VOLTANDO ÁS ORIGENS

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("You Got Me (Under your Spell)" - Girlschool)

Fiquei um tempo evitando encontrar o Sparky depois daquele dia.
Mesmo que na verdade nada tivesse acontecido entre eu e o Frank. Ou pelo menos, de fato, não era o que ele estava pensando. Não posso falar o mesmo quanto ao Blackie...sempre tive uma certa queda por ele, e nâo vi motico para recusá-lo depois que ele agarrou aquela groupie na minha frente. Era questao de dar a mesma importancia que recebi.
Poderia entrar nessa discussão com ele,  mas sabia que ele era teimoso demais para saber mais do que as próprias conclusões.
Inacreditável hoje em dia, mas na época, era a minha palavra contra a dele. Bastava ser homem, mesmo que fosse um doido como o Sparky.
Porém, talvez pela raiva e frustração, voltei a ser a cretina de antes, e só transava com algum cara aleatório quando estava começando a sentir falta. A maioria das vezes acabava com um diálogo do tipo "eu te ligo". Só que era eu quem dizia isso, ou dava o telefone errado, qualquer coisa para nunca mais encontrar o mesmo figura duas vezes. Quando terminava, desejava com todas as forças que o cara evaporasse. A maior parte do tempo, eu ficava em casa, com algumas garrafas, heroína de vez em quando para cortar a paranoia de cocaína que devorava e me devorava todos os dias. Mesmo assim, eu ainda sentia ás vezes um pouco enjoada, então ia para a casa da Vanity, onde me sentia como se estivesse visitando uma irmã mais velha. Tomávamos um vinho enquanto preparávamos o jantar, conversávamos sobre todas as fofocas e desabafos possíveis. Durante o dia, sempre tínhamos uma nova música em que estávamos trabalhando, ou criamos alguma nova.

Pelo menos então, eu não pensava mais nele. Não nele, com saudades. Eu pensava no que tinha feito com ele. Nem sequer arrisquei ligar ou encontrar ele de novo. Primeiro, porque eu sabia que não tinha adiantar explicar, só por entrar com outro cara já tinha feito uma cagada das grandes, e era a primeira a admitir que se fosse o contrário, se ele tivesse transado com outra ali, enquanto eu estivesse tocando e todos soubessem que tínhamos algum lance rolando...as coisas teriam tomado proporções bem piores e maiores. Pior que isso, eu sabia como ele agia. Se tinha ficado quieto no bar, estava guardado para quando eu o procurasse. Não havia pedido de perdão que cobrisse os danos que ele iria tentar causar.

Todo dia era um embate que tinha comigo mesma: se devia pedir desculpas ou não. Se deveria ligar ou não. Se ele me odiava ou não. E assim segui durante alguns meses.

Na época, estávamos gravando "Nightmare At Maple Cross" e quando estava finalizado e pronto para as prensas, fomos comemorar. Pagamos o Troubadour, nossa antiga casa, onde tudo começou, para uma festa fechada. Eu não estava muito confiante que era uma boa ideia, mas as garotas insistiram que os caras do Dazzle deveriam pelo menos serem convidados, afinal, foi graças a eles que tudo havia começado. Estava em uma sinuca de bico: se não convidasse eles, seríamos ingratas. Se convidasse o único responsável, que era o Razzle, com certeza o Sparky ia entender o vácuo como provocação e seria o caos. Se convidasse todos, havia uma chance mínima, quase inexistente de tudo acabar bem.

Estava torcendo para que elas tivessem razão. E quase não fui na festa da minha própria banda.

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Estávamos ensaiando para começar a gravar o novo disco quando o Razzle veio com a grande boa nova

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Estávamos ensaiando para começar a gravar o novo disco quando o Razzle veio com a grande boa nova. Nem sei há quanto tempo não sabia mais nada sobre elas além do que circulava por aí.

— Que merda é essa? Pra que lotar o Troubadour se elas podem fechar uma porra de uma arena?

— Eu acho que é uma coisa legal, ué. É uma coisa bacana...agradecer, né? Não vivem falando para não esquecer de onde a gente veio?

— Não tô com saco pro seu positivismo hoje, Tony. Se tem uma coisa que eu nunca vou fazer é lembrar de onde eu vim. Que se foda, tenho mais o que fazer. — ou seja: me trancar no closet e injetar heroína no globo ocular.

— Qual é, tá amargurado por causa da ex ainda? — ele não merecia resposta, então continuei concentrado em ajustar o volume do baixo. — Que se foda ela, cara...provavelmente antes da meia-noite ela já vai estar tão chapada que nem vai reconhecer você.

— Ela não vai me reconhecer porque eu não vou. O Troubadour já era mesmo. Uma banda de garotas decadentes em um bar decadente, perfeito pra elas.

Ninguém tinha muito o que dizer. Excelente.

— Amargurado até a última gota de sangue tóxico... — Era difícil o Jack participar dessas conversas, às vezes eu fazia questão de provocá-lo só para ouvir ele falar alguma coisa. Mas daquela vez eu não precisava ouvir nada.

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Jack: Eu nunca falava nada porque não tinha nada a dizer pra um bando de idiotas. O Spark, principalmente, desde o primeiro acorde, já saquei que ele não aceitava ser contrariado. Sabe quem mais era assim? A Mave. Ele estava totalmente fora do controle com as drogas. Sabe quem mais? A Mave. Ele estava transando com qualquer uma que aparecesse, e sabe quem mais? A Mave. Ele arrumava encrenca sempre que tinha uma chance de cair na porrada com alguém, sabe quem mais era assim? ela mesma. E quem tinha o pavio mais curto? Nenhum dos dois tinham sequer um pavio. Não era nenhuma charada sacar isso. Pra mim eram duas opções; ou eles ficariam juntos para sempre, ou matariam um ao outro.

A minha aposta era nele

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A minha aposta era nele. Mas...eu não convivia com ela para saber.

— Que se foda, eu vou nessa merda. — comentei com o Razzle enquanto abastecia meu carro. — Pode ser divertido.

— Vai fazer alguma merda por lá, né...

— De jeito nenhum. Vou me comportar dessa vez.

Eu não disse "como" eu ia me comportar.

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