FIM - LIVRE DOS DEMÔNIOS

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— Por que você não voltou mais? — precisava tirar aquela pulga de trás da orelha

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— Por que você não voltou mais? — precisava tirar aquela pulga de trás da orelha. Aquilo me incomodava há anos.

— Hmmm...achei que não iríamos ter esse tipo de conversa...

— E eu voltar pra casa com essa pergunta por mais...quantos anos mesmo?

— Não estamos contando.

Ele estava de novo me encarando com a mesma cara de tantos-anos-não-contados atrás: a cara de quem sabe que vai conseguir o que quer na base da insistência. Podia ver os próximos dias com telefonemas, recados, e-mails...não. Não mesmo.

— Eu era mais feliz quando não existia internet, sabia? Agora você vai me achar nem se eu cavar um buraco e morar debaixo da terra...cacete... — cobri o rosto com as duas mãos. — você é chato pra caralho!

Ele gargalhou e me puxou, encostando a minha cabeça no ombro dele.

— Graças a Deus não tinha internet naquela época!
Lá atrás o barulho do trânsito noturno da Av. Santa Monica chegava até nós apenas como um resto de eco e o mar debaixo dos nossos pés no píer estava calmo.

— Vai ficar enrolando até quando?

Eu endireitei as costas e me inclinei para a frente apoiada nos joelhos me perguntando se ele ainda era babaca o suficiente para me empurrar na água, porque era o tipo de coisa que o Sparky antigo faria.

— Certo...quer a verdade? Lá vai... parece idiota, mas depois de meses entre a sua e a minha casa, pensei muito em como seriam as coisas quando você saísse. E eu já tinha passado pela mesma coisa que você estava passando...só numa escala um pouco menor, mas mesmo assim, era foda.

— E então, você achou melhor fugir de novo?

— Isso vai virar mais uma briga? Por que se for começar...

— Desculpe. A palavra é sua. Vai em frente.

— Eu sabia que você ia ter alguma recaída, e mais de uma. Sempre tem. Eu estava lá na sua casa e fui separar algum espaço para algumas roupas e encontrei uma caixa de chá com toda a parafernália de heroína. E eu estava muito sobrecarregada com tudo aquilo...durante alguns dias eu desapareci da sua casa, mas o primeiro passo pro abismo já estava dado. A Vanity me encontrou na casa de um traficante e acabei em outra clínica. Tive que voltar vinte casas do jogo...Você deve ter visto. Antes de voltar para mais uma internação, fui te visitar.

— Eu percebi que você tava estranha, mas não achei que fosse uma recaída...ou não me permiti pensar...

— E por isso eu não voltei mais. E no que iria ajudar eu continuar por perto? Estava mais perigoso do que eu pensava. Você ainda gostava, você fez aquele inferno de vida um ninho confortável. Eu detestava. Estava de saco cheio de ficar trincada, de ficar deprimida, de perder um dia inteiro chapada demais para formar uma frase de três palavras. Achei que não ia ajudar em nada, na verdade ia ser de novo o fator perturbador. Se você tivesse uma recaída comigo por perto, ia ser muito pior, eu ia acabar afundando junto.

STARRY EYESWhere stories live. Discover now