Capítulo 72-Sophia-Não sou anjo da guarda, mas vou cuidar de você.

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— Eu era muito pequeno quando meu pai faleceu, tinha três anos. — Junior começou. — Não lembro exatamente dessa época, muitas das minhas memórias se confundem, talvez por autoproteção, não sei dizer. Mas sei que minha mãe entrou em uma depressão.

Ele inspirou o ar devagar, soltando na mesma velocidade.

— Ela foi se desfiando aos poucos, parecia não ter mais força para viver. Até que encontrou a porra do mal encarnado.— Sua voz profunda é áspera, como se as palavras estivessem sendo puxadas de sua garganta sobre o vidro quebrado.—  Que diabos minha mãe viu em Marcelo, eu nunca vou saber. Acho que ela pensou que ele poderia salvá-la.

Riu mas seu riso não era, nem de longe, alegre.

— Mas ele só acabou arrastando ela ainda mais para dentro do abismo.

Ele e limpa sua garganta, mas eu não ouso olhar para cima, continuando focada no cachorro aos meus pés, esperando que ele continue sua confissão.

— Nos primeiros anos Marcelo até que parecia ser um cara normal. Somente mais tarde ele começou a demonstrar sua verdadeira face e deixou sua máscara cair. E quando isso aconteceu, ele levou toda a pureza de Emma.

Eu engulo, minha garganta de repente seca e entupida com lágrimas.

— O que ele fez?— Medo rola através de mim e tão desesperada como estou para as próximas palavras rolarem de seus lábios, ouvir o que eu já sei, estou tremendo.
— Emma era apenas uma criança. Tão indefesa, esperançosa, frágil...

Algumas batidas de silêncio se acumulam entre nós.

— E aquele desgraçado a tocou. Ele tirou o melhor dela. Tirou sua inocência.

Levei minhas mãos para o meu rosto e cobri minha boca enquanto balançava a cabeça em consternação.

— Ele expôs Emma à maldade do ser humano, abusou de uma menina que devia ter sido cuidada e protegida. — Junior continua e eu tento me segurar, mas um gemido sai dos meus lábios.

Porra, ninguém merecia tanta dor, tanta maldade!

— Emma devia estar rindo em sua ingenuidade e não estar sendo esmagada pela imundície de um depravado.

Enjoada, deixei cair uma mão para meu abdômen, sentindo o estômago agitado.

— Talvez eu pudesse ter evitado, mas descobri a merda tarde demais. Você imagina como aquilo destruiu meu mundo infantil?

Sacudo a cabeça, incapaz de falar, tudo enquanto minha alma está gritando por sua dor.
— Foi em um dia chuvoso, faltou luz em minha escola e todos os alunos largaram cedo. Quando cheguei em casa ouvi barulhos no andar superior. A porta do quarto de Emma estava aberta, e quando entrei desejei morrer — Ele pisca, então franze o cenho, como se tudo estivesse acontecendo.— Marcelo estava forçando a cabeça de Emma sobre o seu maldito pau—Ele bate a têmpora com o punho— Os gritos. Eu nunca vou esquecer o som de seus gritos.
— Oh, Deus... — Eu cubro minha boca novamente quando um soluço rasga meu peito.

Meus olhos queimam, mas não só com lágrimas. Queimam com uma possessão furiosa e raiva ardente que eu nunca senti antes. Lembrei do sorriso de Emma e a imaginei pequenininha, com aqueles cabelos longos, com fé nas pessoas que deveriam ter tido cuidado com ela. Imaginei aquele sorriso sendo substituído pelo susto, pela dor, pela confusão. Imaginei-a sozinha e acuada, sem entender, com medo, assustada. E ninguém para olhar por ela

— Era diferente ver no noticiário, repugnar a violência sexual, desejar a morte de quem era capaz de cometer a monstruosidade. Mas ter uma pessoa que se ama vítima daquilo, ver tão de perto uma dor extrema, sentir como se fosse sua, era muito diferente.

Destinos CruzadosOpowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz