Prólogo

4.9K 380 17
                                    

22 Anos antes ...

Sarah Freitas

Quem diria que eu me casaria e seria perdidamente apaixonada pelo nerd que derrubou suco na minha blusa favorita?

Definitivamente não foi amor à primeira vista.

Nem mesmo aversão. Benjamim era completamente indiferente para mim, tanto quanto eu era para ele. Lembro-me do modo tímido como se desculpou, sua voz saiu tão baixa que por pouco não escutei. Ele não possuía muitos amigos, e por isso era considerado estranho. Apenas tomei conhecimento de sua personalidade encantadora, quase três meses depois dele ter acabado com minha blusa preferida. Isso porque fomos obrigados a formar dupla para um trabalho de história. Nossos nomes foram os primeiros a serem sorteados.

Me parece que o destino decidiu que era o momento para nos conhecermos melhor.

Mas quero deixar bem claro que relutei bastante a fim de trocar de dupla, sem sucesso. Eu era tão popular e Benjamim era tão estranho.

Mas na verdade estranho seria se eu não me apaixasse por ele.

Ele é lindo sabe, é lindo demais. Sua pele bem branquinha, seu cheiro que eu nunca vi melhor, e o sorriso? Por favor né, nem se fala, aquela coisa mais linda, aquele sorriso meio tortinho sabe? Quando ele fica com vergonha e abaixa a cabeça como se quisesse sair de onde está, é lindo por demais, dá vontade de sorrir só por ver ele fazendo isso. O jeito que ele tem pra contar as historias dos amigos, das brincadeiras que já fez ou até mesmo de si próprio, acho que podia passar o dia todo escutando ele falar sobre qualquer assunto e não enjoaria, porque até aquela sua voz meia rouca é linda demais.

— Você vai precisar saltar!—Disse apressadamente e meus olhos se fixaram no homem ao meu lado.

A realidade caiu como um balde de água fria. Estávamos em uma caçada insana no meio da pista. E era madrugada, o tráfego de automóveis praticamente não existia, o que impossibilitava de nos camuflarmos entre eles.

— Eu não vou deixar você aqui— Falei decidida. Lágrimas fazem uma piscina em meus cílios inferiores e meu queixo
começa a tremer.
— Você não tem opção, querida.—Benjamin tira seu olhar da estrada e olha em minha direção.— Nossas meninas precisam da mãe.
— Elas precisam dos pais.—Forcei minha voz o mais alto possível.
— Me ouça, Sarah. —Ele inala profundamente.— No momento, não estamos com muitas opções. Você vai precisar saltar.

Formou-se um nó na minha garganta e as lágrimas começaram a rolar
pelo meu rosto. Eu me esforço para que o fluxo muito necessário de ar entre em meus pulmões, mas antes que minha respiração se normalize, tiros ecoaram atrás de nós e recomeço a busca por oxigênio.

— Mantenha-se abaixada—Benjamin ordena e obedeço.
— Eles vão nos matar —Digo, o medo se espalhando por  meu organismo.
— Vai ficar tudo bem. —Removendo a mão do volante, Benjamin leva meus dedos trêmulos aos lábios.— Confia em mim?
— Sim.— Concordei, um sorriso trêmulo despontando em meus lábios.
— Não vou deixar que toquem em você.—Afirma me olhando rapidamente.

Novos tiros ecoam, e bastou apenas um olhar pelo espelho retrovisor para que eu conseguisse avistar um automóvel quase colando em nossa traseira. A minha primeira vontade foi de gritar. Extravasar até o limite. Já a segunda foi me manter o mais calma possível

— Preste atenção no que vou falar, Sarah—Bejamim passa a mão em minha bochecha impedindo o caminho das lágrimas.— Está chegando o momento em que você terá que saltar do carro.
— Por favor, não me obriga a lhe abandonar... —Me engasgo com um soluço enquanto procuro desesperadamente por algum tipo de conforto em seus olhos.
— Vai dar tudo certo. —Ele passou uma mão em meus cabelos, conforme manipulava o volante com a outra.— Vitor estará esperando por você. Ele irá em meu lugar para a Holanda. Quando tudo isso acabar, irei ao encontro de vocês.—Tenta sorrir, mas seus lábios tremem.

As lágrimas começaram a rolar com abundância pelo meu rosto. Nós dois estávamos cientes do que aconteceria. Nós dois sabíamos que ele não falava a verdade.

Ele estava se sacrificando por mim e pelas meninas.

— Sempre foi você. E continuará sendo você. Minha escolha, meu amor... Te amo hoje e sempre.— As lágrimas de Benjamin deslizam graciosamente de seus olhos e trilham lentamente por suas bochechas. —Diga todos os dias as nossas meninas que também as amo muito. Elas são o melhor de mim. O que fiz de mais perfeito.
— Você não pode nos deixar.—Meus olhos ardem com as lágrimas, e eu mal posso engolir, minha garganta se fechando. —Não pode.
— Se prepare. —Ele alerta, o rosto  vermelho e molhado com suas lágrimas.

Com o conhecimento que eu serei forçada a dizer o meu adeus a ele, algo  penetra profundamente em meu coração. E mesmo com a  dor  excruciante, me esforço a repetir nossos votos.

— Sempre foi você. E continuará sendo você. Minha escolha, meu amor... Te amo hoje e sempre. —Pego sua mão e pressiono a palma contra o meu rosto.

O nó na minha garganta dói junto com o meu coração e meus olhos encontram os seus, cheios de lágrimas.
— Vá. —Ordena.

Com lágrimas novas ardendo em meus olhos, abro a porta de leve com as pontas dos dedos. Ela faz barulho ao se abrir, mas um som à sobrepõe. Foi tudo tão rápido que meu cérebro mal conseguiu processar a sequência de eventos que aconteciam diante de meus olhos. Só quando ouvi um grito de dor que meu estado de transe foi subitamente interrompido. Olhei para Benjamin e ele esta caído sobre o volante. Ele arfava e uma mancha enorme de sangue empapava seu peito.

— Não!

Cair de joelhos no asfalto frio, lutando para me equilibrar. Dor invadia meu peito, infiltrando-se em minha carne e rasgando minha alma.

Nada pode se comparar a dor da perda.

Aquele sentimento de que o homem de sua vida está partindo, dissipando como fumaça.

O meu mundo desabou.

Tudo em minha volta gira, não sinto o peso do meu corpo, não consigo pensar em nada além de minhas meninas.

Deus, me de força.

Mais um tiro é disparado, sinto algo se impactar em meu peito e depois algo molhado. Aturdida, instintivamente levei a mão à ardência em meu peito e meus dedos se depararam com um mancha vermelha que surgiu e imediatamente espalhou-se sobre meu vestido branco.

Eu levei um tiro.

Levanto o olhar para ver o autor do disparo. Sem pausa, o sangue é drenado do meu rosto e paro por um segundo para me perguntar se tudo isso é realmente real. Parecia que tudo ocorria em câmara lenta. Perdi a força e meu coração entrou num compasso desritmado quando seus dedos gelados tocaram a minha pele.

—Eu te amo...—Ele sussurrou.

A dor que podia ser vista por trás do seu semblante sofrido me paralisava. Eu sabia que ele me amava. Mas era um amor estranho, doentio de certa forma. Talvez porque não tivéssemos família. Talvez porque houvesse...algo mais.

Talvez...

— Uma última palavra?—Pergunta e ouço sua risada zombateira enquanto aponta a arma para mim.

Maldito!

Respirei fundo, lutando a todo custo para abafar a sinfonia desafinada do desespero que explodia em meus ouvidos, mas os sinais deixavam claro que era um caminho sem volta.

Era o fim da linha.

— Vá para o inferno —O nó na minha garganta incha tão grande que parece como se eu tivesse engolido uma pedra.
— Impossível. —Seus olhos se enchem de lágrimas não derramadas— Já vim de lá.

Depois o som estrondoso ecoou alto em minha cabeça. As ondas sonoras parecia se propagar em minha mente.
Minha visão estava ficando embaçada e minha mente ficando turva.

Deus, protege minhas meninas.—Eu pedia em silêncio

A última coisa que lembro e de uma luz clara invadir os meus olhos e depois tudo se apagar.

Destinos CruzadosOnde histórias criam vida. Descubra agora