SE EU MORRESSE...

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Quando eu entrei no banheiro, parecia que estava em um suspense do Stephen King com todo aquele nevoeiro. Ela tirou a roupa, eu não estava muito vestido para precisar de ajuda para tirar as cuecas, afinal. Me virei para o espelho enorme que tinha mandado colocar de uma ponta para a outra da parede, estava um pouco hesitante, mas esfreguei uma parte dele. Fiquei assustado com o que via: podia ver as minhas costelas, tinham escaras avermelhadas perto do quadril e meus cotovelos pareciam gravetos tortos e os ossos da clavícula saltavam para fora. Meu rosto estava seco, as bochechas fundas e a pele amarelada-acinzentada. Senti calafrios; estava me vendo morto de novo.

— Spark... — ela segurava a minha mão e pela primeira vez percebi que as minhas mãos eram apenas pele e osso também. Atrás dela, a água continuava saindo fumegante do chuveiro.

— Você não acha que essa água tá muito quente, não?

Ela abriu a porta do box e colocou a mão lá dentro.

— Não, não está tão ruim quanto você pensa...

— Você vai tentar me cozinhar aí dentro...

— Spark...eu fiquei esse tempo todo te limpando com toalha úmida, e mesmo assim, duvido que tenha conseguido atravessar a camada toda de sujeira. Jesus...o que vai ser? Água quente ou pego um desengordurante de pia?

— Estamos um pouco dramáticos hoje, não é?

— Vamos... — ela estava de frente para o chuveiro e eu podia ver o vapor saindo da pele dela. Não estava convencido. — Não acredito que você vai amarelar agora...com um banho! É sério, eu tô aqui dentro, não tá vendo? Confia...

Ela me puxou pelo braço e eu mal entrei debaixo da água e já estava do outro lado do box.

— Tá quente pra caralho! Porra...quer me matar, ou coisa assim?

Ela estava debaixo da água sem sequer se abalar. E a pele dela estava começando a ficar vermelha.

— Você é uma reptiliana, por acaso? Quase derreteu a minha pele...

— Ugh! Tá bom, tá bom, eu vou esfriar ela um pouco pra você...que bebezão...frouxo...

— Ei! Não é porque eu não quero me queimar que eu não posso te afogar na saboneteira, pulguinha!

— Nem me fale em pulgas, tá bom...vai que...

— Você devia ter trazido sal e pimenta também...

— Devia ter trazido fita adesiva pra fechar a sua boca, isso sim!

Ela me puxou para debaixo da água, pegou o sabonete e esfregou entre as mãos antes de começar a ensaboar os meus ombros e desceu pelo meu peito. Eu estava me sentindo meio esquisito, era estranho demais ficar sozinho, pelado com uma mulher...bem...me distraí enquanto olhava ela, com os olhos atentos enquanto esfregava a minha pele. Ela às vezes olhava para mim e desviava o olhar quando percebia que eu estava olhando para ela também.

— Braço. — ela ordenou e eu estendi o braço esquerdo, obedecendo como se tivéssemos ensaiado. Eu ficava assistindo toda a mecânica dela, enquanto ela esfregava o sabonete nas duas mãos para fazer espuma e colocava o sabonete na saboneteira, pegou a minha mão e esfregava entre os dedos.

— Não lembro de algum dia ter sido...lavado por uma mulher no chuveiro, sabia?

— É mesmo? — ela respondeu enquanto tentava limpar debaixo das unhas. — Provavelmente você só não se lembra. Deve ter acontecido alguma vez.

— Já cuidaram de você assim?

— Nunca precisou...eu tenho um mínimo de noção de higiene básica, sabe...

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