RAZZLE

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A gente sempre falava que a vida dava um jeito de resolver as coisas, mas não era o que parecia para o Sparky. Na verdade, eu estava ficando de saco cheio dele, e lógico que isso acabou virando uma praga que se espalhou como gafanhotos por toda a banda.

Quando eu soube dessa merda que aconteceu com a Mavie, todo dia que encontrava ele na minha frente pensava em novas formas de arrebentar a cara dele. Sério. Era cada vez uma merda nova: os shows estavam ficando uma merda, ele sempre estava resmungando e se trancava no camarim ou escondido pelos cantos como um rato para virar uma almofada de alfinetes humana. Perdi a conta de quantas vezes o nosso agente parava tudo para buscar ele na cadeia porque ele sempre acabava arrumando encrenca em todo lugar que fosse. Às vezes estávamos prontos para ensaiar, ou precisávamos fazer a passagem de som e ele desaparecia. Ele estava por aí, trincado demais e pensava que ninguém estava percebendo.

Sem falar nos surtos psicóticos que estavam totalmente desgovernados. Ele cismava que estávamos tramando para internar ele assim que terminasse o show e desaparecia. Não entrávamos mais no quarto dele, aliás, fingíamos que ele nem sequer estava lá, porque ele entrava em parafuso e ameaçava com uma arma atirar em que se aproximasse da porta, era insano, e mais: era ridículo!

Com o tempo, o lance da Mavie parecia mais uma das merdas que ele fazia, porque ele estava sempre fazendo uma nova. Na nossa primeira turnê mundial, ele conseguiu a atenção de todas as autoridades policiais de cada cidade que fomos. Tínhamos um show em Israel, que não era coisa fácil de conseguir, e ele conseguiu foder tudo apenas com uma notícia de jornal sobre um dia em que ele quase matou um pai e o filho colocando fogo na porta do quarto deles no hotel.

Para ficar melhor ainda, o Tony entrava na onda dele: durante a nossa folga depois dessa turnê, ele e o Sparky fizeram um passeio de lancha por Montego Bay com duas atrizes pornôs. Até aí, nada que nunca tivesse acontecido antes, exceto pelo fato de: 1) Tony estava casado com Abby, que era uma atriz e modelo bem famosa e queridinha da imprensa; 2) eles tiveram a ideia brilhante de filmar a putaria toda. E ficou pior, porque uma das atrizes, a que dava pro Tony levou essa fita para a imprensa. Resultado; o Tony, cada vez mais pirado de cocaína e heroína enfiou o carro na casa da mulher e detonou tudo por lá, inclusive a cara dela.

Estavam todos loucos, e o pior é que eu era o único que estava vendo as coisas com um mínimo de clareza. Logo eu! O que eu menos queria era ser o enfermeiro desse hospício. Enquanto esses meses no fogo do inferno passavam, a gravadora estava agendando shows numa turnê pelo Norte. Excelente!

O Tony estava preso por causa desse episódio do espancamento e vandalismo, o Sparky estava destruído e o Jack estava como sempre no "tanto faz, quero mais que vocês se fodam". Bem, havia trabalho a ser feito. Já estava sem baterista, não iria arriscar ficar sem o resto da banda, e o Doug, nosso empresário concordava que se o Sparky chapado era ruim, ficar sem o Sparky era pior. Estávamos em uma reunião no estúdio, aproveitamos que o Sparky chegava atrasado toda vez e marcamos uma hora antes do combinado uma reunião sem ele.

Precisava tomar uma decisão, e rápido: alguém precisava substituir o Tony, e precisava ser uma surpresa boa para os fãs. Tinha que superar, ser incrível, foda, assustador...

— ...E se fosse uma mulher? — O Jack perguntou enquanto preparava um copo enorme de vodca, e se sentou na cadeira do operador de som. Colocou o copo na mesa ao lado e cruzou os dedos em cima da barriga.

— Não...não, não, não...nem sonhando! Ela?

— Ela não está mais tocando desde quando saiu da reabilitação, tá doido?

— Eu sei. Mas ela sabe tocar bem o suficiente, mais que o suficiente. E pode atrair um público maior ainda, não que precise, mas...

Eu estava rindo do absurdo que era aquela ideia.

— Não...não,não,não. Não! Já fico puto só de pensar que vou ser a babá do Sparky, não vou ser a babá do casal, ex-casal, casal, ex-casal de novo!

— Bem...eu vou estar junto. — o Doug estava em pé, apoiado na parede o tempo todo ouvindo a discussão e pensando. — Além do mais, ela fez reabilitação, não foi? Deve estar um pouco menos...

— Louca? Eu não apostaria nisso.

— Bom...pode ser que ele se comporte perto dela.

— Retiro o que eu disse: é nisso que eu não apostaria.

Olhei ao redor esperando que alguém concordasse comigo, mas todos estavam olhando para mim com o silêncio ensurdecedor da unanimidade.

— Puta que pariu... — eu levantei e fui para a porta. — Se der merda, e eu sei que vai, vocês se virem pra consertar a situação sem cagarem a turnê inteira sem mim, que eu tô fora!

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Jack: Diva do caralho...

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STARRY EYESWhere stories live. Discover now