faltar nada não. - Aí ela tocou no meu ponto fraco... Hadassa. Respirei fundo, olhei pro Kaio e ele me encarava.
Henrique: E ela, Hyurica? Não volta mais?
Hyurica: Voltar ela volta, mas eu não sei quando. Não sei mesmo, ela não fala. Mas ela voltando, vai mudar o quê pra você? - eu fiquei calado encarando ela. E ela prosseguiu... - Henrique, conheço minha irmã e ela é intensa, com ela é 8 ou 80. Não viu? Do nada ela comprou uma passagem pra Bahia e meteu o pé sem pensar. Se ela colocar na cabeça que realmente não quer ficar nesse bolo doido com você, ela não vai. Vocês homens tem mania de falar que não larga da mulher por causa da criança. Mas olha quantas mães criam seus filhos sem os pais? Olha eu aqui... Duas crianças e graças a Deus estão vivos, bem cuidados e cheios de saúde. A vida que você leva é super arriscada, você faltando. Sua mulher não vai ter que criar seu filho sem você? Então pô. Pensa bem... Ou você tenta lutar pelo seu relacionamento ou você da um basta. Hadassa precisa de homem pra nada, nada mesmo e capacidade ela tem de arrumar um homem direito. - ela cessou o assunto. Encheu seu copo de cerveja e deu uma golada.
Kaio: Nossa vida é breve irmão, ou nós arrisca ou fica nessa aí como você tá. Hadassa é mina direito pô, fechamento. Sabe que vai tá com você no claro e no escuro.
Eu não falei nada, não tinha o que falar. Fiquei ali com a cabeça a mil, pensando em vários bagulhos.

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✨Hadassa✨
Short Story✨Que o destino traçou Que não me deixa em paz Sou eu sua doença Você minha cura...✨